“A produção de commodities – como a carne bovina, soja ou milho – tem sido apontada como uma das maiores responsáveis pela devastação ambiental e pelas mudanças climáticas. Mundialmente, estima-se que 40% da perda total de habitat decorra da produção desses itens.”
Há 58 anos, através de um contrato firmado com o governo brasileiro, as empresas desembarcaram na Amazônia para ajudar o país a reduzir as desigualdades regionais, integrar a região ao resto do país e proteger seu patrimônio natural. Nos últimos 30 anos, a região conquistou a prorrogação deste modelo baseando-se na argumentação de que mantém praticamente intacta seu acervo florestal. Na última Reforma Tributária conquistamos a renovação constitucional deste acordo, inserindo nos acertos a utilização inteligente e sustentável de sua biodiversidade como compromisso de diversificação, adensamento e regionalização desta economia. E este é o desafio.
No plano brasileiro, a pecuária é a principal causa de desmatamento na Amazônia, respondendo por cerca de 75% da área desmatada, conforme dados recentes do MapBiomas. Além disso, o setor agropecuário representa aproximadamente 60% das emissões de gases de efeito estufa, superando inclusive o setor de transportes.

Adriano Gambarini/WWF Brasil/Divulgação
O debate sobre a expansão da fronteira agrícola na Amazônia precisa ser recolocado no seu devido lugar. As evidências científicas demonstram, com nitidez, que insistir na abertura de novas áreas de floresta para soja, pecuária ou outras culturas de commodities é um equívoco histórico. Trata-se de uma estratégia que multiplica custos de produção, aprofunda a dependência de insumos químicos e compromete a sustentabilidade de longo prazo.
A produção de carne bovina, soja ou milho tem sido apontada como uma das maiores responsáveis pela devastação ambiental e pela mudança climática. Mundialmente, estima-se que 40% da perda total de habitat decorra da produção desses itens.
O impacto da pecuária em recursos hídricos é brutal: para produzir um quilo de carne bovina, são necessários mais de 16 mil litros de água, muito acima dos cerca de 2.500 litros para soja. Não é apenas consumo – é poluição: dejetos, antibióticos, fertilizantes e agrotóxicos contaminam solos e rios, tornando a pecuária um dos setores que mais degrada a água.
Projetos como o Amacro, confluência de Amazonas, Acre e Rondônia, que desmatou perto de 454 mil quilômetros quadrados são a tradução dessa lógica predatória – um cavalo de Troia que promete desenvolvimento, mas entrega devastação. E agora surgem até propostas de estatais de agropecuária para impulsionar esse disparate, como se o Estado devesse ser fiador da destruição e não guardião da floresta. É o escárnio institucionalizado.
O cenário internacional, neste momento, escancara a fragilidade desse modelo. Os Estados Unidos e a China, em negociações delicadas, cogitam transações em que se troca minério estratégico por soja. China é a compra da soja brasileira. Seu acordo com os Estados Unidos pode ser complicador e agravar mais ainda os gargalos daí decorrentes.

Imagem criada por Inteligência Artificial
A Amazônia, por natureza, tem uma vocação econômica e ambiental singular. Seu ativo maior não é a transformação da floresta em monocultura, mas a possibilidade de fabricar saídas, recompor, conservar e monetizar sua cobertura vegetal. O “rematamento”, termo dado por Denis Minev a um de seus empreendimentos na região – a recomposição florestal – não é apenas um gesto de reparação ambiental. É também uma opção de Manejo Florestal Sustentável, oportunidade de geração de riqueza, já que os ativos ambientais associados à biodiversidade e ao sequestro de carbono são hoje valorizados e procurados pelo mundo.
A expansão da fronteira agrícola, ao contrário, representa um equívoco produtivo, pois a conversão de novas áreas não resulta em maior eficiência; ao contrário, apenas repete um modelo desgastado, caro e cada vez mais dependente de agrotóxicos e fertilizantes. Além disso, cobra um alto custo ambiental: o desmatamento reduz o regime de chuvas, desequilibra o clima e ameaça a própria viabilidade da agricultura no país.
E, talvez o mais grave, significa uma perda irreparável de oportunidades, já que cada hectare transformado em monocultura é um hectare a menos de floresta capaz de gerar biofármacos, cosméticos, alimentos funcionais, serviços ambientais e ativos de carbono que hoje representam a fronteira mais promissora da economia verde.
O caminho inteligente passa por corrigir a omissão histórica de não beneficiar a produção de borracha. Diversificar a partir da indústria do PIM, adensar suas cadeias produtivas como faz a Tutiplast e o Setor de Duas Rodas, para citar alguns, com inovação tecnológica. Adensamento e diversificação para a chamada indústria verde de Manaus são exemplos de como ciência, tecnologia e inovação podem transformar a biodiversidade em produtos de alto valor agregado, conectando a Amazônia às cadeias globais de saúde, indústrias regenerativas com energia limpa e sustentabilidade.
Portanto, insistir em trocar floresta por soja ou pecuária é negar o futuro. A Amazônia pode – e deve – ser protagonista de um novo paradigma: o da economia da floresta em pé, conciliando desenvolvimento regional, geração de emprego e conservação ambiental. O Brasil tem diante de si duas escolhas: perpetuar um modelo ultrapassado, de baixo retorno e alto impacto, ou liderar uma transição que reposicione a Amazônia como patrimônio natural e econômico de toda a humanidade.
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