“Como não poderia deixar de ser esses fatos foram descritos em relatório aos encarregados das relações exteriores do Brasil, e, por consequência, chegaram ao conhecimento do imperador Pedro II.
O Amazonas teve bem poucos cidadãos agraciados com títulos de nobreza pelo imperador D. Pedro II, dentre os quais o barão de Manaus e o barão de São Leonardo, este último, mesmo sem ter nascido nessas terras, empregou suas atividades e fortuna na capital amazonense, e até seu palácio de residência foi transferido para servir de internato de meninas pobres.
Um outro poderia ter tido a mesma honraria imperial, não fosse seu espírito desprendido, seu elevado senso de consciência do dever e, de certa forma, sua juventude, mas, mesmo assim, se tornaria célebre e de grande importância na via cultural e política do Estado, seja como estudioso, colecionador de peças preciosas e político republicano do mais ouro quilate. Mas não é lembrado por esse feito de elevado conceito moral.
O fato é que, ao tempo em que não havia navegação a vapor para o Rio Branco, ele foi encarregado de conduzir uma diligência levando alimentos e dinheiro para a equipe de demarcadores de limites Brasil-Venezuela, então dirigida por Thaumaturgo de Azevedo. Jovem, ao nascer dos primeiros anos da maioridade civil, esse amazonense da gema recebeu o encargo e tomou todas as providências necessárias para enfrentar a viagem, inclusive, em relação às cachoeiras de Caracaraí.
Depois de cuidar de bem acondicionar todos os mantimentos, reuniu os valores monetários e enrolando todas as cédulas, resolveu colocá-las em garrafões de vidro, empalhados, completando o espaço com cevadinha, não só para não chamar a atenção dos demais viajantes, como para evitar qualquer outro tipo desperdício, rio acima, segundo registrou mestre Agnello Bittencourt.
Prestes a chegar em porto seguro, eis que a pequena embarcação foi a pique. Era hora de experimentar vencer as águas a braçadas, até a margem mais próxima. O jovem chefe da expedição não larga os garrafões e consegue chegar à margem com suas encomendas sob guarda e em segurança. Retomada a embarcação, prosseguem viagem e, mesmo com demora considerável, chegam ao porto de encontro com Thaumaturgo de Azevedo para entregar a carga.
Thaumaturgo, explosivo, vendo o estado da embarcação e dos tripulantes, gritou em alto e bom som que haviam fingido o naufrágio para ficar com as cédulas de reis que deveriam entregar-lhe. A resposta veio logo e em tom muito forte também: “Nada disso capitão, era mais fácil perder a vida do que esse dinheiro que trago aqui”, disse o chefe, fazendo questão de entregar os garrafões ao desaforado major.
Surpresos, os embarcadiços e os militares da expedição não se continham em exprimir agradecimentos e homenagens ao jovem expedicionário, e a manifestar o interesse de conhecer detalhes da astúcia e capacidade previdente demonstrada por esse ilustre brasileiro.
Como não poderia deixar de ser esses fatos foram descritos em relatório aos encarregados das relações exteriores do Brasil, e, por consequência, dado o inusitado, chegaram ao conhecimento do imperador Pedro Il que, em reconhecimento, resolveu conceder uma honraria especial que fosse capaz de destacar a bravura, inteligência e honradez com que se portou o chefe da diligência que foi abastecer a comissão brasileira na alta fronteira do País.
Expedida a ordem preliminar, nosso caboclo resolveu recusar a titulação e o gesto especial do imperador, e, com toda a delicadeza, escreveu que apenas cumprira seu dever com honra e dig. nidade, levando a cabo a missão de que fora incumbido.
Foi por isso, e só por isso, que outro amazonense não foi honrado com título nobiliárquico, e Bernardo Azevedo da Silva Ramos não se tornou barão com nobreza do império brasileiro.
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