Manaus, 1 de julho de 2025

O conforto do criminoso na prisão e o saneamento básico no Brasil

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Os assuntos descritos neste título parecem não terem aproximação fática ou jurídica. Mas, em verdade, têm pontos de contatos sensíveis e visíveis numa abordagem que pretenda enfocar o princípio da igualdade para todos, conforme a previsão de norma constitucional. E sob esse raciocínio, revisitamos fatos e situações incompreensíveis do dia-a-dia da vida do povo brasileiro. Refiro-me ao conforto do criminoso na prisão onde cumpre condenação penal. Um ministro do Supremo Federal condenou o estado de Mato Grosso a indenizar um presidiário pelas más condições de salubridade do cárcere em que se encontrava recolhido.

Imaginemos se todos os reclusos pedissem esse tipo de reparação financeira do poder público, na quantidade de mais de 600 mil presos, em todo o Brasil, como ficariam os recursos públicos do país já à beira do abismo da falência? Já temos o auxílio-reclusão, que é pago pela Previdência Social aos dependentes dos segurados que estejam cumprindo pena privativa de liberdade em regime fechado ou semi-aberto nas penitenciárias brasileiras. Este benefício previdenciário produz certa indignação na mente popular, porque a culpa da ausência do criminoso provedor da sua família é dele próprio, na medida em que praticou o crime, ceifando a vida de um pai de família que também ficou  sem manutenção material e não recebe o benefício. À evidência, o poder público não pode descurar-se da visão humanitária de comando ao tratamento carcerário do recluso. Mas também não pode oferecer-lhe uma habitação do tipo de hotel cinco estrelas, para alimentar as emoções daqueles que, de forma fundamentalista, defendem os direitos humanos só para o lado dos criminosos, desprezando o lado humano das suas vítimas e as famílias destas.

A Constituição Federal, no art. 5º, inciso III,  condena a tortura e o tratamento desumano ou degradante a qualquer pessoa, e no inciso XLIX do mesmo artigo, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. Portanto, é muito fina a linha de entendimento de que os dispositivos citados assegurem uma moradia carcerária assemelhada aos hotéis de turismo. O tratamento humano e não degradante, a integridade física e moral do preso, estão garantidos expressamente pelas normas constitucionais. Façamos uma analogia do discutível conforto carcerário com o conforto do s brasileiros que moram nas periferias das cidades brasileiras: mais de 50% da população do país não tem saneamento básico, o que equivale a dizer que não tem água tratada e nem tratamento de esgoto, vivendo em verdadeiro estado sujeira ambiental.  São seres humanos  também, que vivem em locais de absoluta insalubridade e com riscos à saúde, pela água impura que consomem e esgoto tratado que não existe. E daí vem a pergunta: essas pessoas não merecem também morar em local digno tanto quanto os presos nas prisões? Onde moram estão sujeitas ao ataque de pragas e outros tipos de agentes patogênicos, que prejudicam a saúde das  pessoas daquelas comunidades. O saneamento básico tem esta definição: “é a atividade relacionada ao abastecimento de água potável, o manejo de água pluvial, a coleta e tratamento de esgoto e a limpeza urbana”. E as pessoas têm direito de acesso ao saneamento básico, que é garantido pela Constituição e pela lei nº 11.445/2007. No art. 23 da Carta Magna está escrito que “é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”:  inciso IX, “promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico”.

Portanto, se não temos no Brasil, nas periferias das cidades onde moram as pessoas que estão na base da pirâmide social, as condições mínimas para uma vida saudável, essas pessoas também merecem a atenção do poder público para lhes melhorar as suas habitações, da mesma forma que os reclusos nas penitenciárias. Por isso que penso que os dois assuntos, a melhoria do ambiente das prisões para dar mais conforto aos presos e a melhoria das moradias das pessoas pobres onde não há água, nem esgotos tratados, têm pontos de contato muito fortes, com base nas normas constitucionais pertinentes  e de regência das questões, valendo dizer-se, ainda, que esse entendimento tem apoio no princípio constitucional de que todos são iguais perante a lei. Em outras palavras: melhorem as prisões, mas melhorem também a moradia dessas pessoas que vivem em péssimas condições de desconforto, falta de higiene e risco de morte nas áreas urbanas periféricas, para as quais o poder público não estende o seu olhar reparador das deficiências sociais.

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