“[…] pode ter sido conveniência circunstancial da política. O fato é que “o cabeleira” foi eleito constituinte nacional como figura de proa do Partido Socialista Amazonense e do Núcleo Três de Outubro […], quem sabe procurando formar base crítica sobre assuntos de interesse regional
A experimentação partidária nos primeiros anos após a revolução de 1930, seja com a criação do Partido Trabalhista Amazonense que os verdadeiros operários procuraram organizar e algumas lideranças de hábitos e objetivos antigos vieram a toldar e terminaram por levá-lo à extinção, ou, em seguida, com o estabelecimento do Partido Socialista Amazonense, foram oportunidades que fizeram surgir novas lideranças no cenário político local.
Curioso ver que, naquele momento, algumas figuras foram sendo levadas a posições que, anos passados, podem parecer estranhas. Neste aspecto cito apenas dois exemplos: Arthur Cézar Ferreira Reis e Álvaro Botelho Maia, filiados ao socialismo amazonense. Nesse particular, quando escrevi estudo de introdução à segunda edição do livro “História do Amazonas”, de Arthur Reis, o mestre não deixou de me abordar de maneira incisiva a respeito, e, usando o direito de amizade que nos reunia, perguntou de chofre: “porque diabos você redescobriu isso?”
No caso de Álvaro pode ter sido conveniência circunstancial da política. O fato é que “o cabeleira” foi eleito constituinte nacional como figura de proa do Partido Socialista Amazonense e do Núcleo Três de Outubro, organização que fazia publicar os discursos do jovem parlamentar e os difundia, o mais que podia, quem sabe procurando formar base crítica sobre assuntos de interesse régional, ou como forma de propaganda política.
Verdade que na capital da República, o encantador Rio de Janeiro, Álvaro não seria mais um no meio da multidão que se acossava nas galerias para assistir às reuniões, e também não seria entre os parlamentares eleitos com a missão de votar uma nova Constituição para o País. Cumpriria a missão com relevo, ainda que mantendo o olho firme e os tentáculos partidários voltados para a futura eleição para governador do Estado que terminou por conquistarem processo indireto de escolha.
Destacando o indiscutível talento de orador desse filho de Humaitá, um dos seus discursos foi especialmente referenciado pela imprensa carioca como “interessantíssimo” e “pintando o verdadeiro quadro da Amazônia”, como assinalou o Jornal do Brasil. O tema central do pronunciamento escrito em linguagem que o tornou notável foi a situação dos índios em face da legislação e a dos trabalhadores dos seringais.
No mesmo dia, em contraposição a discurso alavarista, deu-se a palavra de Roberto Simonsen, circunstância que serviu para que o jornalista de plantão naquela sessão fizesse interessante comparação entre os oradores e o conteúdo da peroração: o discurso da “civilização brasileira, primitiva, rudimentar, na Amazônia; e o da civilização brasileira triunfante em São Paulo”.
Álvaro elogiou Luiz Carlos Prestes e a criação do ministério do Trabalho, clamou por maior presença das forças armadas nas fronteiras amazônicas, pediu planos gerais para o desenvolvimento da região, demonstrou a importância das linhas telegráficas, contestou a histórica política de povoamento da Amazônia e, ao pugnar pela emancipação dos índios da tutela orfanológica para todos os nascidos no território nacional, repudiou os que trucidaram o índio, importaram escravos negros e gente branca a peso de ouro em busca de ocupar o território, enquanto abandonavam os brasileiros-regionais.
Dizendo-se republicano e adstrito ao presidencialismo destacou, quase que em antevisão ao realçar temas modernos ao dizer que temia mais “a crise dos homens do que as modernidades do regime e que era preciso que o Brasil nacionalizasse a Amazônia, ou seja, se reconhecesse um país amazônico.
Eis a palavra de um socialista nos idos de 1934.
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