
*Wilma Tereza dos Reis Praia
Continuação…
Outras Lendas
BOITATÁ
Conforme explicação da ciência, existe um fenômeno chamado fogo-fátuo, que são gases inflamáveis que emanam dos pântanos, sepulturas e carcaças de grandes animais mortos, e que visto de longe parecem grandes tochas em movimento.
Boitatá é um mito bastante comum entre os índios, conhecido em todo o Brasil e também em outros países da América do Sul e Central. Trata-se de um animal incomum que vive nos rios e tem os olhos de fogo.
Na verdade é uma serpente gigante, que solta fogo pela boca, protege a mata e se alimenta de olhos. Comeu tantos que ficou toda iluminada, transparente e morreu desnutrida. Então a luz que ela tinha, saiu. Passou a vagar pelos campos protegendo as matas.
Os sertanejos do Brasil, quando saem à noite de casa, têm receio de encontrar o Boitatá ou cobra de fogo. É o gênio protetor dos campos e relvados naturais. Os que destroem ou incendeiam as campinas verdejantes são castigados pelo Boitatá. Ele os mata pelo medo ou pelo fogo.
Como já se explicou, geralmente o Boitatá aparece sob a forma de uma enorme serpente com os olhos rutilantes, como dois grandes faróis acesos. Em certas regiões, porém, o monstro toma a forma de um touro gigantesco com um só olho cintilante na testa.
Contam que o Boitatá era uma cobra imensa que dormia sossegada na sua cova. Como o lugar em que vivia fosse muito escuro, ela era obrigada a abrir muito os olhos para enxergar na treva. Por isso, suas pupilas cresceram e ficaram desconformes.
Um dia, começou a chover sem parar. Parecia um novo dilúvio. As águas foram subindo e cobriram as planícies. Os animais correram todos para as montanhas, onde se reuniram.
A cobra-grande ou boiaçu foi obrigada a sair de sua cova. Subiu também para uma montanha. Lá começou a matar todos os animais que encontrava. Mas só devorava os olhos dos bichos, que dentro de sua barriga continuavam a brilhar.
O corpo da serpente ficou então transparente e luminoso. E seus olhos imensos tornaram-se ainda maiores. Pareciam duas fornalhas acesas. E o boiaçu virou Boitatá!
Dizem que a cobra foi castigada pela sua malvadeza, obrigada a vigiar eternamente os campos, assombrando os viajantes descuidados. Sua missão é proteger as campinas e relvados contra os incêndios e destruições.
Quem encontra o Boitatá pode ficar louco, cego ou morrer de medo. Para se livrar do monstro, quando ele surge na nossa frente, basta ficar quieto, de olhos fechados e com a respiração presa. Ele acaba indo embora.
Atirar em cima do Boitatá um objeto de ferro também dá resultado. Mas se o viajante tiver medo e fugir está perdido. O Boitatá persegue-o, enlouquece-o e queima-o com o fogo de seus olhos.
O mito do Boitatá parece mesmo ter-se originado do fogo-fátuo ou santelmo, pequeno penacho luminoso que aparece nos mastros dos navios, devido à eletricidade, ou à noite, sobre os pântanos e nos cemitérios, e que é apenas emanação de fosfatos de hidrogênio, produto de decomposição de substâncias animais.
O PODER DO CAIPORA
Mito comum em toda América Latina, onde algumas tribos, e principalmente os guaranis, acreditam que o Caipora come carne humana. É representado por um anão de cabelos vermelhos e dentes verdes. Outras versões contam que o seu pelo é verde.
É o protetor da flora e fauna, rei de todos os animais e costuma punir o lenhador que agride a natureza sem necessidade ou o caçador que mata por prazer. Tem os pés voltados para trás, que dizem ser um recurso natural que usa para despistar os caçadores, colocando-os sempre a seguir rastros falsos. É muito poderoso e forte.
Costuma enganar os caçadores e viajantes fazendo-os perder completamente o rumo certo, assobiando em seus ouvidos ou dando sinais falsos.
Em algumas regiões dizem que ele anda pela floresta montado em um porco espinho. É também chamado de Pai do Mato e Caapora.
Alguns dizem que encontrar o Caipora traz grande azar. Era conhecido pelos índios e jesuítas como Caiçara, o protetor da caça e dos caminhos. No ano de 1550, o padre Anchieta dizia que o Caiçara maltratava com chicotadas os índios que se perdiam na mata. Em alguns casos chegava mesmo a matá-los.
Os índios, para lhe agradar, deixavam para ele, nas clareiras, penas de pássaros, esteiras, cobertores e redes. Muitos acreditam que o Caipora é um espírito do mau.
De acordo com a crença, quem vai entrar na mata tem que se prevenir levando fumo de rolo para agradá-lo.
Gênio protetor dos animais da floresta, seu poder não se estende aos animais de penas. Limita-se aos bichos de couro e chifres: porcos, veados, cutias, pacas, tatus, tamanduás.
No Norte e no Nordeste, brasileiro o gênio é do sexo feminino e aparece sob a forma de uma índia pequena e forte, doida por fumo e aguardente.
Em outras regiões do Brasil, é um caboclo baixo e reforçado, coberto de pelos, que surge montado num porco do mato ou caititu. No Sul, o caipora é um homem peludo e agigantado. O Caipora ou Caapora toma ainda outras formas.
Sua missão é, porém, sempre a mesma: proteger a caça da sanha dos caçadores malvados. Quem mata animais com crueldade ou persegue fêmeas com filhotes é logo castigado pelo Caipora. Nas sextas-feiras, mesmo com luar, é proibida a caça. Nos dias santos e domingos não se pode também caçar.
Quando os homens infringem as leis do Caipora, ela espanta a caça, surra os cachorros, faz um barulho infernal e persegue furiosamente os caçadores, que largam as armas e fogem espavoridos. Mas os que o respeitam e levam-lhe fumo e aguardente podem caçar à vontade. Não devem, porém, atirar em animal com filhote, nem em bicho isolado ou no último do bando.
Os caçadores que não entram em combinação com o Caipora nada conseguem. Perdem o seu tempo e o seu chumbo, pois os animais que caem varados pelas balas, mesmo os mortos, se levantam, ressuscitados, ao contato do focinho do porco, no qual se acha montado o Caipora. Para outros sertanejos, o Caipora é alma de índio bravo que morreu pagão.
Contam ainda muitas histórias a respeito do poder mágico dessa figura lendária. caipora.
Vejamos uma delas:
Câmara Cascudo diz que depois de uma caçada feliz, no município de Augusto Severo, no Rio Grande do Norte, acamparam os caçadores, à noitinha, para arranjar o jantar.
Entre outras peças escolhidas, prepararam um tatu, que se come assado no próprio casco.
Puseram o tatu, sem intestinos, atravessado por uma vareta de espingarda, em cima do fogo. E cada um contava e ouvia episódios do dia.
De repente, montando uma “queixada”, passou pelo meio dos homens o Caipora. Na mesma velocidade com que ia, disse decidido: “Vambora, Juão” (Vamos embora, João).
E João, o tatu, meio assado e sem vísceras, acompanhou-a, como um relâmpago.
Continua na próxima edição…
*Wilma Tereza dos Reis Praia, nascida em Manaus, é formada no Curso Técnico de Análise Clínicas pelo Colégio Amazonense D. Pedro II. Trabalhou como funcionária pública na extinta CODEAMA e ministrou aulas particulares para estudantes de nível médio. Atualmente, dedica-se à digitação de artigos acadêmicos e pesquisa sobre povos e lendas da Amazônia. Dessa pesquisa, nasceu sua obra “Raízes da Amazônia – LENDAS DA AMAZÔNIA”, composta por dois volumes, cada um contendo 45 lendas, publicada em 2011.
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