Manaus, 27 de agosto de 2025

Segurança Nacional ou chantagem comercial? A OMC, Trump e o futuro da Zona Franca de Manaus

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“O que está em jogo não é apenas uma tarifa de 10% ou uma sobretaxa de 40% – e sim o futuro de setores produtivos inteiros, com destaque para a Zona Franca de Manaus. Os Estados Unidos têm sinalizado que não querem mais depender de cadeias globais em setores considerados “sensíveis”, como tecnologia, energia e defesa. E qualquer país que esteja no meio do caminho dessa reindustrialização americana corre o risco de ser atropelado pelo trator da segurança nacional.”

resposta protocolar do governo Trump ao pedido de consultas do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), publicada no final da tarde nesta sexta-feira, Folha de São Paulo, parece, à primeira vista, um sinal de civilidade diplomática. Aceita-se o pedido de diálogo, mas se ergue um escudo retórico: segurança nacional. Um argumento que, embora reconhecido formalmente no âmbito da OMC, tornou-se a nova muleta protecionista da potência norte-americana em tempos de beligerância comercial disfarçada de patriotismo econômico.

O governo anterior não inventou isso, Trump apenas elevou à categoria de doutrina. E o Brasil, mais uma vez, vê-se na incômoda posição de coadjuvante num tabuleiro que exige assertividade, estratégia e firmeza.

foto: History in HD/Unplash

A cortina de fumaça da “segurança nacional”

O que está em jogo não é apenas uma tarifa de 10% ou uma sobretaxa de 40% – e sim o futuro de setores produtivos inteiros, com destaque para a Zona Franca de Manaus. Os Estados Unidos têm sinalizado que não querem mais depender de cadeias globais em setores considerados “sensíveis”, como tecnologia, energia e defesa. E qualquer país que esteja no meio do caminho dessa reindustrialização americana corre o risco de ser atropelado pelo trator da segurança nacional.

O Brasil é uma vítima conveniente. De um lado, somos fornecedor de insumos estratégicos (como terras raras e alimentos), de outro, temos um setor industrial ainda dependente da exportação e pouco protegido em termos geopolíticos. Trump, como já demonstrou em seu primeiro mandato, não joga xadrez diplomático: prefere dominó com peças grandes e impacto rápido.

O que o Brasil pode – e deve – fazer?

Aceitar o jogo da OMC é importante, mas insuficiente. A instância máxima de apelação da entidade está paralisada desde 2019… por culpa dos EUA. Ou seja, mesmo que o Brasil ganhe, pode não levar. Essa é a ironia cruel de um sistema multilateral que virou refém de quem deveria sustentá-lo.

O Brasil precisa fazer três movimentos estratégicos:

  1. Internamente, reforçar a política industrial, sobretudo em áreas sensíveis ao tarifaço americano, como o setor eletroeletrônico e de tecnologias sustentáveis. A Zona Franca de Manaus cumpre um papel de peça-chave nesse esforço – e precisa ser tratada como tal.
  2. Diplomaticamente, articular com outros países do G20 e BRICS a pressão pela reativação do Órgão de Apelação da OMC. O multilateralismo não pode continuar sendo sabotado por interesses unilaterais disfarçados de patriotismo.
  3. Geoeconomicamente, criar alianças bilaterais com países que também estejam sofrendo com a agressividade comercial dos EUA. União Europeia, Índia, Indonésia, México e África do Sul podem ser bons parceiros nessa frente.

E a Zona Franca de Manaus?

ZFM está dentro da equação de um novo tipo de guerra: a guerra por autonomia produtiva com valor agregado. Os EUA sabem que o Brasil tem capacidade de desenvolver, no coração da Amazônia, tecnologias verdes e cadeias industriais compatíveis com o século XXI. Ao sufocar setores estratégicos com tarifas, Trump sinaliza que não quer concorrência – nem mesmo simbólica – vinda da floresta em pé.

Polo Industrial de Manaus. Foto: Divulgação/Suframa.

Mas há uma oportunidade escondida nessa crise. O Brasil pode fazer da ZFM um símbolo de soberania produtiva verde, resistindo ao desmonte industrial e às pressões externas. É hora de redirecionar incentivos, conectar a Zona Franca às universidades, às startups e aos fundos de inovação sustentável. Defender a ZFM hoje é defender o futuro industrial do Brasil e sua posição no mundo.

Um alerta final

O prazo para a consulta na OMC é uma incógnita, tampouco há garantias de que ela vá gerar resultados práticos. O que há, no entanto, é um símbolo: os EUA aceitaram conversar. Cabe ao Brasil fazer dessa brecha uma trincheira de defesa estratégica. Porque enquanto Washington protege seu aço, alumínio e chips com o manto da segurança nacional, cabe a nós proteger o que temos de mais valioso: nossa soberania produtiva e ambiental.

A Amazônia não pode ser o preço da rendição comercial.

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