Ela estava sobre a ponte
lavando as roupas do dia,
anáguas alvas e saias
fora as roupas que eu não via,
ela se chamava Eulália
e a irmã Rosa Maria,
águas do rio passavam
com manhosa correria,
ela tecia os vestidos
do tecido que a vestia,
riscado bom e algodão,
seda só se fantasia,
ao sol de chofre na terra
a paisagem se tremia,
ao largo os botos boiavam
com dengosa galhardia,
na beira os peixes menores
corriam na maresia,
ao lado um campo de cana
brava, verde se estendia,
ela subia da ponte
suas roupas recolhia
na vasta testa gramada
da ribanceira que ardia
ao sol violento que alava
já perto do meio-dia.
Ela estava sobre a ponte
lavando as roupas do dia,
anáguas alvas e saias
fora as roupas que eu não via,
um fino e claro vestido
que molhado lhe vestia
o seu corpo de vinte anos
que todo transparecia,
as ondas rijas dos seios
ela toda inteira eu via,
a perna esquerda encurvada,
a direita se estendia
descoberta até à coxa
que sob o sol reluzia.
Um grande mapa de sangue
sobre as tábuas se esvaía,
um grito de dor, cortado,
pelo vento se partia,
o peixe liso passava
rente à ponte que se havia
coberto da luz e lágrima
que dos olhos lhe descia
– pobre Eulália que era virgem
e que não mais o seria!
O peixe feriu-lhe o sonho
no corpo que se perdia.
Isto aconteceu no rio,
no verão, num certo dia.
Views: 19