Manaus, 9 de outubro de 2025

Mano Jorge

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*Sylvia Aranha de Oliveira Ribeiro

Biografia de Dom Jorge Marskell

continuação …

CAPÍTULO 5

TEMPOS DA DITADURA MILITAR

Falamos do Concílio Vaticano II e das mudanças que ele trouxe para a Igreja. Mas a Igreja é formada de homens e mulheres; no Brasil, de brasileiros.

Em 31 de março de 1964, o governo do presidente João Goulart foi derrubado por um golpe militar que instalou uma ditadura no Brasil.

A chamada “revolução” se apresentava como a salvação do país contra o comunismo. A Igreja no início apoiou-a; aos poucos foram ficando claros os verdadeiros objetivos do golpe, instalou-se a doutrina da segurança nacional e tiveram início as violações dos direitos humanos: prisões, torturas, assassinatos de líderes operários, lavradores, políticos, estudantes. Ninguém podia se manifestar contra o poder estabelecido.

A renovação da Igreja trazida pelo Concílio Vaticano II (1962-65) e depois pelo encontro dos Bispos em Medellin, em 1968, eram vistos como provocação e subversão da ordem. Muitas das organizações da Igreja foram impedidas de funcionar.

Miguel O’Kane escreve no seu artigo já citado:

Líderes leigos, padres e religiosos tornaram-se os principais alvos de suspeita e seu trabalho, atividades, sermões e movimentos ficaram sob investigação pelos militares.

Muitos missionários estrangeiros foram expulsos do país, enquanto o clero local que falava contra os militares era sujeito à hostilidade, prisão e, em alguns casos, detenção sem julgamento e com torturas.

E Miguel O’Kane acrescenta:

A ditadura militar nos jogou, como nenhum outro professor o poderia ter feito, na realidade política do Brasil, da América Latina e do mundo.

Nos anos seguintes, a Igreja do Brasil, única instituição que poderia desafiar o Estado, tornou-se por meio de seus líderes, a voz dos que não podiam se manifestar.

Em Itacoatiara, a Igreja também assumiu as propostas de Medellin e as perseguições começaram a atingi-la.

Pouco antes da viagem do padre Jorge para o Canadá, chamado a participar do Conselho da Sociedade de Scarboro em meados de 1968, aconteceu em Itacoatiara o I Encontro de Vereadores do Médio e Baixo Amazonas. Seguindo o clima de intolerância política que se instalava no país contra os que lutavam pela justiça e defendiam os direitos dos mais carentes, foi aprovada uma moção de suspeição contra os missionários de Scarboro.

O Vigário Jorge Marskell dirigiu, em 3 de agosto desse mesmo ano, uma carta aos vereadores em que dizia que, Padres e freiras canadenses estavam em Itacoatiara para ajudar seus irmãos necessitados trabalhando a serviço do povo de Deus, da Igreja que está no Amazonas… (…) pretendendo somente uma coisa: continuar a obra de Cristo salvar e não condenar, servir e não ser servido (SILVA, 1999, p. 220).

No Canadá, padre Jorge pôde acompanhar ainda que de longe, a situação política do Brasil, por meio dos contatos com exilados brasileiros, refugiados naquele país em decorrência do Ato Institucional n.o 5, de 1968.

Por falar o português, padre Jorge foi designado para prestar assistência aos exilados, entre os quais se encontrava o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, de quem se tornou amigo.

No final da década de 1970, a ditadura e a intolerância política ainda se faziam presentes em Itacoatiara: a correspondência endereçada ao bispo, padres, agentes de pastoral era frequentemente violada e censurada.

Em 1988, Jach Chiang se refere em artigo publicado em The Whig Standad Magazine a uma recordação de Dom Jorge: num dia 7 de setembro, data em que se comemora a Independência do Brasil, alguns milhares de panfletos foram jogados nas ruas de Itacoatiara, convocando a população a expulsar os padres estrangeiros, porque eles eram “subversivos, comunistas e agitadores” (CHIANG, 1988).

Continua na próxima edição…

*Sylvia Aranha de Oliveira Ribeiro, nascida no Rio de Janeiro em 1930 e criada em São Paulo, formou-se em Filosofia e Pedagogia, obtendo um mestrado em Filosofia da Educação. Em 1977, mudou-se para Itacoatiara como missionária leiga, trabalhando na Prelazia com comunidades eclesiais de base e na formação de lideranças populares. É cofundadora da Associação Dom Jorge Marskell (desde 2001) e membro da Academia Itacoatiarense de Letras.

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