Continuação…
Acontecimento
Tenório Telles cuida dos livros dos outros e se esquece dos seus. Apareceu no ambiente intelectual como ensaísta, um dos mais competentes estudiosos da poesia brasileira na Amazônia. Depois se descobriu que ele era professor e poeta. Em seguida, revelou-se o grande promotor da vida intelectual de Manaus. Concebeu com tal atitude um ministério. Missão. Transformou-se num acontecimento. Concentrou-se no trabalho. Incomodou os peraltas e despertou a deferência e o louvor dos idealistas. Lançou-se ao estímulo dos poetas e escritores da literatura que eu diria padecente, isto é, daquela literatura realizada por autores vivos, sujeitos ainda às injunções do processo crítico, aos banzeiros atrozes da vaidade explícita e agressiva dos néscios e da dissimulada dos espertos. Foi mais fundo. Velejou pelas águas encapeladas dos clássicos, daqueles escritores e poetas, ensaístas e intérpretes que, nos arcanos de nossa vida intelectual, viraram a Amazônia pelo avesso, a cuidar dos seus mistérios e da sua realidade geográfica, social e política. Concentrou na ação da Valer, no catálogo da editora, a mais completa amazoniana da história da cultura brasileira, com a impressionante dedicação que não deixa que nenhum texto impresso, nenhum livro editado vá para a rua sem a sua supervisão, sem o seu imprimatur. Os autores por vezes se inquietam com a demora dos lançamentos, mas não adianta reclamar, antes de um bom acabamento na preparação do texto, na diagramação das páginas, nas ilustrações e definição sobre as cores da capa, o livro não sai, o professor Tenório não deixa que saia, em respeito ao público apreciador da boa leitura, com energia e seriedade, qualidades mais determinantes em sua forma de ser e de agir.
Já era hora, portanto, do leitor presentear-se com um livro novo de Tenório Telles, coletânea de crônicas selecionadas dos jornais em que tem publicado os seus escritos elaborados, no silêncio das suas horas de reflexão sobre a vida e os acontecimentos. Visões de alegria e de tristeza ao se deparar com a realidade, as asperezas, a maledicência, os conflitos na luta pela existência, sem, contudo esconder-se no escuro da indiferença, longe das luzes da esperança.
Constitui a crônica a mais legítima forma de expressão do jornalismo como gênero literário. Em regra, ocupa-se dos fatos da vida social e política da coletividade. O cronista chama a atenção do leitor para um ponto de destaque do noticiário do dia. A recepção da madame e o despejo dos invasores de uma propriedade urbana, que ocupam democraticamente o mesmo jornal, embora em cadernos específicos, merecem igual atenção do cronista. Assim sucede nas peças deste livro de Tenório Telles. Impressões de viagem como está em Uma história singela (p. 49), em que fala de suas impressões da visita feita ao Mosteiro dos Jesuítas, na serra de Baturité, no Ceará; a matéria do noticiário policial em Trágico cotidiano (p. 57), em que lastima o envolvimento de um jovem de apenas 22 anos no mundo do crime; a elegia, o lamento pela morte do Sr. Armando Lucena, um líder popular de muitas lutas, intitulado Seu Armando, homem de bem (p. 66). Textos que constituem o âmago de um livro de 137 páginas dedicadas, na maior parte, à análise de ideias, à agitação de sentimentos que constituem também uma das características mais acentuadas do gênero. Aí, então, as crônicas se mostram como pequenos ensaios, poemas em prosa ou prosa de ficção, onde Tenório se expande com a maior desenvoltura. Aí Tenório não se cansa de sublinhar os valores morais, os bons sentimentos e a beleza da vida que não se completa sem o bom comportamento dos cidadãos e das suas lideranças. Firma-se a reprovação aos maus costumes e os louvores às nobres emoções.
Em A vida é um sonho possível (p. 16), diz, finalmente, Tenório:
Apesar das guerras, dos desastres, da fome, da morte e da maldade, a vida se insurge e renasce todos os dias, conspirando a favor da mudança, do bem, do belo e do novo. É uma metáfora viva da promessa de renovação e de redenção do ser humano e do mundo…
Que o leitor usufrua do prazer da leitura neste belo RENOVAÇÃO de Tenório Telles.
Se o estilo é o próprio homem, no remoto dizer de Buffon, neste livro o leitor viverá momentos de convívio com o pensamento, a vida, os ideais e sentimentos de um dos mais probos e incansáveis trabalhadores intelectuais de nosso meio.
Manaus, Praia da Ponta Negra, 6 de maio de 2011.
Continua na próxima edição…
*Poeta e ensaísta. Membro da União Brasileira de Escritores do Amazonas da Academia Amazonense de Letras do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas
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