Manaus, 12 de dezembro de 2025

Estrada Manaus – Itacoatiara

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*José Lins

O livro “Estrada Manaus Itacoatiara”, obra de José Lins, é aqui republicada em série com a devida autorização gratuita do Governo do Estado do Amazonas, por meio da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, Departamento de Gestão de Bibliotecas (DGB) e seu Centro de Documentação e Memória da Amazônia (CDMAM). A republicação tem fins exclusivamente históricos e culturais.

EDITADO PELO GOVÊRNO DO ESTADO DO AMAZONAS
Secretaria de Imprensa e Divulgação
Palácio Rio Negro

Apresentação

NESTE 5 DE SETEMBRO DE 1965, quando o Amazonas comemora o 115.º aniversário de sua elevação à categoria de Província, Govêrno do Professor Arthur Cézar Ferreira Reis inaugura a estrada Manaus-Itacoatiara. Um acontecimento pioneiro, êsse da abertura ao tráfego de veículos da ligação, por via terrestre, da capital amazonense, na margem do Rio Negro, à Velha Serpa, na margem do Médio Amazonas. E’ a realização de um sonho que nasceu na última década do ano distante de 1800.

Nas páginas desta plaquêta conta-se a história daquela rodovia, desde a primeira notícia sôbre a idéia de Torquato Tapajós, visando à construção de uma estrada de ferro entre Manaus e Itacoatiara, até o dia de hoje. O que aqui se relata não é simplesmente a vida desta rodovia, mas também a história anônima dos homens – operários e técnicos que a construíram, ou seja, a história do trabalho pioneiro, que ganhou maior ímpeto de grandeza nos meses decisivos em que a Administração do Estado passou a confiar no próprio DER-Am. a sua execução.

José Lins, a quem coube elaborar estas páginas que se seguem, deixou de encontrar nos arquivos do DER-Am. muitos documentos que poderiam ser preciosos na revelação de novos ângulos da vida da AM-1. Mas, o que aqui se pretende, não é apegar-se à revelação de fatos estranhos à existência da rodovia, tampouco fugir da realidade daqueles episódios que possam tê-la, em algum tempo, estigmatizado como instrumento de fins menos lícitos. O que se pretende, sobretudo, é exaltar o trabalho, principalmente, dos homens que a construíram.

Este é, portanto, um documento que oferecemos ao povo amazonense, narrando, com realismo e à luz de números e cifras, a história de uma estrada pioneira, que significa a penetração na parte central do Estado e o início da fixação do homem amazonense em terra firme, mudando-se, por consequência, o seu hábito de apêgo às várzeas, onde sente, por tradição de longos anos, o fascínio do comando do rio sóbre a sua própria existência.

MANAUS, setembro de 1965.

JOSÉ CIDADE DE OLIVEIRA

A “Primeira Idéia

A PRIMEIRA notícia que se tem da construção de uma estrada estabelecendo ligação entre Manaus e o município de Itacoatiara, data da última década de 1800, com o relatório apresentado pelo engenheiro amazonense, Doutor Torquato Xavier Monteiro Tapajós, quando procedeu a um estudo em que visava a construção de uma estrada de ferro entre esta capital e aquela cidade do Médio Amazonas.

Êsse relatório, que se encontra manuscrito com a grafia do próprio autor, acha-se entre os papéis do nosso Arquivo Público, não tendo sido publicado. Sabe-se, entre- tanto, que aquêle engenheiro escreveu um trabalho intitulado “Colonização e immigração”, apresentado ao Doutor Fileto Pires Ferreira, que, à época, governava o Estado do Amazonas, trabalho êsse publicado no ano de 1897, em Manaus, poucos meses antes de Torquato Tapajós falecer. Nêle o autor já se preocupava com a radicação dos primeiros imigrantes na parte central do Estado, abandonando as margens dos rios.

Talvez a construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré tivesse influído bastante no espírito do engenheiro que tentava firmar, em nossa terra, semelhante emprêsa com a construção de uma estrada de ferro.

Inegávelmente, Torquato Tapajós muito contribuiu para o ímpeto criador do Amazonas. Nas entrelinhas do citado trabalho, encontramos fragmentos do seu grande sonho que seria, como o de outros amazonenses – conquistando a terra firme, transformar êste Estado numa terra plena de prosperidade.

Torquato Tapajós, assim, foi quem lançou a semente, terreno da idéia, da construção da rodovia que agora a administração do Professor Arthur Cézar Ferreira Reis inaugura na data em que o Amazonas festeja mais um aniversário da sua maior efeméride – a da sua elevação à categoria de Província.

A Estrada do Telégrafo

No ano de 1899, o Coronel Ramalho Júnior, então Governador do Estado, determinou que se abrisse uma “picada” que o seu marco inicial no atual cruzamento das ruas Paraíba e São Salvador, no Bairro de Adrianópolis, e passava pelo município de Itacoatiara, estendendo-se até Paraná do Bôto, no município de Parintins.

Êsses trabalhos foram supervisionados pelo engenheiro A. de Paiva Mello, conforme o ítem II do contrato celebrado entre o Estado e o Senhor Sebastião José Diniz. O aludido têrmo contratual encontra-se publicado no “Diário Oficial” do Estado n.º 1728, de 26 de novembro de 1899, cujo texto transcrevemos como o primeiro documento existente a respeito da futura estrada, hoje AM-1 e, à época, traçada por outros caminhos ..

TERMO DE CONTRATO – que assina o cidadão Sebastião José Diniz: – “Aos vinte e dois dias do mês de agôsto de mil oitocentos e noventa e nove, nesta cidade de Manaus, capital do Estado do Amazonas, na Secretaria dos Negócios da Indústria, sita à Praça da República, onde se achavam presentes os senhores Secretário da mesma Doutor Anísio de Carvalho Palhano, Dr. Diretor de Obras Públicas, Luiz Raymundo de Brito Passos, procurador fiscal da Fazenda Dr. Joaquim Ribeiro Gonçalves, aí compareceu o cidadão Sebastião José Diniz, representado por seu procurador Manuel Luiz Alves, que disse vinha assinar o presente têrmo de contrato sob as seguintes condições :

I – O contratante obriga-se a fazer a abertura da estrada do Telégrafo entre esta cidade e a de Parintins de acôrdo com os preços da Tabela que a êste acompanha, como parte integrante e de acôrdo com os estudos mandados proceder pelo Govêrno.

II – A roçada e limpa do terreno será na largura que for determinada pelo engenheiro do Govêrno encarregado da fiscalização das obras e de acôrdo com a natureza topográfica e vegetal do terreno.

III – Em faixa, em tôda a extensão da estrada e pelo centro em largura mínima de dois metros, procederá o contratante ao destocamento do terreno.

IV – O Govêrno providenciará para que o serviço não fique paralizado por falta dos estudos de exploração, devendo antes de iniciar-se qualquer trêcho ser entregue ao contratante a respectiva planta com as necessárias indicações de largura.

V – O contratante dará comêço aos trabalhos dentro de trinta dias e concluirá no prazo de seis: meses depois.

VI – Esgotados os trinta dias e não sendo dado comêço aos trabalhos entende-se rescindido o contrato por parte do contratante.

VII – Os trabalhos serão medidos nos primeiros dez dias de cada mês e pagos nos vinte dias que se seguirem.

VIII – O contratante fará no Tesouro do Estado uma caução de cinquenta contos de réis para garantir a boa execução do serviço.

IX – Pela inobservância das presentes cláusulas incorrerá o contratante na multa de duzentos a quinhentos mil réis e o dôbro na reincidência.

X – O presente contrato só poderá ser rescindido por acôrdo mútuo das partes contratantes e caso não exista êste, incorrerá a parte que der causa à rescisão na multa de dez por cento sôbre o valor do contrato.

XI – Os casos de fôrça maior devidamente julgados pelo Govêrno serão atendidos.

XIl – O contratante submeter-se-á às condições regulamentares da Diretoria de Obras Públicas. Tabela de preços: metro quadrado de roçado e limpa em mata virgem e capueira de machado, quatrocentos réis. Metro quadrado de roçado e limpo em capueira, trezentos e sessenta réis. Metro quadrado de destocamento, quinhentos e cinquenta Guia. Via 2.º. Visto A.C.P. Visto Pinto França. O cidadão Sebastião Diniz vai ao Tesouro do Estado depositar a importância de cinquenta contos de réis para garantia do Contrato que assina para abertura da estrada do Telégrafo entre esta Capital e Parintins, cuja importância fica depositada até a conclusão do serviço.

Secretaria dos Negócios da B. Indústria, 18 de agôsto de 1899. Oficial, Luthegardes Aureliano Poggi de Figueiredo. Recebi a importância de cinquenta contos de réis.

Tesouro, 18 de agôsto de 1899. J. B. Grana. Em firmeza do que lavrou-se o presente têr de contrato que vai assinado pelo Dr. Secretário da Indústria Anísio de Carvalho Palhano, Diretor de Obras Públicas Dr. Luiz Raymundo de Brito Passos, procurador fiscal do Estado doutor Joaquim Ribeiro Gonçalves, o contratante Sebastião José Diniz, representado por seu procurador Manuel José Alves e duas testemunhas infra. Em tempo: o procurador é Manoel José Alves e não Manoel Luiz Alves, como está escrito no comêço do contrato. Nota: não sendo conhecido o valor do presente contrato, averba-se sêlos e emolumentos para serem descontados das medições mensais. Eu, Bruno Batista, auxiliar o escrevi. Eu, Luthegardes Aureliano Poggi de Figueiredo e, Oficial mandei escrever e subscrevo. (Assinados) Anísio de C. Palhano, Luiz Raymundo de Brito Passos, Joaquim Ribeiro Gonçalves, pp: Manoel José Alves, Henrique José Moers e Antônio de Araújo Lima”.

CONCLUSÃO DOS TRABALHOS – Os trabalhos objetos do contrato transcrito foram concluídos no dia 9 de julho de 1901. Nessa data inaugurou-se a linha telegráfica entre Manaus, Itacoatiara e Parintins, até o Paraná do Bôto, conforme fôra previsto na decisão governamental de 1899. Dezoito anos mais tarde, em 1919, o acadêmico de Direito Dornellas Câmara publicou um trabalho intitulado “Colocação no Amazonas dos flagelados do Nordeste”, focalizando, em lances rápidos, a necessidade da construção de uma estrada ligando Manaus a Itacoatiara.

Continua na próxima edição…

*O Professor Doutor José dos Santos Lins foi um importante educador e escritor amazonense, reconhecido por sua contribuição fundamental para o ensino e a literatura do Amazonas, especialmente na segunda metade do século XX. Sua atuação se deu primariamente na docência, tendo sido consistentemente referido como Professor Doutor, indicando uma formação acadêmica de alto nível. Sua obra mais notável é a “Seleta Literária do Amazonas”, publicada em 1966. Este livro se tornou um material didático essencial, servindo como uma importante compilação de textos para garantir que as novas gerações tivessem acesso e compreensão da história e da literatura regional do Amazonas.

 

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