Manaus, 20 de setembro de 2024

A Cidade de Manaus – Sua história e seus motins políticos

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*Bertino de Miranda

XV

Manáos sob o jugo dos Cabanos. – Assassinato de Bernardo de Sena. – Freire Taqueirinha assume o Comando Militar.

Seis meses esteve Manáos sob o jugo dos Cabanos. Sena mete-se em todos os assumptos e afeta um escrúpulo excessivo pelos dinheiros públicos. Parece que não é crime fazer-lhe essa justiça.

Naturalmente, sua vontade não encontra obstáculo. Todos deviam querer adivinhar os seus pensamentos e aplaudir com entusiasmo os seus discursos.

Eduardo Angelim fôra aclamado em caractere provisório. Cabia a Câmara obter da Côrte a aprovação definitiva. Sena achou prudente retratar com as cores mais vivas o seu herói. «Os Povos em geral o adoram, assevera ele n’uma das suas arengas costumadas; respeitam-no como um anjo tutelar. E’ o Benfeitor e Libertador de seus patrícios». Mas se a Côrte não aprovar a sua escolha, propõe então o Deputado Provincial Roberto Pimentel, Correa Seara, José Martimiano de Alencar ou o Vigário Geral João Pedro Pacheco. Este é um dos oráculos da Villa; com muita manhã, durante o governo que chamaram intruso, aplaude sempre todas as suas exigências. A Câmara dirige uma súplica á Regência, pedindo-lhe que livre os Paraenses do Presidente português que bloqueia infamemente a Capital da Provincia. Sena assigna por si e por oitocentos Guardas que não sabiam ler nem escrever (Acta de 9 de Março de 1836).

De Abril a Maio, Sena se ausenta de Manáos. Tal- vez alguma excursão á Serpa ou ao Baixo Madeira. E’ substituído por Freire Taqueirinha, que alguns cronistas colocam entre os Comandantes Militares da Comarca. Era homem de influência; contudo, nunca se assinalou por qualquer lance de bravura, possuía, porém, como os outros, que adulavam e traiam os Cabanos, uma grande dose de dissimulação. Neste particular, levava as lampas ao Vigário Geral Pacheco. Maparajuba tem no em muita conta. E’ a pessoa que ele indica para substituto de Sena, já decaído do fastígio em Icuipiranga.

Sena reaparece em Maio (22). É intuitivo que Maparajuba ter-lhe-ia escrito, intimando-o a deixar o Comando. Obedece prontamente, e declara que é para evitar, a todo o custo, as dissenções que surgiriam entre os patriotas, si ele continuasse em evidência na Villa. Já por várias vezes, observa, tenho pedido dispensa d’este cargo. (ibid. 22 de Maio). Taqueirinha levanta-se e recusa assumir tamanha responsabilidade. Não pode aceitar a indicação de seu nome. «Fôra preciso, assim pensa, que se apagassem da face de Deus e dos homens os relevantes serviços de que era possuidor o dito Comandante Sena, e nem jamais caberia roubar-lhe a glória de tantos triunfos que hoje se formam à melhor sorte desta Comarca» (ibid.) A comedia continua. Para o Presidente da Câmara, consentir-se na retirada de Sena é tornar os Manauenses uns ingratos. O Sr. Sena, conclui, não pôde deixar o Comando sem que primeiro Eduardo Angelim se manifeste a respeito» (ibid.)

Todo este jogo, após alguns dias, teve o seu desenlace lúgubre (2 de Junho). De ordem de Sena toca-se a rebate no Quartel. São presos um sargento e um popular. Intervém o Juiz de Paz e é expelido pelos Guardas. Afinal, aparece Taqueirinha e grita colérico que não é assim que se deve tratar dois brasileiros beneméritos. Nesses tempos calamitosos, compreende-se, todos são beneméritos. O bate-boca entre os dois Chefes ameaça degenerar n’um pugilato. A tropa, ou já apalavrada, ou para cortar o nó górdio, dá uma descarga. Sena cai morto. Um de seus apaniguados quer ainda resistir. É também morto mais adiante (Act. de 2 de Junho).

A oração fúnebre que Taqueirinha profere sobre o cadáver de Sena, sem dúvida para lisonjear os Rebeldes, é que a sua morte fôra a salvação da Comarca, por espiar com ela as suas malignas intenções. Aquele monstro, acrescenta, procurava indispor-nos com os nossos Patrícios do Baixo-Amazonas. João Pacheco, no seu eterno papel de augure, pergunta aos soldados se querem Taqueirinha para chefe. A resposta foi um grito uníssono. E’ como está na Acta. Um dos sargentos exige que o popular José de Figueiredo seja preso por um mês para ter mais cuidado na língua. Foi prontamente atendido. Era o Pasquino da terra. Seus motejos feriam de preferência o amor próprio dos Patriotas.

Sena conduzira oitocentos homens na sua expedição libertadora de Março. Agora restavam apenas oitenta e um, que ainda inspiram, como se viu, algum receio. Para agradá-los, remetem a Maparajuba diversas declarações adesistas. Pacheco oferece-se para ir ao Rio de Janeiro solicitar uma amnistia geral e a separação da Comarca (ibid. 23 de Julho).

Taqueirinha estende o seu governo aos últimos dias de Agosto. Na aparência, as cousas serenam. A Villa engolfa-se na quietude patriarcal dos outros tempos. A Câmara reúne em sessões ordinárias; instada pelos Moradores, consente na abertura d’um Café. Isto demonstra, Sr. Presidente e Srs. Colegas, diz um dos Vereadores, que a paz está afiançada e cada um procura tratar de sua vida e de seu negócio» O Café veio a ser um ninho de exaltados que exigiam aos berros a morte dos Rebeldes.

*Bertino de Miranda (1864-1919). Jornalista e historiador paraense. No final do século XIX para início do século XX participou ativamente da vida social, política e cultural do Amazonas. O livro de sua autoria, que em partes levamos ao conhecimento do nosso

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