*Éder de Castro Gama
Continuação…
CAPÍTULO 5
Aspecto cultural de Itacoatiara: o Fecani entre tradição e inovação26
Para falar do aspecto cultural de Itacoatiara é preciso fazer um recorte para não incorrer em generalidades, pois o tema nos propõe muitos caminhos. Por isso, gostaria de propor uma discussão entre a relação de tradição e inovação no âmbito da cidade. Estas categorias analíticas nos levam a pensar quais os signos e símbolos que estão envolvidos para formação de uma identidade Itacoatiarense? Quais são os códigos identitários que são evocados pelos sujeitos que fazem cultura, ou participam das manifestações artísticas e culturais na cidade por meio das festas religiosas, festivais folclóricos, carnaval e o Festival da Canção de Itacoatiara (FECANI)?
A destradicionalização é um processo social pelo qual as cidades e as sociedades se modernizam, ao sujeitar anteriores valores, significados e acções a uma nova lógica interpretativa e de intervenção. Esta destradicionalização é movida pela necessidade de cada cidade revalorizar os seus recursos, reais ou potenciais como forma de se reposicionar no mercado da concorrência inter-cidades, cada vez mais competitivo. A concorrência intercidades é um efeito derivado da descentralização política e da desconcentração de funções que se acentuam, à medida que as sociedades se democratizam (FORTUNA, 2001, p. 234).
Em estudos realizados sobre o FECANI nos anos de 2006, 2007, 2008, que resultou na dissertação de mestrado “Festival da Canção de Itacoatiara (FECANI): o local e o regional na perspectiva de um evento musical na Amazônia – Ano 2009”, ressalta-se que, com a criação da Associação dos Itacoatiarenses Residentes em Manaus (AIRMA) e, consequentemente, a criação do FECANI pelos mesmos, culminou com o processo de redemocratização do Brasil (1985), e permitiu com que a cidade de Itacoatiara entrasse em um processo de destradicionalização. Foi o momento em que grupos que estavam no âmbito da Igreja Católica (espaço tradicional), pudessem encontrar, na AIRMA, através do FECANI, aspectos modernizantes da cultura brasileira, por meio da qual a identidade da cidade passou a ser forjada localmente e a depender do reconhecimento dado por outros.
Não queremos dizer que antes a cidade de Itacoatiara era desprovida de cultura ou de identidade, mas nos parece que era culturalmente estagnada, tradicionalista e autocentrada, baseada em eventos que eram desenvolvidos no domínio da Igreja Católica, como festas de Santos Padroeiros e, nesse caso, destacam-se as festas de Nossa Senhora do Rosário, de Divino Espírito Santo, de São Francisco e de São Pedro. Cabe lembrar que as manifestações folclóricas eram e são realizadas em épocas de festas de santos católicos, como Santo Antônio (13 de junho), São João Batista (24 de junho) e São Pedro (29 de junho).
No séc. XIX era muito comum as festividades de outros santos católicos no período do Natal, como a descrição da Festa de São Benedito. Em 1849, Henry Walter Bates e Alfred Russel (naturalistas ingleses), descrevem que, “entre as diversas cerimônias realizadas no Natal, não deixam de ser interessantes” (…), ambos relatam a realização da procissão do Sairé por todas as pessoas do lugar (brancos, índios e negros), “à noite, o povo se entregou a alegre folguedos por toda cidade. Os negros devotos de um santo que tinha sua cor – São Benedito, fizeram sua festa à parte e passaram a noite toda cantando e dançando ao compasso de um tambor comprido chamado ‘gambá’ e do ‘caracaxá’ (…) nada se comparava, em monotonia, a esses sons, cantos e danças, que continuaram pela noite adentro com inexaurível vigor” (SILVA, 1997, p. 82).
Outra prática que era muito comum na cidade de Itacoatiara eram as festividades dos “Santos de Casa” como descrito pelo jornal Paládio em 1928. Sobre o título Nossa Senhora do Desterro (SIC).
Terminaram no domingo último as festas em Louvor a N. S. do Desterro, na casa de residência da Srª d. Raymunda Alfaia de Lima. A banda musical “5 de setembro” tocou durante todo o dia, e a noite, uma orchestra da referida banda executou variado programma composto de valsas, polkas, (…) dançadas por uma infinidade de elegantes pares. A hora marcada teve lugar o almoço que, devido a impetuosa chuva, foi pouco concorrido. Pelas 5 ½ horas da tarde, uma girandola de foguetes anunciou a derribação do mastro, scena empolgante. Após a derrubação do mastro, começou o jantar, cerimônia religiosa e danças. A concorrência havida nesta festividade não podia ser melhor. Há muito não vêm festa assim, tão concorridas. Felicitamos os juízes e mordomos pela série saudosa de agradáveis passatempos. (in: PALADIO. ORGÃO DO CLUB RECREATIVO ITACOATIARENSE. Itacoatiara. Quinta feira 19 de novembro de 1908. Título: “N. S. do Desterro”. Microfilme R- 003. Museu Amazônico. Acervo J.G ARAUJO).
Entre as festas religiosas realizadas na cidade de Itacoatiara, é importante destacar um estudo feito em 2003, sobre a festa de Nossa Senhora do Rosário, padroeira do município. Esta festividade remonta registros em meados do século XIX, também por Bates (1849), na época do Natal, homenagens festivas à Santa, envolvendo missa, procissão e arraial, bem como a presença de diferentes grupos étnicos, como indígenas, negros e brancos.
É importante ressaltar que as festas religiosas no período colonial “permitiam a todas as camadas sociais a diversão, a fantasia e o lazer” (MARY DEL PRIORE, 2000), supondo a ideia de uma “festa dentro da festa” para mostrar que “há vários sentidos nas funções aparentemente irrelevantes da festa”, podendo existir diferentes motivos sociais característicos para grupos ou segmentos distintos de pessoas. Ressaltasse também a ideia de um “ciclo festivo” (BRANDÃO, 1975), pois há múltiplas festividades, sagradas e profanas, no âmbito das festas realizadas no Brasil.
Pode-se dizer que a festa de Nossa Senhora do Rosário, congrega diferentes motivos para as diversas categorias de pessoas e grupos sociais que encontram no âmbito da festa do Rosário, como é o caso dos fiéis que estariam interessados em usufruir e praticar das atividades sagradas, como os novenários, casamentos, cultos à imagem e atividades profanas, como o arraial, quermesse, jogos de azar, apresentações musicais, entre outras. Quanto aos organizadores do evento, estes estariam interessados em promover e dar visibilidade à festa, integrando-se, sobretudo, às comissões e grupos de trabalho voltados para organização e divulgação da festa do Rosário. É notório que a festa do Rosário cresceu durante os anos e foi agregando novos valores com as necessidades de seus participantes, ainda que esses valores impliquem em demandas da contemporaneidade, como a necessidade de ocupação de trabalhadores temporários, aquisição de prestígio por personalidades a nível local, desenvolvimento de um turismo de eventos promissores, a festa em seus aspectos religiosos e a dimensão mais significativa em âmbito local.
Nos idos de 2006, 2007 e 2008, as datas cívicas corroboram aspectos de manifestações tradicionais, como nas paradas militares dos dias 07 de setembro (dia da Independência do Brasil) e 05 de setembro, comemoração de Elevação da Comarca do Alto Amazonas à categoria de Província. Essas duas datas são significativas para o município, porque durante uma semana, as escolas públicas e particulares e as duas universidades UFAM e a UEA marcham na avenida central em honra aos poderes Militares, Executivos, Legislativo e Judiciário. É o momento em que as fanfarras escolares ganham visibilidade. E por último, as manifestações festivas desenvolvidas por clubes tradicionais da cidade, como o Náutico Esporte Clube que, em época do carnaval, realiza o Baile Vermelho e Preto, o Botafogo Futebol Clube, com seu baile de carnaval, o Lions Club, formado por funcionários públicos, a Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB) e o Centro Recreativo dos Professores de Itacoatiara (CREPI), todas com atividades para os seus associados.
Pode-se dizer que o FECANI se tornou um marco na política cultural do Município de Itacoatiara, dado o grande número de envolvimento de artistas e pessoas na sua organização, bem como na complexa forma de articulação de recursos públicos para sua realização. Fazer um evento com utilização dos recursos públicos, requer uma boa articulação política, pois é preciso garantir o repasse anual de uma verba que, muitas vezes, não entra no orçamento administrativo de um governo. Nesse caso, a concorrência intercidades marcada pelo processo de destradicionalização, depende, sobretudo, de uma ótima articulação política.
Pode-se considerar que uns dos aspectos que marcam um código estético do FECANI seriam identificados nos painéis dos palcos principais e alternativos, pois eles não estão como meras ilustrações das apresentações, mas assumem compromisso simbólico das expressões culturais da cidade.
Vale a pena lembrar do caderno de informações desenvolvido por Terezinha Peixoto (1998), na parte que trata das treze edições do Festival, a qual traz detalhadamente o significado de cada painel. Os FECANI’S de 1985 e 1986 faziam referência à musicalidade itacoatiarense, tendo como ícone principal um violão. A partir do FECANI de 1987, os painéis tendem a valorizar o patrimônio artístico, arquitetônico, histórico e natural do município de Itacoatiara, com iconografias da pedra pintada, do bolevard da Avenida Torquato Tapajós, referência aos sítios arqueológicos, pedra pintada, miracanguera, prédios históricos da época da colonização, ou do chamado tempo áureo da borracha, resquícios da batalha naval, lendas e mitos da cidade, e ao patrimônio natural, como lagos e rios da região amazônica. Mas foi no FECANI 1990 que a AIRMA iniciou expressivamente o trabalho de valorização do patrimônio histórico edificado da cidade, com a implantação dos palcos alternativos que funcionavam durante o período do dia com apresentações musicais. Segundo Peixoto (1998):
“O painel do palco principal representava o símbolo da evolução, tendo o sol iluminando o festival. Neste ano, surgiu a ideia de montar, além do palco principal, os palcos alternativos, onde foram pintados nos painéis e prédios representativos do patrimônio, como tentativa de resgatar a memória histórica de Itacoatiara, como: o Mercado Municipal (demolido em 1978). O prédio do Nicandro (demolido em 1992). O prédio Aquilino Barros e o prédio Ilídio Ramos”.
Constata-se que a primeira tentativa de se trabalhar o patrimônio cultural da cidade, está ligada à ideia de resgate e evolução, noções essas que são fundamentadas nas leituras dos folcloristas que ganham corpo, a partir da década de 1930, no Brasil. De acordo com a política de resgate de manifestações culturais e populares, acreditavam que estas estariam em via de desaparecimento (implícita às ideias de perda, de desenvolvimento linear da história) num mundo moderno e civilizado, e, por isso, caberia aos pesquisadores coletarem, sistematizar e preservar todo o material encontrado. Ainda que as noções de resgate e evolução estivessem ultrapassadas, de acordo com as ideias atuais da antropologia sobre cultura, trata-se da dinâmica e a existência de um patrimônio imaterial coletivo. Mesmo com todas as dificuldades conceituais, verifica-se a importância que a AIRMA teve em chamar a atenção aos monumentos históricos da cidade.
As argumentações desenvolvidas sobre os painéis do FECANI de 1996 contêm uma matriz de pensamento alinhada a uma interpretação da Amazônia nas décadas de 30 e 40, quando o conceito de aculturação, portanto, de contato e perda da identidade, serviam para explicar o encontro das sociedades indígenas com o homem branco e, desse contato, resultaria no caboclo (mestiço), que seria o detentor das práticas culturais indígenas, como técnicas de trabalho, crenças, moradia etc. Outra forma de pensamento presente nessa argumentação é a imposição do meio natural, biológico e geográfico sobre o cultural. É onde o homem estaria sujeito às intempéries do tempo, à seca e à cheia dos rios, a geografia do inferno verde, das feras da selva ou estaria vivendo no paraíso da fartura e da bonança, que a todo o momento é ameaçada pelo desenvolvimento do capitalismo.
Os temas que são desenvolvidos nos painéis dos palcos do FECANI, nos concursos do ITA-PALHA, ITA-ARTE, ITA-CONTA, NAITA, MOCAITA, COMPOFAI e ITA-FIME podem figurar como valorização de uma identidade local, tomada por membros da AIRMA (que atualmente tem em média dez mil associados), que na cidade se reafirmam por se tratar de elementos simbólicos e representacionais das expressões culturais e das dimensões históricas e mnemônicas da cidade.
Fortuna (2001, p. 233) considera que perante superficialização ou eventual perda das suas raízes identitárias, os indivíduos procuram, no passado e na memória da cidade, compensação para a correspondente e desconcertante ambivalência de valores. Logo, a contínua valorização estética do seu patrimônio histórico e monumental pode adquirir diferentes sentidos. Por isso, consideramos que o FECANI inicia um processo de destradicionalização na cidade de Itacoatiara, por estar forçando os poderes públicos Municipal e Estadual a ceder toda uma infra-estrutura para realização do evento, assim como os demais setores da sociedade a se preparar para o tempo de FECANI.
O autor não toma o conceito de destradicionalização como a eliminação de tudo que seja do passado, tradição, memória e história, mas como “a recodificação da tradição e, no seu entendimento, como
recurso de desenvolvimento”. Mas até que ponto esses elementos identificados no FECANI seriam suficientes para manter o processo de destradicionalização em desenvolvimento na cidade de Itacoatiara frente à concorrência intercidades?
Para Fortuna (2001), as imagens das cidades se movem universalmente entre dois polos: as imagens de tipo modernista e as de tipo patrimonialista. As imagens modernistas estariam ligadas à competitividade, tecnicidade, na cultura empresarial e na internacionalização da cidade, instigando uma gestão de recursos de natureza empresarial. Ele identifica uma lógica cultural baseada numa “cultura extensiva”, onde a imagem da cidade se projetaria para além dos seus limites próximos (locais ou regionais) e ganha sentido no plano nacional e mesmo transnacional.
Por outro lado, as imagens patrimonialistas estão ligadas às expressões da vida local e regional, aos costumes, às festas rituais e sequências cerimoniais, também à arquitetura ou à qualidade ambiental, promovendo uma gestão de recursos e dispositivos simbólicos. Nesse caso, a lógica cultural subjacente é de natureza “intensiva”, com acentuado investimento nas culturas e nas identidades locais e regionais.
Para o autor, essas imagens (modernistas e patrimonialistas) não são estanques. “Articulam-se entre si e justapõem-se, o que proporciona hibridismo do capital-imagem da cidade (SCIORRA, 1996), que surge, ao mesmo tempo, como consciência adquirida do passado, investimento no presente e perspectiva de futuro (MONS, 1992) (FORTUNA, p. 235)”. Diante dessas perspectivas, observa-se que Itacoatiara pode ser tomada como cidade que está se colocando diante de uma posição do tipo patrimonialista.
Observando o período em que o FECANI era realizado no contexto da praça, no centro da cidade, uma série de elementos compunha o cenário da festa, como o patrimônio histórico edificado, os arvoredos em torno da praça e a orla fluvial. Esses elementos causam uma sensação nostálgica, principalmente para quem participou dessa época, pois em tempos de FECANI, a Praça da Matriz transformava-se num verdadeiro camping com armações de barracas de acampar. Nas árvores, era possível notar inúmeras redes atadas; as ruas, no entorno dos palcos principais, lotadas de barracas de vendas de todos os gêneros alimentícios; as pessoas banhavam-se na orla fluvial da cidade. Considera-se que, nesse momento, a cidade servia de palco para aqueles que produziam e participavam do FECANI.
Com a dimensão adquirida na mídia regional e nacional pelos meios de comunicação, o FECANI passa a receber concorrentes de outros estados brasileiros e a fazer parte de uma cultura extensiva, tendo que se modernizar, pois é sentido na cidade o desenvolvimento e a instrumentalização de equipamentos urbanos voltados para o lazer. Já no ano de 1993, o então governador do Estado do Amazonas, Gilberto Mestrinho, anunciou para os meios de comunicação que, para o IX FECANI, a rodovia AM-010 (Manaus-Itacoatiara) estava completamente restaurada e o Departamento de Estradas e Rodagem (DER-AM) estava atendendo a renovação das frotas de ônibus, com investimentos da ordem de 216 mil dólares por parte da empresa ARUANÃ, com ônibus de “última geração, acabamento de luxo, carpete, poltronas reclináveis, sistema de circulação de ar, sistema de iluminação direcionada e guarda volumes” (Jornal Amazonas em Tempo, 05 de setembro de 1993).
Vale ressaltar que, atualmente, é preciso uma atenção redobrada para a pavimentação da Rodovia Am-010, dado o grande fluxo de veículos, assim como a aquisição de novos ônibus por parte das empresas de transporte para o conforto dos passageiros. A construção do Centro de Convenções para realização do FECANI (inaugurado em 2003) partiu da necessidade de uma estrutura urbana para o recebimento de turistas e visitantes, além do desenvolvimento de novos bairros nas proximidades do Centro de Convenções, com processo de ocupação de terras.
Para Fortuna (2001), o patrimônio histórico, o passado e a memória da cidade constituem-se de ingredientes sensíveis dessa articulação de imagens (cultura extensiva e intensiva) como estratégia promocional da cidade. Pois, segundo ele,
“(…) é assim que os patrimônios históricos e as memórias locais têm sido objecto da “reinvenção” do seu significado social e das funções (HOBSBAWM e RANGER, 1983), num sentido em que a sua marca de tradição se converte em capital de inovação. É neste processo de reconstituição de significados e funções que se constitui o que designo por destradicionalização do patrimônio e, por arrastamento, destradicionalização da imagem da cidade. Esta implica o aquecimento activo, ou desinvestimento simbólico (MCCRACKEN, 1990, 870), de alguns dos atributos e usos tradicionais do patrimônio local e, em paralelo, a posição de outros novos, ou a sacralização (MACCANNELL, 1989, 4345). Só assim a destradicionalização do patrimônio funciona como caução de modernização (FORTUNA, 2001, p. 235).
Mas até que medida o FECANI continua sendo um grande articulador da tradição e da inovação como aspecto de destradi-cionalização da cidade de Itacoatiara? Como os artistas itacoatiarenses sentem as mudanças ocorridas nas atividades da AIRMA com a concentração dos concursos culturais na época de realização do FECANI?
O FECANI inaugura um processo de destradicionalização da cidade de Itacoatiara na articulação dos aspectos de tradição e inovação, considerando todo um aparato de uma cidade do tipo intermediária na Região Amazônica. Observa-se que, durante o processo de destradicionalização pela qual a cidade está passando, o de revalorizar os seus recursos reais e potenciais frente ao mercado inter-cidades, o FECANI vem passando por uma crescente espeta-cularização, transformando as manifestações populares que foram sendo agregadas no decorrer do tempo em uma festa-mercadoria para o consumo cultural de massa.
Serpa (2007, p. 115) considera que “os espaços da cultura de massa são ‘campos transversais’, ao mesmo tempo geradores e destruidores de identidades”. Isso porque as atividades turísticas fazem com que a população passe a reinventar o seu cotidiano e, nessa reinvenção, a lógica da atividade turística acaba por sobrepor às tradições locais e a própria identidade dos lugares, atingidos por novos valores, símbolos, referência e expectativa. São valores transversais, mas, ao mesmo tempo, hegemônicos, já que é imposto por uma pequena parcela da sociedade com sua concepção restrita e exterior de cultura. Na cidade de Itacoatiara, ainda não se tem muito claro os espaços turísticos e, por isso, não dá para definir um processo seletivo de apropriação social e espacial por grupos.
No sentido de fazer com que as pessoas se identifiquem com o festival e não participem somente pela premiação monetária, que é oferecida ou pelo show do cantor do momento, é preciso atentar para a sugestão que Lefebvre apud Serpa (2007) propõe uma transversalidade lúdica que respeite as diferenças, mas que não as reitere, reinstalando a segmentação. Pois assim, a festa estaria cumprindo o seu papel, o de valorização dos aspectos locais e regionais da cultura.
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51 Comunicação proferida na palestra do dia 12 de maio de 2021, via Google Meet. Tema
“Diálogos sobre Itacoatiara-AM: Cidade emancipada em 25 de abril de 1874, evolução histórica, aspectos geográficos, estatísticos, culturais e vislumbre para o futuro”. Evento alusivo às comemorações da Emancipação de Itacoatiara-AM à Categoria de Cidade. Realizada pela Biblioteca Professor Anísio Thaumaturgo Soriano Mello/Progr. De Educ. e Desenvolvimento de Competências Informacionais e Tecnológicas dos Usuários/ Instituto de Ciências Exatas e tecnológicas – ICET/UFAM.
*O autor é natural de Itacoatiara, vem trabalhando com a temática sobre patrimônio cultural a mais de duas décadas. É formado em Ciências Sociais (UFAM) e Mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (PGSCA/UFAM) especialista em Festas Populares e Religiosas da Amazônia. Formado em Direito (ULBRA/Manaus), MBA em Gestão, Licenciamento e Auditoria Ambiental (Anhanguera-Uniderp). É professor Universitário. Publicações em coautoria nos livros “Cultura popular, patrimônio imaterial e cidades” (2007) e “Culturas populares em meio urbano” (2012). Autor do livro “A Senhora, o Folclore e o Festival” (2022). É Assessor Jurídico e vem prestando assessoria ao patrimônio imaterial etnohistória da Amazônia para empresas de licenciamento ambiental e arqueológico.
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