Manaus, 16 de setembro de 2024

A ZFM, o meio ambiente e os créditos de carbono – parte I

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“Além de ser favorável à manutenção da floresta em pé, por seus reconhecidos e essenciais serviços ambientais, o que mais poderemos fazer para a proteger a floresta e trabalhar para que a monetização desses serviços, chamados de créditos de carbono, seja aplicada na região, favorecendo, principalmente, seus guardiões, os maiores responsáveis pela saúde ambiental – ora ameaçada – desta região.”

Para além do debate especulativo sobre como ficará o imbróglio jurídico criado em torno da constitucionalidade da economia do Amazonas, é muito oportuno pautar e acompanhar no debate eleitoral que papel será reservado à Zona Franca de Manaus e sua inserção ambiental nas discussões sobre a Amazônia que vem (?) por aí. Independentemente da transformação deste tema em favor e contra desta ou daquela política ambiental para a região, a relação entre ZFM e proteção florestal é uma questão antiga que ainda não conseguimos equacionar exaustivamente. E o que é pior: estamos perdendo a chance de sistematizar sólidos argumentos a favor da economia sustentável do Polo Industrial de Manaus. 

Esta não é exatamente uma fatura que deva ser cobrada diretamente ao setor produtivo da Amazônia Ocidental, divisão geográfica estratégica sob responsabilidade da Suframa, superintendência da Zona Franca de Manaus. Ou não era, há bem pouco tempo. Agora é, dado que a sigla ESG deixou de ser um modismo para tornar-se um paradigma irreversível de gestão corporativa que vai pesar tanto no aliança do Mercosul com a União Europeia como a desejável entrada do Brasil no Clube do OCDE.

A proteção da Amazônia, sua floresta e seu contingente social, há várias décadas, tem sido invocada como um dos melhores argumentos de defesa da ZFM, desde quando a ONU resolveu realizar no Brasil a Conferência da Terra, sobre meio ambiente e desenvolvimento, em 1992, onde a Amazônia e suas supostas queimadas foram responsabilizadas de forma oportunista pelo aquecimento global. Vale anotar que mudança climática já era um tema objetivamente grave faz 30 anos. Desde então, de forma defensiva, recheada de bom-mocismo, passamos a espalhar mundo afora que o Polo Industrial de Manaus, direta ou indiretamente, contribui para proteger/preservar 98% da cobertura vegetal do Amazonas, ao gerar seus 500 mil empregos e evitar que essas famílias fizessem da floresta seu sustento. Era ou é isso mesmo?

Isso, porém, não foi inserido na Constituição do Brasil em 1988, apenas o direito legal de empreender numa região remota através de compensação fiscal, hoje estimada em 7,9% do bolo total de incentivos do país. E é em cima dessa vantagem discreta que a confusão foi formada desde sempre.

Entretanto, nas justificativas do Decreto 288/1967, essa responsabilidade da proteção está postada como um dos principais argumentos da política desenvolvimentista do Estado Brasileiro – que implantou este programa de expansão socioeconômica que os especialistas chamam de enclave voltado ao desenvolvimento. “Integrar a Amazônia ao desenvolvimento nacional e protegê-la da invasão internacional.”, era o que dizia a doutrina de Segurança Nacional do Regime Militar do qual se originou este programa de redução das desigualdades regionais baseada em política fiscal, reconhecido entre todos como o mais robusto.

Os tempos mudaram. E esta responsabilidade quase subliminar se transformou em argumento de extrema relevância e emergência. Afinal, entre tantos focos de economia da ilegalidade, já citados insistentemente neste espaço, a ZFM é uma economia pulsante, transparente e diretamente responsável por uma lista enorme de benefícios e papéis que são insubstituíveis no curto e médio prazo. “E com certeza no longo prazo”, como assegura o economista Jaime Benchimol, integrante de uma saga de pioneiros empreendedores que há séculos gera economia em linha direta com o meio ambiente com muita competência. E não precisa ser profeta para se dar conta de que chegou a hora de radicalizar essa conexão da qual o futuro da espécie humana começa a depender com a mais grave das emergências.

Radicalizar, é bom esclarecer, significa ir até as raizes do problema. Não se trata, pois, de extremismo ideológico. E radicalizar foi o que fez o respeitável jornal inglês Financial Times, nesta semana, ao analisar a equação desenvolvimento versus meio ambiente ao tratar o dilema da mudança climática do Cerrado brasileiro com o agronegócio, apontando a gravidade ambiental da economia e suas implicações ESG, digamos assim, na interlocução entre o consumidor e a gestão dos negócios num contexto de sustentabilidade. Ou seja, para além da questão Amazônica, é preciso cuidar dessa harmonia fundamental entre desenvolvimento e meio ambiente.

O governo brasileiro planeja construir 43 hidrelétricas na bacia do Tapajós. Vista aérea da floresta Amazônica | Foto: Rogério Assis – Greenpeace

“O boom da Agricultura e o despojamento do Cerrado brasileiro”, uma matéria do jornalista Michael Porter, no caderno do FT sobre desmatamento no Brasil. “Quase um quinto da vegetação nativa do Cerrado foi removida entre 1985 e 2020”. Este bioma, dizem os especialistas, é uma floresta de cabeça pra baixo, tal o alcance das raízes da vegetação predominante. “A região abriga cerca de 5% de toda a biodiversidade da Terra. Mas, segundo alguns cientistas, já há sinais de tensão no Cerrado. Um artigo no ano passado descobriu que a região estava ficando cada vez mais quente e seca. “Se [o corte de árvores] no Cerrado continuar nesse ritmo, perderá seu papel histórico de absorção e armazenamento de carbono”, diz. Jean Ometto, do INPE.

Não estamos falando de vegetação do Amazonas, que já não tem mais 98% de sua cobertura vegetal intacta. Somos o estado que mais desmatou, juntamente com o Pará. Cabe uma pergunta: quem é a favor da ZFM pode ser a favor do desmatamento do Estado do Amazonas? Além de ser favorável à manutenção da floresta em pé, por seus reconhecidos e essenciais serviços ambientais, o que mais poderemos fazer para a proteger a floresta e trabalhar para que a monetização desses serviços, chamados de créditos de carbono, seja aplicada na região, favorecendo, principalmente, seus guardiões, os maiores responsáveis pela saúde ambiental – ora ameaçada – desta região.

II

ABRACICLO põe em pauta cadeia regional de suprimentos e oportunidades

“Sem estimular o avanço tecnológico – que começa com o incentivo da Indústria de componentes e sua inserção numa nova cadeia ocidental, continental ou preferencialmente nacional/regional – iremos a lugar algum. Não significa desestimular a economia do Centro-Oeste, pelo contrário, devemos criar alternativas coerentes com a indústria da Amazônia, instalada, capacitado e disposta a inovar e reinventar seu perfil”.

“Faz escuro mas eu canto”, dizia Thiago de Mello, para reativar sempre a mensagem poética da resistência e da persistência a partir da Amazônia. Neste caso, a mensagem encarna e se ilustra com a iniciativa da Abraciclo – Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares – que promoveu neste 23 de agosto o 1º. Encontro Empresarial Abraciclo da Indústria de Bicicletas. Ao juntar pessoas e compartilhar expectativas e informações, a entidade convidou os habituais e novos fornecedores de peças e componentes e as fabricantes de bicicletas instaladas no Polo Industrial de Manaus – PIM.

Com qual propósito? Reunir os atores dos diversos elos da cadeia de produção de bicicletas e promover oportunidades de negócios para reforçar o abastecimento de bicicletas ao mercado. Numa palavra: pautar a cadeia regional de suprimentos e oportunidades.

Adensamento do Polo Industrial de Manaus

Segundo Paulo Takeuchi, idealizador do evento, “… a pandemia da Covid-19, seguida pelo conflito na Ucrânia, fizeram com que o mundo globalizado precisasse rever suas estratégias de abastecimento e logística nos mais variados segmentos. Por isso nós, como associação que representa o setor de bicicletas, estamos promovendo esse encontro que não só aproxima as empresas, mas também incentiva a nacionalização de produtos, estimulando a produção local e a consequente criação de empregos”.

Logística de transportes

O alerta da Abraciclo, além de oportuno, é emergencial. O Brasil já ensaiou seu salto tecnológico na direção de novas cadeias globais de valor, mas recuou por força de generosas reservas conquistadas pelos produtos agrícolas e minerais. Commodities evoluem mas dependem de alguns fatores que podem depreciar seu valor como nossa falta de investimentos em logística de transportes. Já chegamos a sonhar com o centro mundial de inovação tecnológica e distribuição de novos produtos no Brasil, como era o projeto de uma megaempresa chamada Volkswagen. Por que parou?

Teimosia empreendedora

Sem estimular o avanço tecnológico – que começa com o incentivo da Indústria de componentes e sua inserção numa nova cadeia ocidental, continental ou preferencialmente nacional/regional – iremos a lugar algum. Não significa desestimular a economia do Centro-Oeste, pelo contrário, devemos criar alternativas complementares coerentes com a indústria da Amazônia, instalada, capacitado e disposta a inovar e reinventar seu perfil. O Smartphone inibiu diversos segmentos industriais, o que sugere correr conta o temp. E já teríamos esvaziado o Polo Industrial de Manaus não fosse a teimosia empreendedora das empresas e das entidades que as representam, trazendo até aqui este bastão fabril de tantos benefícios.

Segurança jurídica

O poder público representa um ator fundamental nesta jornada na medida em que se alinha com as tendências globais e potencialidades locais para avançar na diversificação, adensamento e regionalização produtiva e criativa. Uma jornada, as vezes turbulenta, sempre no modo ZFM de empreender, economicamente viável, politicamente correto, socialmente justo e ambientalmente sustentável, como descreve Samuel Benchimol, nosso maior amazonólogo. Sem esquecer do legalmente protegidos, para sublinhar a importância da segurança jurídica.

Academia criativa e construtiva

O evento mobilizou mais de 100 profissionais de dezenas de empresas, representantes do governo federal e de entidades da Zona Franca de Manaus, como da SUFRAMA – Superintendência da Zona Franca de Manaus, da SEDECTI – Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo do Estado do Amazonas e da FIEAM/CIEAM – Federação e Centro das Indústrias do Estado do Amazonas. Temos, ainda, a Universidade do Estado do Amazonas, financiada integralmente pela indústria, que deverá integrar-se a este mutirão criativo e construtivo para dinamizar o setor de Duas Rodas.

Homem de bicicleta

Descrição gerada automaticamente

A hora é agora

De acordo com a Abraciclo, os fabricantes de bicicletas instalados no PIM atualmente trabalham com fornecedores estrangeiros para diversos componentes como, por exemplo, quadros, sistemas de câmbio, freios, suspensão, direção, selim e pneumáticos. Alguns desses componentes chegam a ter 100% de seu volume importado.

“O desafio é fomentar a industrialização deste segmento no Brasil, estimulando e promovendo a nacionalização de peças e componentes para aumentar a competitividade dos nossos produtos, não só no mercado local como também para atingirmos maior capacidade de exportação”, diz Paulo Takeuchi.

Sobre a ABRACICLO e o Setor de Duas Rodas

Com mais de 45 anos de história e contando com 14 associadas, a Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares – ABRACICLO representa os fabricantes de veículos de duas rodas no país, tendo como principal missão o desenvolvimento e fomento do setor por meio de ações baseadas em três pilares: Política Industrial, Segurança Viária e Técnico.

A fabricação nacional de motocicletas, quase totalmente concentrada no Polo Industrial de Manaus (PIM), está entre as sete maiores do mundo. No segmento de bicicletas, com as principais fábricas também instaladas no PIM, o Brasil se encontra na quarta posição entre os principais produtores mundiais. No total, as fabricantes do Setor de Duas Rodas geram cerca de 14 mil empregos diretos em Manaus/AM.

Esta coluna Follow-up é publicada às quartas, quintas e sextas feiras, sob a responsabilidade do Centro da indústria do estado do Amazonas, com a coordenação editorial de Alfredo Lopes, editor do portal BrasilAmazoniaAgora 

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