Manaus, 6 de dezembro de 2023

Aprendendo e ensinando

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“O mais do mais de seus ensinamentos está quando procuramos edificar a formação dos nossos filhos e netos sob seus exemplos e conforme a sua direção”

Conforme flui o tempo vamos aprendendo a viver, e, vivendo, pensamos que conseguimos ensinar os que nos sucedem. Tem sido assim, sempre do sempre, como foi com meu pai muito amado que em meio às muitas lutas pela sobrevivência e realização dos ideais que carregava na alma, nos ensinou, a todos, pelo exemplo e com o silêncio do seu olhar profundo, a força de sua presença afetuosa, a palavra generosa de seu coração enternecido de amor.

Marinheiro, carregava consigo a ventura de haver superado grandes batalhas nesta terra manauense, desde quase menino de nove anos quando chegou de Salvador da Bahia. Homem experimentado nas tormentas dos grandes rios, sobrevivente de um incêndio catastrófico no es treito de Breves a caminho de Belém quando ia realizar seu sonho na marinha mercante, vencedor de lides sindicais na fase tempestuosa da segunda guerra mundial e da revolução de 30, politico inconformado com o desprezo dos governos pelos direitos dos trabalhadores, fazia do seu dia a dia uma preleção informal, muita vez sem dizer qualquer palavra.

Impressionante constatar que sempre soube se atualizar – conforme a razão dos novos tempos-na relação com os filhos e com os netos que conheceu e acompanhou com alegria. Fibra, energia, seriedade, respeito, trabalho, honra, dignidade, ética, educação e formação humanista, antes de tudo e em qualquer ocasião. É o que, distante nos anos – já são 35 que não o temos em corpo físico para um abraço fraterno – é o que ele nos ensina, vivamente presente no cotidiano de todos que o amamos.

O mais do mais de seus ensinamentos está quando procuramos edificar a formação dos nossos filhos e netos sob seus exemplos e conforme a sua direção, firmando-nos, antes de tudo, em corpo e alma em todos os momentos de suas vidas, e, também, aprendendo com eles conforme as lições de agora, para ensiná-los melhor e com mais precisão, aproveitando tudo aquilo que a experiência nos permitir.

Certo dia, daqueles em que somos levados a refletir com mais profundidade sobre os acontecimentos naturais dessa passagem terrena, mas que muitas vezes nos dilaceram, deparei-me revendo na memória e sentindo no âmago como ele se posicionaria diante das preocupações que me consumiam; o que diria, como iria reagir e superar as inquietações dominantes na ocasião. E eis que o caminho do recolhimento e da prece se abriu e pude experimentar sensações de alivio como se tivesse reencontrado seu olhar diante dos meus olhos marejados de angústia, ou ouvido sua voz proclamar para minha amada mãe e mestra de tantas gerações: “Sabá, chegou o rouxinol!”, como ele gostava de dizer diante da alegria da minha chegada para a renovação do aconchego familiar.

Não foram poucas as ocasiões em que me deparei com esse cenário e esse sentimento, e, todas as vezes que eles têm se repetido no curso dos anos, é na prece que me reencontro com a presença do meu marinheiro, e com ela consigo compreender melhor tudo o que nos transmitiu e o valor de sua eterna presença. É isso, tem sido isso o que todos que temos consciência do sentido da paternidade buscamos transmitir aos que nos sucedem nesse caminho experimental para o qual nos trouxeram a esperança e a fé, e a imperiosa necessidade de aperfeiçoamento dos nossos espíritos.

Hoje, emoldurado pelo passado que escorreu pelas minhas mãos entre alegrias, dúvidas, inseguranças, incertezas, luzes, realizações, amor e felicidades, entendo com mais clareza o que ele queria dizer quando falava em aprender com a vida que é a escola verdadeira, aquela em relação a qual não se aplica correção porque tudo passa célere como um relâmpago que rasga o céu, ainda que haja garças dançando com elegância em um belo lago azul em algum lugar distante, ou um remo perdido cortando as águas na imensidão do nada amazônico.

A certeza que tenho é que se deve seguir aprendendo e ensinando conforme os valores que ele nos legou, e confiar que assim irão fazer os que vierem depois de nós, na caminhada interminável para as bençãos supremas.

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