Manaus, 21 de novembro de 2024

As palmeiras da praça de Rosário e outros poemas da vida

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*Manoel Domingos

Continuação…

NUVENS PRIMADONAS

No céu azulado…
Do Guajará ao Açacu,
As nuvens desenham no céu
E eu falo: “carneirinho, carneirão”,
Elas, alvas se vão…
Metamorfoses e emblemas
Nos afrescos celestes
de brancoazulados esquemas.
Nuvens que dividem o rio,
Que esfriam o brilho dos zincos,
Vão cartografando no largo, seios e sombras.
…surreais marombas.

Limbos que ensaiam chuvas
Ofuscando os ares e os “rebujos”,
Dos fluviais antares… Os botos marujos.
Nuvens, “carneirinho, carneirão”,
Desenhando tons e a geometria das alturas,
Moldam, nas maresias, semblantes crus
Em abstratas molduras.

Do Ciripá ao Carão
Nuvens esparsas… Passageiras,
Nuvens e águas em diletos repentes,
Trocam metamorfoses nas idas e vindas
Com as correntes do vento,

Do Ciripá ao Carão… No seio do Rio Amazonas
Brindam-nos momentos como eternas Primadonas.
Set/1995

NO ENCONTRO DAS ÁGUAS

Eu e ela no encontro das águes
Beijando os instantes com flertes molhados
Vastos… Eu e ela na “pasargada dos nos

Meu olhar matinal trie o sereno,
Que umedeceu as efemérides tristes.
“Que viste? Senão o orgulho de um cio!”
“O cio das correntes barrentas… e bentas”

Uma, como valsa serena, água amarela,
Pede os passos de banzeiros e aquareles,
A outra, como espelho, corre amena.
É a que tece amor e encanto, áqua morena.

Nas maresias, duas cores se regram únicas,
Velam um primeiro brilho multicor,
E assim, de manhã, nos seus encontros,
Elas gozam do homem e fazem amor.

Então, a dança envolve essas barrancas
Carregando o céu no vasto brilho,
Para fazer do seu leito… Dispares trilhos.

“E eu, desnudo de mim, danço com elas,
Águas amarelas e morenas “
“Então, vamos participar das cenas?!”
Nov /1993

TEMPLO DAS SINAS

És a mesma curva dos rios….
Tua linguagem é a ponta da terra,
Água que desce solitária e amarelada
No sobe e desce dos banzeiros
Junto com as flores da munguba,
Acena às ramadas de ingás
Taxis, Mulateiros e imbaúbas.

Pois te algema desde as manhãs,
Faz-te assim um espelho aquático
Que cumprimenta risos, choros e ais
De caboclos, curumins e cunhatãs,
Que esfria os saltitantes catipurus
Rentes à quietude da água….
Assim conduzes bailarinos murerus.

Já é ocaso?… Esticam-se camaroeiras!
Os cantos perdidos nas matas silentes
Convidam estrelas, às vezes cadentes.
A ribanceira ensaia choros e paraplegias…
É cheia! Caem terras em tristes orgias,
E vão se afogando com as canaranas.
Eis Aparecida, na Costa do Arapapá,
Reviram-se as árvores já sonolentas,
Lavam-se… Com as águas barrentas.

Sinas e cenas de linguagens molhadas,
Mistificação de um mundo antagônico
Tempo das águas, templo amazônico.
Set./1997

POEMAS EM SÉRIE

I

Anti-manhã desmedida.
Luar de noite espinhosa.
Nem rosa,
Nem orvalho.
Meu jeito diuturno
Está em cartas de baralho
E em “xeques” soturnos.

II

No pós-crepúsculo, já noitinha,
Aumenta a púrpura do ocaso…
Minha pupila… Meu vôo raso,
Segue as garças em romaria,
Que atrás de uma tépida essência,
Anunciaram o fim do dia.

III

Sem vento, sigo-te em estrelas.
Com meus piscandolhares.
E nesta noite esporádica,
Não me vejo pra cá nem pra lá.
És o véu de meu pensamento,
Uma série de versos do Porunguitá.

REPENTINAS FACES

Na calma da mata…num piscar de silêncio
Que a Alma da floresta sorri para o rio…
Incensos rastreiam-se entre a sombra e a lua.
Nudez do céu que o rio desperta nas mariposas
– luminomaníacas e cruas-
Esculpem-se tímidos banzeiros, velados e calvos,
Moldando paralelos no estirão da água.

Do poste ao muro, há segredos,
Sorrisos atentos nestes flancos…
No escuro da rua picham-se “gráficos”,
Preciso me prender dos medos.
Marcam-se casas para assaltos cinematográficos.

Entre os rios e cidades…
Desenhos da maldade…

CENAS AMAZÔNICAS

A família                                        Na seca
o ribeirinho O tempo                                            
a canoa A distância
a mata o ribeirinho
a alegria a solidão
o tempo a tristeza.
A cheia O riacho
o desamparo O silêncio
os meses O peixe morto,
o calor A notícia
a vazante… O repórter,
a seca. O absorto
   
Na cheia Os estranhos
o comprador o caboclo
o acordo o acordo
a floresta a balsa
a madeira o mergulho
a jangada o mercúrio
o caboclo o ouro
os trocados A vida e a fome
a estiva No beiradão…
o tempo Ecce, homem!
a escassez.  

Continua na próxima edição…

*Natural de Itacoatiara/Am. Poeta, professor e escritor. Membro da Associação dos Escritores do Amazonas, da Academia de Letras e Cultura da Amazônia, da Associação Brasileira de Escritores e Poetas Pan-amazônicos e do Movimento Internacional da Lusofonia. Professor efetivo da UEA. Mestre e doutorando em Letras pela UTAD (Portugal). Fundador da Sociedade dos Poetas Porunguitás.

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