Manaus, 27 de julho de 2024

Conversando com Rangel

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Tomei na estante, a esmo, sem muito querer, uma das obras de Alberto Rangel, o grande vate pernambucano que perambulou por Manaus e pelo interior amazonense durante anos, e, do mesmo modo e as custas do governo amazonense ao tempo de Silvério Nery, principalmente, frequentou as rodas mais eruditas de Paris, a cidade luz.

Como é sabido, era dele e de um amigo dileto, a casa de residência em taipa em que esteve hospedado o brilhante Euclides da Cunha quando de sua passagem por nossa cidade em 1904-1905, precisamente em linha cruzada com o Reservatório do Mocó que é de 1896.

Para meu deleite possuo todos os títulos que Rangel andou publicando mundo afora, como este de 1943 que carreguei comigo para um pequeno repouso em terras de sol, praia e mar no janeiro passado, e o tenho agora em reposição em seu devido lugar. Reli alguns capítulos dos quais já havia dado leitura anos passados, e, como sempre faço, segui folheando para descobrir o que mais me interessasse na temporada de repouso, ou seja, nada duro de se ler, maçante ou pesado.

Como o autor normalmente tem escrita leve e atraente, acabei devorando página por página o seu “Trasanteontem” e redescobrindo em seus “episódios e relatos históricos” as rixas e atropelamentos em que dom João VI esteve metido quando de sua permanência no Rio de Janeiro, após 1808. Aliás, bem interessante é a crônica que faz sobre o exercício brabo de autoritarismo da Corte quando de sua chegada às terras cariocas o que redundou em despejo de muitas famílias de suas próprias casas para que estas passassem a servir aos acompanhantes reais. Estas coisas, mesmo sendo as que se contam em vários livros de História do Brasil Colonial, ditas e reditas por Rangel, parece que ganharam mais graça e rubor e não perderam a audácia e a prepotência dos seus autores.

Ao revelar que o chamado “mal sagrado” – a epilepsia -, acometia a vários membros da Família Real Portuguesa transferida a força para o Rio de Janeiro, Alberto Rangel invadiu a privacidade mais íntima dos reis e imperadores de antanho, mas, mesmo assim, não revelou novidade e conseguiu ser leve e inteligente, indicando as indicações de tratamento preferidas pelos médicos da Corte e as fórmulas “benditas fórmulas dos índios”.

Do mesmo modo tratou o sempre poderoso José Bonifácio de Andrada e Silva descrevendo passagens de sua vida. Nesse ponto esse Rangel foi demais. Feriu fundo a respeitável tradição do “Patriarca da Independência”, porém, do que sabe por outros autores, apenas aumentou o sal e a pimenta e não revelou inverdades, ainda que possa ter colocado lenha na fogueira.

O mais longo dos artigos, “Em redor de Santa-Helena”, quero confessar que pulei todas as páginas em que o autor tratava de Bonaparte, o Imperador que expulsou dom João de Lisboa com toda a família e o “beija-mão”, como se diria nos dias de hoje. Fui adiante, e com avidez, para ler, miudamente, o seu “Calmon & Procópio” e a questão das presas de guerra realizadas pela esquadra brasileira nas águas do Prata de 1825 a 1828. Beleza de texto, em que analisa várias situações decorrentes daquela fase beligerante do Brasil, e o faz com clareza, base teórica e habilidade política e diplomática, pode-se dizer.

O que ficou desse meu reencontro com Rangel, digo sem pestanejar, foi a crescente admiração pela forma com a qual tratava os temas mais variados em um mesmo livro, e, ao final, a sensação é que tudo havia sido adredemente planejado, mesmo sabendo que ele se impunha pelo improviso na criação na literária.

***

Saudade…

Maria Justina Braga Monteiro

Hoje amanheci chorosa. Coloquei para ouvir o disco do Fábio Júnior. Aí vieram as lágrimas com mais intensidade.

Lágrimas de saudade da vida: da infância; da juventude; da idade adulta e mais precisamente do tempo em que dirigi a ESPEA – Escola de Serviço Público do Amazonas, casa exemplar de ensino. Isto porque a música “Senta aqui” de Fábio Júnior me lembrou a época em que com os meus funcionários amigos – funcionários exemplares e amigos diletos – realizávamos oficinas, processos seletivos, concursos públicos, inscrições para o vestibular da Universidade do Estado do Amazonas, cursos e seminários em meio a uma agitação sem igual.

Eu como sempre gostava de tudo arrumado e organizado e sabe o que acontecia? A Emília Augusta, a Socorro de Nazaré, o Ferreira, a Naninha e a Sebastiana me vendo sempre na correria, davam-se as mãos e segurando as minhas, cantavam “Senta aqui. Não tenha tanta pressa. Senta aqui. Por que toda essa angústia, se tudo vai dar certo. Senta aqui…”.

E era esta a música que eu estava ouvindo. Como não chorar?

Isto não mais acontecerá. O tempo, como disseram os poetas da música brasileira, o tempo não para e ele nunca envelhece. Só que eu envelheci e o sentimento que trago no peito é o de saudade. Saudade da vida. Saudade de mim. E como ensinaram os artistas, “velhice chegando e eu chegando ao fim…”.

Bendita vida! Bendita saudade!

*Professor, historiador e Advogado. Especializado em Direito Agrário, pós-graduado em Administração de Política Cultural e Mestre em Direito Ambiental. Professor da Escola Superior da Magistratura do Amazonas e da Universidade do Estado do Amazonas. Ex-presidente da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas. Ex-Secretário de Estado de Cultura, desde 1997 até 2017 e atual Presidente da Academia Amazonense de Letras.

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