O problema atual não poderá ser resolvido com solução semelhante crematório de lixo à moda do modelo adotado em 1909, nem é de simples solução.
Acompanhando o noticiário de imprensa atual e cotidiano tenho tomado conhecimentoda informação de que, todos os dias, são retiradas muitas toneladas de lixo dos igarapés de Manaus, sem cessar. Não é novo esse problema. Muitos governantes anunciaram soluções para o caso, algumas delas mirabolantes e outras bastante factíveis, mas raras foram efetivadas, ainda que parcialmente.
O crescimento absurdo da população, a consequente expansão urbana de forma horizontal, ampliando as distâncias do centro tradicional, e a ocupação indevida das margens e leitos de igarapés, respondem, naturalmente, pelo aumento do volume de lixo a ser coletado e daquele que, de forma indevida, é depositado em qualquer lugar, criando as chamadas “lixeiras viciadas” a implicarem na piora da qualidade das condições de saúde pública e na crescente dificuldade da ação do Poder Público.
Sobre esse tema há expressivo conjunto de informações no relatório do Plano de Desenvolvimento Local Integrado – PDLI, dos anos 1970, assim como nas atas e filmagens das reuniões de trabalho dos vereadores da capital quando da elaboração da Lei Orgânica de Manaus da qual tive o privilégio de ser o relator, em 1990. Os relatos de coletadores de dejetos, de empresários do setor, de moradores de áreas de sub-habitação, arquitetos, sanitaristas e urbanistas, naturalmente existentes nos arquivos da Câmara Municipal, dão conta de um grave problema, com ampla repercussão em desfavor da sociedade.
Recuperando a memória histórica da cidade, entretanto, é justo esclarecer que, em 1909, por exemplo, ao tempo do governo municipal do professor Agnello Bittencourt, o empresário português, Joaquim Gonçalves de Araújo (J.G. Araújo), deu solução para a questão que era mais grave. E o fez financiando a aquisição de um crematório de lixo, automático, importado da Inglaterra, alimentado pela combustão do próprio lixo, o que se demonstra, para a época como para os dias atuais, em engrenagem bastante moderna.
O preço do crematório foi o cobrado pela fábrica, pago pela municipalidade sem lucro para o empresário, na ordem de quarenta mil reis, incluindo a assistência técnica necessária para a montagem e manutenção inicial, o que possibilitou a solução do problema conhecido pela imprensa local como a “crise do lixo”, a qual era a responsável pela existência de enorme nuvem de moscas e odor impossível de suportar em quase toda a capital amazonense, do centro comercial aos ditos arrabaldes.
Naquela época, essa inovação era privilégio de Manaus, pois nem o Rio de Janeiro, a então capital da República, possuía serviço semelhante para atender às necessidades de sua população. Aliás, diga-se de passagem, embora houvesse sinais de baixa na nossa economia e exportação de borracha, ainda vivíamos sob as bençãos de libras esterlinas e da pujança dos seringais nativos do interior do Estado, o que permitia que se experimentasse as novidades do mundo europeu.
Evidentemente que o problema atual não poderá ser resolvido com solução semelhante – crematório de lixo à moda do modelo adotado em 1909 -, nem é de simples solução, mas exige intenso programa de educação social e urbana, orientação nas escolas e postos de saúde porque se trata de processo educacional e de saúde pública, intensa fiscalização por parte dos órgãos competentes e, com isso, estimular a formação de consciência cidadã.
Enquanto isso, é custear a coleta de lixo e a desobstrução dos leitos dos igarapés,quase que a peso de ouro, para evitar que surja, novamente e tantos anos depois, uma intensa nuvem de moscas a nos assombrar.