Manaus, 16 de abril de 2025

Crônicas do Cotidiano: “Diálogos sobre a pluralidade dos mundos”

Compartilhe nas redes:

No dia 7 de abril passado, comemoramos o dia do Jornalista. Tomar de empréstimo para título da minha crônica uma obra publicada em 1686 e relacionada entre as mais importantes dos séculos XVII e XVIII por abrir alas para o Iluminismo, de autoria de Bernard de Bovier de Fontenelle (1657-1757), foi a forma que encontrei para homenagear os colegas e render tributos ao autor da mesma, por ser considerado o mais importante jornalista divulgador científico do seu tempo. Quero ser justo, tanto com o autor da obra, a quem rendo minhas homenagens, quanto ao papel do jornalismo e dos jornalistas no nosso tempo. Fontenelle nasceu e viveu na França, num momento em que a ciência tomava corpo e se institucionalizava, a filosofia se descolava da teologia e a quantidade de pessoas incrédulas sobre as novidades do mundo se configurava como a primeira onda de “negacionismo” da era Moderna. O jornalismo, assim, deixava para trás a difusão do grotesco das informações sobre o Novo Mundo, assumia o seu lado normativo, combativo nas ideias e incorporava a função social relevante nas lutas travadas no chamado Século das Luzes (Séc. XVIII), difundindo a ciência, as novas visões de mundo trazidas pela filosofia e as mudanças do modo de produção que revolucionariam o mundo sob a égide do capitalismo nascente.

Tudo era novo: “é nessa distinção entre o certo, o provável e o verossímil que se devem ler os Diálogos sobre a pluralidade dos mundos”, diz o prefaciador da minha edição da Editora Unicamp, de 1993, p.28. Teorias sobre a astronomia e a Física Newtoniana já estavam estabelecidas, embora precisassem ser levadas ao povo, já que as obras científicas ainda eram escritas em Latim e toda a discussão proposta por Fontenelle é no sentido de não construir um pensamento dogmático para a ciência e para a filosofia, daí falar em modos de aceitação do que é dado como provável, verossimilhante e certo. O livro é pensado em cinco capítulos, aos quais o autor denomina de Serões. Cada um é uma conversa sobre um dos temas do momento, travada com uma Marquesa (personagem fictícia), na sua casa de campo. E justifica a escolha da parceira para o diálogo por entender que as mulheres interessavam-se, também, por esse pensamento novo e, portanto, isso encorajaria a outras a discutirem os problemas e os saberes de seu tempo.

Assim, o jornalismo e, por consequência, os jornalistas tomaram para si a tarefa de vasculhar os mundos, de perseguir os fatos, descobrir conexões com possíveis outros fatos, confrontá-los e extrair desse confronto, com o enriquecimento de outros dados, as evidências com as quais se apresentam ao público leitor, ouvinte ou expectador. Este é o cerne do que convencionamos chamar de Filosofia do Jornalismo. Infelizmente, ao cairmos no mercado de trabalho, pelas contingências do processo de subsunção da força de trabalho pelos proprietários das empresas organizadas para transformar o jornalismo, nas suas várias dimensões, em mercadoria, ocorre o relaxamento dos princípios orientadores da função social e profissional, tal como ocorre a tantas outras: pode transformar-se em lobby de poderosos a influir na opinião pública; colocar-se a serviço de grupos ideológicos sem deixar claro para seu público qual é a sua verdadeira orientação político-ideológica. Ficou provado, no caso brasileiro, que não é a formação universitária que modificaria esse processo. Ele é estrutural. As celebridades do jornalismo nacional formaram-se nas melhores escolas de jornalismo do país, são competentes, mas “pejotizaram-se” e esqueceram-se de seus compromissos sociais e dos vínculos corporativos. Os novos meios tecnológicos de comunicação vêm abrindo espaços para um jornalismo dependente de likes e menos dependente do marketing empresarial, mas tem as suas dificuldades. Ao mesmo tempo, as teorias conspiratórias obnubilam as mentes de ouvintes, telespectadores e leitores, desorganizando o mundo e tudo precisa ser didaticamente explicado a todos nós, pobres viventes. Além do mais, o jornalismo compete com outros atores que fazem a cabeça de seguidores, enquanto nos tornamos escravos dos algoritmos nas redes sociais. Assim, tudo é verossimilhante, provável ou possivelmente correto!

Views: 1

Compartilhe nas redes:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

COLUNISTAS

COLABORADORES

Abrahim Baze

Alírio Marques