Manaus, 22 de novembro de 2024

Dia das Mães

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Estas linhas primeiras são permeadas de saudade, escritas entre lágrimas que inundam a face e que brotam do peito, porque sei que nunca mais terei o privilégio santo de beijar os cabelos brancos que ornavam de ternura o que explodia de amor no olhar brando que a todos nos acolhia, tal como no sorriso que irradiava a felicidade do abraço meigo que se fazia todas as manhãs, antes da jornada diária do trabalho. É especialmente mais forte no dia que, talvez por interesse justificado de movimentar a serpente da Economia, acabou sendo reservado a todas as mulheres a quem, como a Maria no início, foi conferida a graça da maternidade. Já vai tempo que a cada segundo domingo de maio o encontro com Sebastiana dá-se com o admirar estrelas que cintilam no céu a espargir a luz do Amor e o beijo faz-se em pranto de reconhecimento e de agradecimento pelo quanto se entregou à divina tarefa de criar e conduzir filhos, os seus, os que herdou com o casamento feliz de mais de meio século e aqueles que, contados aos milhares, foram sendo incorporados ao longo de sua vasta e dedicada vida de magistério. E é como se nos falássemos com palavras plenas de afeto, de carinho indefinível e incomparável, fazendo-se no ósculo espiritual a renovação de todos os sentimentos que nos uniram na vida terrena.

É grande, muito grande, a falta que sua ausência física traz para nós todos os que tivemos a glória de chamá-la de Mãe e a benção de segurar em sua mão para caminhar desde os passos iniciais. Mas sei que há em nossos corações, porque por ela plantado e ensinado a todo instante, o amor que nenhuma distância da matéria é capaz de destruir, sequer de tisnar. E no domingo que se avizinha sentirei o afago de suas mãos, como se recolhido em seu colo, a me inspirar a seguir seguro e confiante. Beijar-lhe-ei o espírito, em prece contrita, para receber seu carinho.

Não estar fisicamente entre nós retira-nos a alegria do almoço que se repetia a cada ano, no domingo em festa, na simplicidade da troca de afeto, mas não afasta a certeza de que o quanto plantou em nós, em forma de amor, vicejou e, como se deu com ela, haveremos de deixar com os que aqui permanecerão por força da renovação permanente da vida.

Nesse dia, quando muitas mães estarão abraçando em festa os filhos que lhes justificam a existência, trago minha homenagem singela àquelas que, obrigadas a jogar no chão a vergonha do desamparo, participam nos tempos de agora de lamentável pintura social em que a busca da esmola, ao lado muitas vezes de filhos ainda de tenra idade, é forma única de conseguir alimento para o corpo, seu e de crianças que lhes compete zelar. Não raro feridas pela indiferença dos que se julgam maiores, ou até melhores – seja por gestos, palavras ou atitudes – sabem que esmolar é diferente de entregar-se ao crime ou à vida vazia do mundo escuro das drogas. Necessitar da generosidade alheia não as faz menores nem menos dignas dos beijos e do respeito que são símbolos do dia dedicado a todas que recebem a santa missão da maternidade.

Trago a este cantinho, também, com a humildade dos que creem, minhas preces à Divindade para que abençoe e console na dor indescritível, compreensível sob todos os aspectos, o mais íntimo das mães que no domingo próximo não terão filhos a abraçar porque a estupidez humana da guerra os tenha levado da vida terrena. Na Ucrânia, na Rússia, na Faixa de Gaza, em Israel, como em outros pontos deste planeta tão sensível à demonstração de força de muitos que se julgam poderosos, haverá lágrimas de saudade intensa e, provavelmente, revolta pelo corte brusco da convivência com filhos inocentemente vitimados.

Dar-se-á assim, igualmente, com as que tiveram seus filhos perdidos para as guerras urbanas dos dias de hoje, mortos pela sanha do tráfico de drogas, pelo descompasso do crime a que são conduzidos por imediatismo aparente de vantagens, pela ilusão do presente em lugar da construção do futuro, ou até pela brutalidade da força estatal que a todos deveria proteger.

Também nesse domingo haverá mães esquecidas em asilos ou em casas de repouso e que nem por isso deixarão de abençoar, mesmo à distância, com o coração ferido pela indiferença e pelo desamor, os que, levados ou não por necessidade a gesto trágico do abandono, não deixaram, nem por isso, de merecer-lhes o amor materno e, se necessário, o perdão. Dividirão, talvez, com as amigas de perto, e até de infortúnio, a tristeza do não-ter mas, com certeza, não lhes irá ao coração a ideia de não-ser, porque não há no mundo força capaz de apequenar o amor materno. Também para algumas delas haverá encontro de almas, à vista da ausência física, mesmo que nem se faça reciprocidade.

Minha homenagem, que igualmente se dá na dor, às mães que incrivelmente vêm perdendo seus filhos no interior de escolas onde, rigorosamente, deveriam estar sob segurança absoluta. Também nelas haverá saudade e, por certo, irresignação, mas creio que há de haver, por igual, a proteção divina a consolar-lhes o coração e a lhes permitir o encontro espiritual com o carinho dos que lhes foram arrancados à convivência de forma bruta, cruel e inesperada.

Por derradeiro, meu beijo de respeito profundo a Juliana, filha que com valentia me ensina a viver, e a todas as mulheres que, por circunstâncias várias, são conduzidas a exercer sozinhas, sem a presença paterna, a difícil, árdua e sacrificante tarefa da educação no lar onde renovam, a cada dia e no amor, as forças e a fé.

Que as bençãos de Maria se façam sobre todas as mães, em seu dia.

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