Corria o ano de 1897 e a República estava preocupada com a “rebeldia” de Antônio Conselheiro no sertão da Bahia, para onde carreou forças militares, inclusive do Amazonas, combatendo os fracos daquela guerrilha, que se faziam de fortes, foram heróis e a Pátria ainda não os reconheceu como tal.
Desta época o surgimento do Velo Clube de Manaus, associação destinada ao “intuito nobilíssimo de desenvolver o gosto pela bicicleta”, aplicando essa atitude da forma mais ampla possível e voltada para os jovens de várias idades, assim como para fins militares e de higiene e saúde pública. Tratava-se da velocepedia, como registravam os jornais editados na capital amazonense.
Na ocasião o uso da bicicleta recebeu uma explicação especial: “pela higiene, sendo hoje a predileção da alta sociedade americana”. Era entendido dessa forma porque servia de transporte a médicos, advogados e outros profissionais um pouco mais aquinhoados.
Se em Manaus foi grande novidade, na Europa era hábito pouco mais antigo e experimentado por grande número de pessoas, do que é exemplo o fato de que, em Paris, já existia o Touring Club de França com atividade de bicicleta, e cujos proprietários-usuários mereciam atenção particular do governo que, por esta razão, concedia-lhes isenção de impostos, alcançando cerca de 30 mil integrantes.
Em Manaus a bicicleta custava na ordem de 600 a 800 mil reis, e também era entendida como de boa serventia para a higiene pública, pois fazia com que os bicicletistas dispensassem os animais dos serviços de transporte, eliminando ou reduzindo os dejetos pelas ruas, bastante comuns e condenados pelo Poder Público e os sanitaristas.
O Clube era liderado por Lauro Baptista Bittencourt (1853-1916), e tinha sede na Rua de Enrique Martins onde os associados se reuniam para programar passeios e excursões. Foi ele que trouxe essa “mania” de Chicago, quando lá esteve em 1893 participando da Comissão Expositora do Brasil no certame que se realizou nos Estados Unidos.
Não se tem notícia de como e quando o clube encerrou suas atividades, mas o uso de bicicleta e até de velocípede por crianças menores foi transformado em objeto de lazer e entretenimento, ampliou-se para práticas desportivas e várias competições ganharam as ruas, fizeram a fama de muitos atletas e continua na crista da onda.
Era apaixonante e libertador pedalar, correr, fazer malabarismos pela cidade ainda tranquila. De minha parte as lembranças são muito boas. Presenteado – como desejava – por uma Monark, na cor vermelha e de pneu balão, generosamente comprada por minha irmã Maria Justina com o primeiro salário de seu cargo de professora normalista ao qual ascendeu por concurso público de provas e títulos, dando seguimento à tradição de nossa mãe e mestra, primeira e maior. Devo registrar que fiz muitas piruetas e sentia liberdade total de quase “voar” montado na minha bike.
Possuir uma bicicleta era quase um luxo para os meninos do meu grupo de escola e de relações de família. Ainda era um bem muito caro e de difícil acesso, mas a ela me afeiçoei, gostei muito de integrar o seleto grupo de biciletistas amadores, e posso confessar que foi brinquedo dos mais gostosos de minha infância e quase juventude, e o qual tinha orgulho de possuir.
Jamais esqueci a emoção de receber o “mimo”, mas nem avaliava o enorme sacrifício que estava sendo feito para me presentar.
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