Poema recolhido da obra “Pedra Pintada (uma viagem à cidade da minha primeira infância)”, ainda inédita.
Nossa canoa cortava
as águas do paraná,
ia de remo ou de vela
a canoa a navegar,
quando as águas se agitavam
no centro dos temporais
as velas se recolhiam
para os mastros não quebrar,
até onde o poderio
da vela de pano inflada
triscava no ouro do rio
com seus ângulos de prata.
A cidade então surgia
como um sonho de criança,
curumim de pés descalços
sem nem pensar no amanhã,
só precisava aprender
calçar os pés e ser digno,
sapatos de andar nas ruas
cortados de couro fino,
mas os calos doloridos
do curumim adestrado
castigavam os seus pés
para não andar descalço.
Era distante a cidade
do Roseiral de canoa,
mas estava sempre dentro
do meu peito onde ela ecoa
nas emoções mais maduras
recolhidas nos paneiros
como frutas de cacau
e o sumo escorrendo vivo
do balanço das peneiras
das tranças do tipiti,
goló-goló, capilé,
chocolate com gemada
e vinho de buriti.
Nada a cidade escondia
à flor da minha alegria.
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