Minhas preocupações com a questão ambiental são quase obsessivas e minhas reflexões começam pela bíblica história da criação do mundo, quando Deus deu à Adão a responsabilidade sobre o uso e conservação das coisas do Jardim do Éden. Suponho que esse primeiro homem, de forma precavida, escreveu um testamento transferindo para seus descendentes a missão que lhe foi dada pelo Senhor.
Muitos anos depois, a defesa do patrimônio apareceu na Babilônia quando o imperador Humarabi (1792 – 1750 a. C), diante da destruição das florestas declarou: “se eu constatar dano feito a um galho sequer […] não tolerarei o culpado por esse crime”. Apesar de concepções como a do babilônico Hamurabi, o antropocentrismo, durou até o surgimento da História Natural que valoriza a diversidade natural, fortalecendo teoricamente configuração de uma nova relação homem-natureza em benefício do futuro.
DOIS MARCOS MARCANTES
Acho que depois de Humarabi, um famoso herdeiro do Testamento de Adão foi São Francisco de Assis que, em 1224, divulgou seu Cântico das Criaturas, uma louvação à natureza, onde ele ressalta a incompatibilidade entre o sistema humano e as irmandades louvadas por ele e nomeadas como Irmão Sol, Irmã Lua e Estrelas, Irmã Vento, Ar, Nuvens e Sereno, Irmã Água, Irmão Fogo, Irmã Terra, Irmã Morte Corporal.
Mais de seiscentos anos depois (1855) um Cacique Pele Vermelha de nome Seatle, respondendo à proposta de compra das terras do povo Suquamish feita pelo presidente dos Estados Unidos, Franklin Pierce (1853-1857) escreveu um dos mais importantes capítulos de defesa da natureza de onde retiro e destaco: “Como podes comprar ou vender o céu, o calor da terra?” “Esta água brilhante que corre nos regatos e nos rios não é apenas água, é como se fosse o sangue de nossos ancestrais”; “Tudo que agride a terra agride os filhos da terra”; Não foi o homem quem teceu a trama da vida, ele é, meramente, um fio da mesma”.
MARCO BRASILEIRO
No Brasil, o primeiro herdeiro a se manifestar foi José Bonifácio de Andrade e Silva que, no século 19 disse: “se a navegação aviventa o comércio e a lavoura, não pode haver navegação sem rios, não pode haver rios sem fontes, não há fontes sem chuva, não há chuvas sem umidade, não há umidade sem florestas”.
A QUESTÃO TOMOU VULTO
Nas décadas de 1930 a 1950 muitos beneficiados com o patrimônio divino transferido para Adão se manifestaram, sendo emblemáticas as que foram feitas através dos filmes de far west cujo poder de comunicação foi fundamental para mostrar exemplos emblemáticos como o da escassez de água e a luta dos índios por suas terras. Em 1933 um grupo de sucessores do primeiro homem assinou a Convenção de Londres voltada para a preservação da flora, da fauna, das florestas nativas e espécies raras, ligando conservação e economia. A luta tomou fôlego nas décadas de 1950-1960, quando movimentos sociais dominaram o pensamento mundial, sendo emblemático o movimento dos hippies e beatnicks cujo emblema maior foi o rock’n roll.
Na metade do século 20 alguns herdeiros se organizaram (principalmente mulheres, negros e índios) e iniciaram uma luta contra o modelo capitalista de produção-consumo, clamando por uma economia assentada sustentabilidade.
Essa luta recebeu forte aliado na teoria do livro Silent spring, de Rachel Carson (1962) que foi a semente que fez germinar muitos organismos públicos e privados de defesa do meio ambiente. Em 1968 sob os auspícios da Organization of African Unity (OAU) surgiu a Convenção sobre a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais visando a proteção das coisas que foram legadas à Adão no dia da inauguração do paraíso. E nesse mesmo ano surgiu o Clube de Roma que financiou, nos anos de 1970, o Relatório do Massachusetts Institute of Technology (MIT) intitulado The limits to growth.
Vou continuar com esse tema na próxima semana, advertindo que o título deste artigo, e dos outros, – Magnos Conflitos – se refere aos conflitos gerados pela nossa Carta Magna, onde, no artigo 225 foram inseridas três expressões ligadas ao meio ambiente, embora sem qualquer preocupação com definições ou conceitos o que tem gerado magnos conflitos de origem e dimensão.
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