Manaus, 21 de novembro de 2024

A mula sem cabeça da Epaminondas

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Este fato aconteceu no tempo em que a Estrada Epaminondas já estava calçada, lá pelo início do século, e nela estavam localizados o Cemitério São José, embaixo do Clube Rio Negro, à Praça da Saudade, e o quartel do 27º Batalhão de Caçadores, o atual Colégio Militar.

O prédio do Quartel levara anos para ser construído, ali no Largo da Pólvora, depois Praça General Osório, onde eram feitos os exercícios do 3º Batalhão de Artilharia a Pé, de maior extensão, abrangendo as terras até às ruas da Instalação e Itamaracá, e o local ocupado pelo Colégio Dom Bosco. Possuía, um pouco acima da calçada, umas meias janelas gradeadas, onde uma pessoa podia abrigar-se.

A iluminação pública de Manaus para aqueles lados ainda era precária, e muitos temiam passar por ali, às horas mortas, por causa do campo santo, em uma época em que a cidade era povoada de fantasmas, devido à escuridão.

O soldado Catão, que cheguei a conhecer, já com mais de cem anos de idade, participante da Guerra do Paraguai, tinha tomado algumas doses da cachaça Paraty Graúna e se atrasara para recolher-se à caserna. Já passavam das dez horas da noite, naquela sexta feira chuvosa de lua cheia, quando ouviu relinchos e uma chama de fogo azulado, lá para as bandas da Praça da Saudade, e logo o som de cascos e ferraduras batendo nas pedras da rua.

Sentiu que algo de sobrenatural estava acontecendo e logo se lembrou da história daquela alma penada transformada em mula-sem-cabeça, todas as sextas feiras de lua cheia, por sua mancebia com um padre.

Ela saia do Cemitério São José a galope, arrancando faíscas das pedras e cuspindo fogo, até desaparecer lá para os lados da Praça Pedro II e de novo voltava ao Cemitério, para cumprir a penitência que lhe havia sido imposta.

Catão rapidamente abrigou-se em uma daquelas meias janelas em arco do quartel, enquanto o animal passava em desabalada carreira, escoiceando e lançando fogo. Uma das baforadas, em sua direção, queimou a tinta da parede e deixou uma marca carbonizada, que ali ficou por muito tempo. Era como se o animal fantasmagórico houvesse sentido a presença dele.

Quando ela desapareceu lá para os lados da Itamaracá, Catão saiu correndo e entrou esbaforido no quartel, nunca mais se atrasando, principalmente nas noites de sextas feiras de lua cheia.

Com o progresso, os bondes, a iluminação e a transferência do Cemitério, ou ela cumpriu o seu fado, ou se mudou para outro lugar, talvez lá para as bandas do Tarumã, dizem muitos.

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