Manaus, 21 de setembro de 2024

Amazônia: o PPB, o ministro e as facções do garimpo

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E para seguir coerente com seu desprezo pela economia da Amazônia, o governo federal acaba de disparar o tiro de misericórdia na Indústria da ZFM. O ministro da Economia, Paulo Guedes, que prometeu, junto com o presidente da República, Jair Bolsonaro, corrigir os danos do Decreto 10.979/22, não corrigiu, mentiu e mais, ampliou por seis meses os danos de seu equívoco. Pelo andar da carruagem, sob Guedes, a União seguirá esvaziando o programa ZFM, como anunciou e sempre quis desde antes de assumir seu encargo de gestor da economia do país. Ainda restam dúvidas?

O que é o PPB? E por que essa figura burocrática e anacrônica permanece impedindo que a economia do Amazonas seja abençoada, diversificada e regionalizada para benefício da população, com a geração de empregos e oportunidades? E por que estamos particularizando o PPB, que é apenas mais um entre tantos embaraços que o governo central tem interposto para Amazônia ter um desenvolvimento sustentável e solidário que nós insistimos em consolidar há anos?

Essa pergunta sobre o PPB foi feita por um servidor público do Ministério da Economia, do alto escalão, durante a movimentação dos atores locais, deslocados para Brasília, buscando esclarecer os equívocos constantes do Decreto 10.979/22, que não irá aliviar a cangalha tributária do Custo Brasil, entretanto fere de morte a economia do Amazonas. A pergunta, aparentemente inocente, se junta a outras muito frequente que ratificam o desconhecimento, descaso e desimportância com que a União trata os interesses da Amazônia em geral e do Estado do Amazonas em particular. É comum, a propósito, que muitos agentes encastelados em Brasília não saibam a diferença entre Amazônia e Amazonas. Façam o teste.

Mas o que é mesmo o PPB? Bem, essa sigla significa processo produtivo básico, ou seja, um conjunto detalhado de exigências – elaborado no século passado – para licenciar as empresas que optam por se instalar no Polo Industrial de Manaus. O argumento, teoricamente, era controlar o que se chamava de Índice de Nacionalização. Na verdade, a prática confirmou, a burocracia foi desenhada para proteger grupos e segmentos interessados historicamente em boicotar o PIM. A partir da abertura da economia e da tolerância com o contrabando asiático, muitas empresas nacionais passaram a usufruir dos mesmos benefícios da Zona Franca de Manaus sem as exigências do PPB. E o Amazonas, de pés e mãos amarradas, segue obrigado a cumprir a liturgia burocrática e extemporânea deste embargo disfarçado. E pensar que a Constituição Federal proíbe apenas 5 produtos no regime fiscal da ZFM: perfumes, cigarros, automóveis de passeio, bebidas alcoólicas e armas e munições.

E para seguir coerente com seu desprezo pela economia da Amazônia, o governo federal acaba de disparar o tiro de misericórdia na Indústria da ZFM. O ministro da EconomiaPaulo Guedes, que prometeu, junto com o presidente da República, Jair Bolsonaro, corrigir os danos do Decreto 10.979/22, não corrigiu, mentiu e mais, ampliou por seis meses os danos de seu equívoco. Pelo andar da carruagem, sob Guedes, a União seguirá esvaziando o programa Zona Franca de Manaus, como anunciou e sempre quis desde antes de assumir seu encargo de gestor da economia do país. Ainda restam dúvidas?

E qual é o plano federal para a Amazônia? O mesmo de sempre. O saque e a demagogia das promessas que, rapidamente, se revelam não cumpridas. Estão aí os anúncios da enganação. A começar pela BR-319, uma rodovia que já existiu e que a União deixou de fazer sua manutenção. E que foi “empenhada” pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas. Jura? O atual candidato ao governo paulista foi eloquente em suas miragens que resultaram em novas miragens e decepção. A transformação da Amazônia em Centro Mundial de Bioeconomia, o CNPJ do CBA e uma lista infinita de blá, blá, blá, são de fazer inveja a Greta Thunberg, que assim traduziu as promessas dos países industrializados de enfrentamento da mudança climática.

Mas nem só de omissão vive a nova política do Estado Brasileiro para a Amazônia. Desde o começo do atual governo, a União tratou de liberar e tolerar o desmatamento para retirada de madeiras nobres e fazer avançar a fronteira da pecuária predatória. O ex-ministro do Meio Ambiente foi obrigado a deixar o cargo porque a Polícia Federal descobriu suas digitais na venda de madeira ilegal para os Estados Unidos. Antes, atendendo ordens superiores, o então ministro Ricardo Salles liberou o garimpo ilegal em terra indígena. Entregue ao apetite político e pecuniário do Centrão, o governo busca aprovar no Congresso autorização provisória de atividades mineradoras sem estudos de impacto ambiental e à revelia constitucional.

Em artigo publicado na semana passada, o Documentarista João Moreira Sales, da Revista Piauí, assim resumiu a nova matriz econômica abençoada com a liberação federal do garimpo em terras indígenas: “Conhecemos bem o garimpo. Como mostram vários estudos recentes, ele se tornou um braço das facções criminosas, a começar pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), que hoje domina a atividade em terras yanomamis. O garimpeiro de bateia na beira do rio, brasileiro pobre atrás do seu pão, é um personagem extemporâneo sem outra serventia a não ser mascarar com tinturas sociais uma atividade cada vez mais violenta e capitalizada. Os meios de produção do garimpo atual são balsas que custam 2 milhões de reais, mercúrio de comercialização ilegal no Brasil, condições de trabalho degradantes e fuzis AR-15, agora municiados com projéteis não rastreáveis graças à bonomia presidencial”. Pois é: o garimpo foi autorizado por determinação presidencial e a produção de armas, sem PPB, também. Precisa dizer mais alguma coisa?

II

A Amazônia e os sete pecados ambientais do Brasil

Chegamos ao cúmulo de constatar a oficialização e legalização desta tragédia, representada pelo Dia do Fogo, em agosto de 2019. Foi uma combinação sinistra feita por fazendeiros da BR-163, no Pará, ocorrida no município de Novo Progresso (sic!) e transformado num mote amazônico de destruição.

Coluna Follow-Up

Antes tarde do que nunca, a justiça brasileira põe em pauta o desmonte da estrutura de proteção ambiental do país posta em prática pelo governo federal. Começou nesta quarta-feira, 30 de março, um debate no colegiado da Corte Suprema de extrema urgência e emergência para o futuro do país e de sua contribuição efetiva para o combate ou agravamento da mudança climática em curso. São sete itens de temas, problemas, ações e omissões referentes à gestão federal do atual governo, suas premissas, equívocos e riscos de comprometimento, encaminhadas por diversas organizações, instituições e agremiações políticas. O Brasil e o mundo estarão acompanhando este debate do qual se espera um basta para os estragos socioambientais, alguns irreversíveis, de inestimáveis prejuízos.

O Brasil, nos últimos anos, desarticulou o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, e congelou os recursos do Fundo Amazônia, destinado exatamente para este fim, entre outros. O plano foi desenhado em três eixos principais: ordenamento fundiário e territorial; monitoramento e controle ambiental; fomento às atividades produtivas sustentáveis. Recorde e mais recordes de desmatamento a cada relatório, desmantelamento dos órgãos de fiscalização e anistia ampla, geral e irrestrita para os desmatadores e demais criminosos que atuam na Amazônia. Este Plano, entre 2004 e 2012, reduziu a taxa de desmatamento de 27 mil km² em 2004 – segunda maior da história do país – para 4,5 mil km², em 2012, – a mais baixa já contabilizada até hoje. Ou seja, é possível cumprir o Acordo do Clima, assinado pelo Brasil e reassumido pelo governo federal, em outubro de 2021, na Escócia, onde prometemos zerar o desmatamento da Amazônia até 2030. Cabe à Suprema Corte, neste momento, baseada na Carta Magna, exigir as medidas práticas e instrumentais para o cumprimento deste compromisso. Imediatamente.

Este compromisso da redução do desmatamento, assumido em Glasgow, num discurso presidencial e através da presidência do IBAMA, ou do que restou da instituição, Joaquim Leite, havia sido entregue ao vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, sem os recursos ou habilidades para fazê-lo. Foi gasto muito mais recurso do que o orçamento destinava aos organismos constituídos de fiscalização e monitoramento, com resultados pífios. As Forças Armadas, envolvidas na Operação Verde, fracassaram porque apagar incêndio na floresta, sobretudo feito por profissionais, nunca fez parte da formação básica dos militares do Brasil. Chegamos ao cúmulo de constatar a oficialização e legalização desta tragédia, representada pelo Dia do Fogo, em agosto de 2019. Foi uma combinação sinistra feita por fazendeiros da BR-163, no Pará, ocorrida no município de Novo Progresso (sic!) e transformado num mote amazônico de destruição.

E, em que medida isso repercute na economia do Amazonas, o que ganha e o que perde o Estado com essa discussão? A Zona Franca de Manaus, estruturada no coração da maior floresta tropical do planeta, é uma economia pujante e, estrategicamente instalada numa região remota, que utiliza como compensação fiscal 7,6% do bolo fiscal do Brasil. Essa economia assentada no Polo industrial de Manaus, se afirmou historicamente como matriz econômica ajustada às condições ambientais. Daí sua performance de contribuição para manter a cobertura vegetal original com mais de 90% de seu acervo protegido. Com o desmonte do controle e proteção da floresta, o Sul do Amazonas passou a integrar o Arco do Desmatamento, no sul do Estado. Ironicamente, a política ambiental do governo liberal – explicitamente contrário ao programa ZFM, encarregou-se de promover a remoção de nosso maior triunfo – além dos 500 mil empregos gerados e patrocínio integral da UEA. Universidade do estado do Amazonas – de compensação dos tímidos percentuais de incentivos fiscais.

Resta-nos torcer pela reafirmação da lucidez, firmeza e equilíbrio do Supremo Tribunal Federal, zelador da Lei e tradicional instituição de acolhimento dos direitos constitucionais do programa Zona Franca de Manaus, o maior acerto de contrapartida fiscal para redução das desigualdades regionais.

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