Manaus, 22 de novembro de 2024

Apenas uma palavra

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(1993)

Não é saudação de políticos

Nem proselitismo de religiosos

Que te quero dedicar:

Apenas uma palavra!

 

Não te quero oferecer louvores.

Flores? Onde colocá-las?

Se não possuis vasos, jardins, alamedas!

Talvez, um dia, um túmulo em terra firme!

 

Não te quero exaltar

Com estranhos dotes altaneiros,

Nem te imputar a posse

De convicções suicidas

Dos faccionários.

Nem te jubilar quero

Com esquisitas menções honrosas

Dos que te colocam acima

De tuas reais medidas,

Para te seduzir,

Sabe lá com que intenções!

 

Também não penso em te censurar

À maneira das colonagens

Que aqui chegam de outras paragens

Conhecedoras de outros brasis (que não é o teu!)

Porque sei que não compreenderás

A homilia, o discurso, a dialética, o poema!

 

Assim como não compreendes bem

Porque te chama de indolente

Os que não te respeitam

A índole cautelosa

Ante as ameaças latentes

Rondando o teu jirau.

 

Se te esquivas

Diante de pressupostos civilizatórios,

Não é porque não te agrade o bom viver,

Nem porque não desejes ter uma vida sem malefícios,

Mas porque o teu proceder,

Deve fazer jus aos teus genes.

 

Os teus olhos acostumados

à luxúria da floresta,

não deixam que te rendas

ao modismo, à farsa e ao teatro.

Tu que só convives

com leis implacáveis

e um infeliz lapso

pode até significar

tua passagem sem vida

por cima das restingas brutas,

atulhadas de répteis!

 

É redundância eu te falar

No exotismo das flores

Pois sabes que, muitas delas escondem

Letais ascídias, traiçoeiras e reais.

 

Que posso te oferecer,

Além do que pode oferecer outro igual?

 

Em tua face, continua estampado

o ceticismo que é a tua identidade.

Teus olhos mudos

Orbitam pelos estirões,

Denunciando um mistério a mais no planeta:

Um fragmento da raça humana

Tão perdida em suas variações!

 

Em teus lábios, estão retidos

Um grito e um sorriso,

Deixados pelo ancestral venturoso

Que guardas para outras gerações!

 

Tua voz de um silêncio gritante

Que agoniza nos beiradões,

Não a ouve quem te seduz, quem te rodeia,

Quem te faz um cerco irreversível,

Diminuindo teu mundo, cada vez mais!

 

Para onde foi tua herança de fartura das várzeas,

De que falavam os antigos relatores?

Hoje, os novos senhores, até de cobram pela falta de perícia,

Incapacidade para defender teu solo!

Cobram-te por ontem e por hoje!

Como? Se nunca dispões

Da propícia montaria

Nos momentos cruciais!

 

O teu mundo é grande demais

Para que tu possas guardá-lo adequadamente.

Aliás, nem sabias que precisava ser guardado,

Ou mesmo que ele te pertencia!

És tu o estranho guardião

De tuas próprias riquezas,

Que, de direito natural, seriam tuas,

Não fosse tanto falatório,

Fazendo com que acredites

Que todas essas coisas

Pertencem à Humanidade!

Ora, a recíproca é verdadeira, pensarás!

Pois sim! E por que as benesses da humanidade

Não te pertencem também?

 

Exigem de ti que guardes

Toda a biogenética e os bancos enigmáticos

De dados insuspeitáveis que – dizem! – salvarão a humanidade!

 

Como podes guardar tão valiosos tesouros

Se não podes nem com o impaludismo

E a verminose consome tua prole.

Dois males que, por si só,

Obrigam-te a declinar

De tão graúdas responsabilidades.

 

E talvez não seja de todo ruim

Desconheceres o que te mandam guardar.

Diante de tantas potencialidades em tua mão,

Ficarias ambicioso e perdulário,

Igualmente aos pseudo-sábios que te pesquisam,

E não te dizem tudo o que sabem,

E escondem de ti o mais importante!

 

Como poderias conviver com poder

Do nióbio-titanato?!

Já te apresentaram a bauxita,

A quernita, a psilomelanita, a terita?

Nomes de fêmeas não são!

Nem mesmo das partes delas.

Talvez até sejam

Modernas denominações

Das Novas Amazonas

Provocando guerrilhas

Nos laboratórios globais,

Personagens de uma história anunciada

Que certamente não será a tua!

 

Interessa-te, isto sim, a linha horizontal

Marcada na ribanceira

Onde a ariramba faz o ninho

E pela qual sabes a meteorologia

Da estação seguinte.

A enchente e a vazante

Merecem toda a atenção!

 

Se o Sol, de amazônico ouro, ainda pousa em teu rosto

Como um irmão que te conhece;

Se a Lua, de plurais faces

– que nem poronga viajante no céu da madrugada –

Ainda te vigia, indicando o perigo;

Se o Rio, de obscuras águas,

Ainda te mostra, na líquida espera,

O alimento substancial,

Tens todo o direito de permanecer (ainda) a salvo

Das loucuras dos civilizados

Das bolsas de commodities,

Das grandes negociatas,

Até um dia, quando acordares

Para ser feliz ou infeliz,

Capitalizando (não há outra saída!)

Tem imenso império depositado nas águas,

No subsolo, nas plantas

Da tua Amazônia!

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