No período áureo da borracha que se determinou chamar de “belle époque amazonense”, o ponto de encontro social mais importante e altamente sofisticado era o Teatro Amazonas, inaugurado em dezembro de 1896 e desde janeiro do ano seguinte com seguidas récitas de óperas apresentadas por companhias na sua maioria de alto nível e internacionais.
Para o teatro acorriam as principais figuras da sociedade amazonense, do mundo econômico, político, intelectual e social de modo geral, formando pares elegantes, quando as mulheres estavam em seda e bordados com suas joias mais caras e sofisticadas e os homens quase sempre em smoking ou fraque e cartola, entre ricos, novos ricos, jornalistas e comentaristas da vida alheia, e alguns que, na linguagem da minha juventude, bem poderiam ser chamados de lisos e confiados.
Havia jornais de todo o tipo na época: humorísticos, noticiosos, partidários, de teatro, de esportes, combativos, agressivos, dirigidos por homens destemidos e atrevidos, enfim, para todos os gostos e prazeres da vida mundana, e até jornais editados em língua estrangeira para satisfazer as colônias aqui residentes e o luxo que precisava ser demonstrado na capital da borracha.
Dentre os jornalistas mais destemidos e atrevidos estava João Barreto de Menezes, chamado jocosamente de Janjão, filho do grande pensador brasileiro Tobias Barreto e que por aqui aportara como muitos outros jovens em busca de riqueza, projeção, trabalho e tranquilidade. Outro de igual cepa e ainda mais desarvorado, que também atuava em jornais na cidade era Fran Pacheco que de uma hora para outra resolveu atacar frontalmente a Tobias, desancando o pau em tudo que dele soubesse, com modos que não poderiam ser admitidos pelo tal do Janjão.
João Barreto foi o autor da denúncia de que Eduardo Ribeiro teria sido assassinado, e que não era concebível ter havido suicídio, portanto, enfrentando os maiorais da política e do governo, pouco tempo depois desse episódio. Fran implicava com sua própria sombra, não sobrando perdão nem desculpas de nenhuma maneira. Eram ferro em brasa como diziam os mais antigos ao comentar sobre a conduta desses “desassombrados” que, quase sempre acabam na ponta da peixeira, para usar uma linguagem comum.
Aquela foi uma campanha ferrenha pela imprensa, quase que diária. E como nordestino não leva desaforo para casa o assunto terminou em ataque corporal entre eles, pelo que se vê muito bem preparado por Janjão de modo a surpreender o Fran.
O caso é que aquela campanha de ofensas, de parte a parte, acabou sendo levada para a varanda lateral do Teatro Amazonas quando, no intervalo de uma das récitas em 1899, Fran se deliciava com a brisa da noite da independência do Brasil fumando seu charuto importado. Inesperadamente João Barreto chegou ao local e sem dar tempo para defesa, acompanhado de três capangas, desferiu certeiras bengaladas no ofensor da honra de seu pai, quebrando as lunetas que o dito cujo portava e o colocando para correr escadas abaixo.
Foi um escândalo daqueles que ocupou muitos dias de comentários na imprensa de Manaus, Belém e São Luiz do Maranhão para onde anos depois o tal do Fran Pacheco, encrenqueiro dos grandes, resolveu voltar. E não deve ter sido o único enfrentamento de cavalheiros naquela Manaus ensolarada e parisiense, tendo o teatro como palco, mas esse entrou para a história.
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