Manaus, 19 de junho de 2025

Casas dos sonhos

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“[…] foi palco de reuniões e banquetes de interesse político, social e econômico, mas não perdeu a referência de ter sido palacete do alemão endinheirado, nem sede do governo e de altas decisões […]. 

Não estou a falar de nenhuma casa do mundo de fantasias que costuma estar nas estórias infantis, nem do imponente Palácio do Governo que Eduardo Ribeiro projetou e a cujas obras deu início, o qual anos mais tarde foi dinamitado, e estava localizado no alto da avenida que leva o seu nome. Trato do Palacete Scholz, adquirido em 1918 pelo governador Pedro d ‘ Alcântara Bacellar, mesmo em ano de grave crise financeira e ‘econômica do Estado, para servir de sede da administração estadual e residência oficial do governador, na antiga Rua Municipal depois Avenida Sete de Setembro.

Prédio edificado em pedra, com charme e elegância em relação ao qual, em 1995, na qualidade de secretário de Estado de Comunicação Social, ao tomar conhecimento que o governador pretendia mudar o gabinete de despachos para outro local, dei a ideia ao meu amigo Amazonino Mendes de transformá-lo em Centro Cultural, o que viria a se efetivar em 1997 em razão de contrato que firmei com o Centro Cultural Banco do Brasil e que prestou a primeira consultoria nacional nesse sentido.

O Palacete era o que o seu proprietário chamava de “casa dos sonhos”, com projeto de Henry Mors, primo do ‘diretor da firma N.H. Witt, dono da Bolsa Universal. Foi um sucesso na Manaus daqueles anos iniciais de 1900. A torre servia para sugar o ar quente do recinto, atuando da casa para fora, além de ajudar a reduzir o barulho’ diante dos “solos de fanfarra (que o exagerado Waldemar gostava de executar)”, conforme explica N. H Witt, neto, em carta que me dirigiu 2014, a qual guardo dentre algumas outras preciosas correspondências históricas.

O velho amigo alemão deu as informações mais precisas sobre a Casa, ao esclarecer que as caneletas que funcionavam como um sistema de ar condicionado passavam atrás de biombos de filigranas de madeira nos cantos das paredes, por baixo do teto das salas e em direção da torre exaustora que sugava bastante ar para cima com muita força. Era um sistema pesado, com tubulações redondas, com tampa e bolas de madeira que davam vasão ao ar quente. Explica o velho amigo, ainda, que “o fluxo de ar tão forte que não era possível de ser aparado com a mão”.

Depois, não se sabe bem a razão, nem quando, esses filtros foram tapados com gesso e a chaminé da torre foi aproveitada para ser instalado um elevador, anos mais tarde.

Diverso do que sempre se falava em Manaus, meu velho amigo revela que Waldemar Scholz teve um casal de filhos que estudava na Alemanha, os quais, depois do falecimento dos pais, ambos por câncer em decorrência de tabagismo, ficaram em situação de vida bastante precária.

A comunidade alemã em Manaus não era tão pequena quanto é costume pensar. Aliás, não é de estranhar que em Manaus da “belle époque”, no período áureo da borracha, tenha residido muitos alemães, grande parte deles originários de Dresden, considerada a cidade intelectual da Alemanha da época, a qual acabou implodida ao tempo da Guerra Mundial, apagando todos os sinais possíveis dessas famílias. Ao que afirma meu velho amigo, por exemplo, viveram em Berlim, Alerrs, Mors, N. H. Witt e Pearl e na Suíça, Oscar Dusenschon, todos que tiveram grandes negócios e incontáveis interesses econômicos em Manaus.

A casa dos sonhos, assim definida desde os anos mais antigos, ganhou novo perfil de uso como Centro Cultural, acolheu eventos de grande importância, foi palco de reuniões e banquetes de interesse político, social e econômico desde 1997, mas não perdeu a referência de ter sido palacete do alemão endinheirado, nem sede do governo e de altas decisões, e ainda tem muita coisa a ser contada sobre sua trajetória, desde os belos jardins de fundos, o porto de atracação de barcos, a fuga de governadores, a invasão dos indígenas, as revoluções e o queima-queima da cadeira oficial. Tudo isso fica para outra vez…

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