Com pesar, vimos na semana passada o anúncio de que foram cumpridas parcialmente, apenas, quatro das vinte metas propostas no Plano Nacional da Educação (PNE,2014-2024): melhorar o fluxo de aprendizagem e as médias no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb); triplicar as matrículas no ensino profissional e técnico; aumentar a qualidade de formação dos professores de ensino superior; titular 60 mil pessoas com mestrado. As demais metas pouco avançaram. E ainda sobraram retrocessos: implementação das escolas cívico-militares; mudanças curriculares controversas no Ensino Médio; proibições de caráter ideológico que almejavam transformar as escolas públicas em “madrassas da extrema direita”, com delírios medievalescos e aspirações teocráticas. Mas não foi somente isso: consolidou-se, nos dez anos do plano, o processo de transformação da educação em mercadoria, com a conivência do Estado Brasileiro.
A partir do Estado Novo assistimos a Escola Pública laica perder a sua aura e crescer em números expressivos o ensino em estabelecimentos religiosos. Quando a Lei de Diretrizes e Bases (LDB/1971) impõe o ensino profissionalizante obrigatório e exclusivo na Escola Pública para atender à formação de mão de obra mais qualificada para o mercado de trabalho e, obrigatório, mas ampliado e flexível nas Escolas Privadas, abriu-se um nicho de mercado promissor para que a iniciativa privada investisse na educação em atendimento às famílias abastadas, que esperavam itinerário diferente para seus filhos. Pronto! Estava feita a separação entre ricos e pobres e dadas as condições de aprofundamento da desigualdade social na educação dos brasileiros. O Mercado cresce, das Creches ao Ensino Superior. A ideia consagrada na Constituição Federal/88 de que a educação é um direito do povo e um dever do Estado foi sendo pervertida pelo mercado educacional privado já no final do milênio: a transferência de recursos públicos para as Organizações Sociais, que podiam recebê-los e aplicá-los em “educação”, substituindo o Estado; financiamentos do BNDES a juros baixos para instituições privadas ampliarem o patrimônio físico e vagas, sob o entendimento de serem “mais eficiente” no atendimento às necessidades do mercado por mão de obra com nível superior. Esse modelo neoliberal chega ao ensino superior com o Ministro Paulo Renato, de FHC. Implantou o Orçamento Mínimo para as Universidades Públicas, obrigando-as a buscarem recursos próprios pela associação com empresas privadas às quais passariam a prestar serviços especializados de pesquisa e fornecimento de treinamento pagos; e ampliação dos programas de bolsas de estudo e financiamentos diretos aos estudantes nas Universidades Privadas. A universidade pública encolheu, enquanto o ensino privado cresceu em patrimônio e alunato. Estava, assim, completo o pacote para que a Educação se transformasse em mercadoria nas mãos das “Holding Educacionais”, comprando todos esses estabelecimentos particulares de ensino, ora familiares ou confessionais, enriquecidos e ampliados com os juros baixos do BNDES. São empresas de capital aberto operando nas Bolsas de Valores, no Brasil. “Lemann, Kroton, Yduques, Ânima Holding, SEB Person, Bahema, Ser Educacional, Inspira… tudo que essas empresas não são é inspiração pedagógica ou exemplo de preocupação educacional…: (representam) desnacionalização, alta lucratividade, capital financeiro nacional e internacional, nenhum compromisso com a educação como direito constitucional e instrumento nacional de desenvolvimento sustentável” (CartaCapital, 05.07.2021,13H03). Em nome desses conglomerados, Organizações Sociais “especializadas em educação” defendem interesses dos grupos que as financiam na esfera pública e nela ocupam espaços discursivos e de opinião, como a “Todos pela Educação”, “Brasil Escola” e outros, fornecendo lideranças que terminam compondo o Conselho Nacional de Educação, Secretarias e até indicam nomes para o Ministério. Levantamento de abril de 2024 dá conta dos nove maiores conglomerados no ensino superior no Brasil: Afya, Ânima, Cruzeiro do Sul, Kroton, Ser Educacional, Vitru, Yduqs, Unip e Uninove, detendo 58% de participação no mercado educacional, conforme dados da Consultoria Hoper Educação. E agora seu moço, educadores ou os prepostos do capital? Quem terá maior peso no novo PNE (2024/2034)?
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