Não necessariamente nesta mesma ordem, mas não podemos desconhecer a presença dessas categorias de análise na construção e interpretação dos acontecimentos no cotidiano dos brasileiros e de todos, em todo mundo. A diferença entre o Brasil e outros é, apenas, um doer de calos nos próprios pés e a existência de um processo avassalador pouco conhecido do discurso político atual, processo esse dissuasivo, maldoso e violento. E, se tudo der certo, impulsionado em 5G.
O discurso alimentado por promessas, bullying ou tiro no peito ou no pé dos adversários, praticado por “Coronéis de Barranco”, “Xerifes de partidos políticos” ou prepostos para gerar fatos relevantes na mídia ainda existe, mas perde valor. Foi assim no passado: o assassinato de João Pessoa, como ficou provado depois, foi um ato passional de vingança doméstica, transformado em fato político, estopim da Revolução de 30, com Getúlio Vargas. E, com Getúlio mesmo findou, ao ser atribuído a Gregório, chefe da guarda presidencial, o atentado da Rua Toneleiros (RJ), contra Lacerda. O desfecho foi o Suicídio de Getúlio e o fim de uma era de culto à personalidade (o Getulismo), que marcou a Ditadura do Estado Novo e a restauração do pós-guerra.
O Golpe Militar de 64 foi a quartelada que deu certo. Feito com tropas e tanques, prisões, tortura, chicotadas, fechamento das instituições, suspensão dos direitos, cassação de mandatos por todo o país e institucionalização de uma nova ordem política e social contra a “subversão”. Fez do medo, da violência real e do despudorado fervor patriótico a marca arrogante do seu discurso.
Apesar dos episódios sangrentos do século XX, avançamos bastante quando se vê o conjunto da obra. As conquistas de direitos políticos e sociais foi imensa. Conquistas expressamente lavradas na Constituição de 88, no caso brasileiro, que bem espelham a contemporaneidade do último quartel do século. Mas isso não significou a derrota completa dos “rebutalhos” das coisas ruins guardadas em velhos armários e que teimam sair deles quando a situação parece favorável: o patrimonialismo grosseiro de nossas elites, que se mantêm pela violência e pelo conchavo com os que conseguem manter na estrutura de poder; um grupo de “vivandeiras” (como as denominou o Gal. Castelo Branco), que ficam rondando os Quartéis para apoiar a tomada ilegal de poder, em parte formado por civis fracassados e descontentes com sua miséria moral; oportunistas das finanças, das chamadas “Farias Lima” da vida, que criam lendas para dar credibilidade a suas ganâncias; caudatários religiosos da TFP, que emprestaram seus modelos a outros movimentos e à algumas denominações religiosas, que servem a si mesmas e a um reino espúrio onde a justiça ainda é o “olho por olho”. Mas, há também, aqueles viúvos do fascismo, do nazismo, que se juntam aos “neomacartistas” empenhados na vitória da Direita Radical Internacional. Coexiste, ainda, num mundo paralelo, o esquerdismo fragmentado: da ala mais radical, que nega a existência do Estado, àquela quer o Estado para si, e acusa os que disso discordam de “analfabetos políticos”, socialistas ou não; e a “esquerda festiva”, de origem pequeno-burguesa. Isso dificulta a construção de projetos de governo e de vida, visando suprimir as desigualdades, as injustiças sociais e os preconceitos.
Concordo com Eric Hobsbawm (Era dos Extremos) sobre a curta duração do século XX e na sua enumeração do rastro de desgraças, com guerras que mataram milhares, Holocaustos, Guerra Fria, exploração desumana no mundo do trabalho e fundamentalismos religiosos. Todavia é impossível negar os avanços que nos trouxeram ao século XXI, muitos se devem à ciência, outros ao confronto da esquerda com o conservadorismo. Ainda estamos num limbo, mas essas nuvens se dissiparão. A felicidade não cairá do céu como maná, mas uma nova aurora surgirá, superando falsos discursos e ídolos; sem esse messianismo que tenta devorar em nós a paixão, a razão e a esperança!
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