O que restou da classe trabalhadora no mundo não reconhece mais a luta de classes como motor da história, ponto. A clássica divisão civilizacional entre Ocidente, Oriente e Sul Colonial foi implodindo paulatinamente no século XX e chegou a seu ápice. Os Impérios ideológicos ruíram deixando herdeiros decadentes ou ilegítimos. O capitalismo desvinculou-se dos seus suportes nacionalistas ideologicamente ligados ao Liberalismo Econômico e atingiu o estado puro, onde Ele mesmo é a Ideologia, bingo! As Emergências Climáticas estão causando estragos incomensuráveis, tanto humanos quanto econômicos, mas não são consideradas pelos negacionistas visto que os meios de mitigação e reparos das consequências ainda não são rentáveis ao capitalismo. Forças da maldade brotam do íntimo dos bandos que se associam nas redes sociais retomando credos fundamentalistas e teorias da conspiração ressuscitando a barbárie. Esse parece ser o estado atual do nosso mundo, que pode ser de transição, mas é o que temos para o momento. Dizem os especialistas que coisa parecida ocorreu no início do século passado, proporcionando o surgimento do fascismo, do nazismo e de duas grandes guerras mundiais, além de uma Nova Ordem Internacional apoiada na capacidade bélica dos blocos dominantes. Isso gerou: ganância deliberada do poder econômico; condenação sub-reptícia das formas de estado e de governo que nos guiaram na busca da democracia, da igualdade social e dos ideais de justiça; convicções cínicas de que não precisamos mais de utopias nem ideologias e o mundo pode ser gerido pela racionalidade, pela tecnicidade e pela objetividade em todos os seus propósitos, sem contrariar os interesses da concentração de renda, dos privilégios dos mais ricos, visíveis apenas na lista da “Forbes”, sem carne nem osso, diluídos que foram no sobe e desce das bolsas de valores do mundo dos milionários e em apostas mirabolantes. O ideal é o Estado mínimo, o corte de gastos com políticas públicas compensatórias e o fim do custeio à saúde pública que beneficia os mais pobres. Isso tudo é parte do contexto vigente e do receituário da governabilidade neoliberal, que já procura outro nome.
O Brasil é vítima de todos esses enganos, mesmo recuperando a credibilidade nos investimentos, voltando a ser a oitava economia do mundo, participando de um processo que busca romper com as formas de pagamentos centradas no dólar, mantendo um “Arcabouço Fiscal” exigido pelo tal “mercado”, reduzindo desigualdades, diminuindo o desemprego e tirando muita gente da miséria. Nem assim agrada a setores mais radicais, que exigem que o governo entregue tudo, pois só eles têm capacidade para gerir o Estado como se este fosse um teatro de marionetes, com suas cordas remotamente acionadas pelos “iluminados”: que não pagam impostos; que recusam fiscalização; que envenenam com agrotóxico para aumentar a produção; que fazem vista grossa aos grileiros de terras públicas e a garimpeiros ilegais. E assim, a mentira maior, propalam eles, estamos caminhando para o centro, para a pacificação da nação, para o progresso e a ordem, longe dos extremos que causam insegurança! Como acreditar em promessas se o brejo está bem ali!?
Expoentes da esquerda do Brasil dizem que irão se reunir para analisar a situação e propor diretrizes novas. Como? Dos seus doutores arrogantes que veem o país com as viseiras de um Brasil que só tem Leste e Sul muito pouco pode se esperar. O mesmo se pode dizer de seus “dinossauros” stalinistas remanescentes. Nossos partidos políticos são nacionais e a vida institucional do país alimenta-se estruturalmente desse processo, embora os lobbies dominem o Congresso Nacional. As invisibilidades, as subalternidades internas enfraquecem as conquistas e só reproduzem o que o “mundo mau” faz conosco no concerto das nações. Continuamos a pagar a corveia no fundo do quintal do país. O deboche é grande, estamos sujeitos ao marketing dos donos do dinheiro e do poder com o “merchan” na informação, na notícia e na opinião. Neste momento, não há cadeiras nem especialistas à altura para debater o Brasil Profundo e trazer luzes que nos levem à superação dessas dicotomias. Olhando assim, parece que não crescemos como Nação e, assim, não teremos futuro. Não percamos as esperanças, algo novo virá! A humanidade ainda não esgotou todas as suas forças para resolver os problemas que ela mesma cria, como nos ensinaram os grandes mestres animadores da luta social, e conosco não será diferente. O que parece um retrocesso poderá despertar em nós a força necessária para irmos adiante, se persistirmos em nossa luta contra o que nos impede de viver melhor.
Um homem estendido na Praça dos Três Poderes, em Brasília, vítima de si mesmo, mas vítima maior do extremismo na política Brasileira não é um bom augúrio nas comemorações do dia da República, é para lamentar, reprovar, mas não desanimar. Já falamos em outras ocasiões quão nefasta têm sido para o Brasil interferência do militarismo com seus motins e revoltas armadas marcando o destino da República e impedindo a superação dos ímpetos autoritários, inaugurados quando Dom Pedro I, ao rasgar a Constituição e outorgar uma outra ampliando seus poderes, instituiu o Poder Moderador. Por ironia do destino, esse artifício autoritário foi usurpado e militares associados aos civis promoveram o golpe que pôs fim ao Império e instaurou a República, em 1889, e que foi usado várias outras vezes para gerar crises entre o poder civil e militares. A República pareceu aos brasileiros um ajuste com mundo novo, pois, nos manuais da política, estaríamos mais próximos da igualdade, da participação política, da liberdade religiosa com a laicidade do estado, da pluralidade de pensamento e, portanto, da democracia.
A democracia brasileira, no entanto, tem sido um parto difícil. Quando militares se acalmam nos quartéis, as vivandeiras se embotam nos grupos civis como partidos políticos reacionários e, ainda, nas igrejas que se oferecem a participar dessa empresa maliciosa em busca de poder sobre o Estado em nome de suas pautas retrógradas de costumes ou mesmo de interferência no que não lhes é devido. Usando o eufemismo de patriotismo, atravessam o caminho da lei e do próprio poder da República e daquilo que ela significa. O resultado é um homem estendido no chão da praça, cercado de explosivos, encharcado de chuva e de ódio, por uma causa dele e de seu grupo, que só nos envergonha. Tudo isso destoa do que pensamos ser como República: nossas instituições foram desenhadas para o bem na CF/88, depois de tantos sofrimentos impostos por uma Ditadura Militar; o Brasil se faz respeitar por sua pujança natural, por sua cultura diversa e expressiva; apesar dos pesares, estamos buscando resolver problemas que nos dividem, sobretudo as diferenças regionais e raciais que se assemelham a verdadeiros apartheids; estamos ganhando reconhecimento internacional por esforço em cuidar do planeta, apesar das vozes dissonantes internas; estamos melhorando os nossos níveis de conhecimento em educação formal. Não dá para esquecer a força dos poderosos que se encastelam no tal chamado mercado ganancioso do capitalismo internacional e periférico, que teima em tomar para si o Estado e apequená-lo em seu benefício. Esta é uma luta que teremos que travar incessantemente, mas não é somente nossa, é universal. A reflexão é necessária, a vontade de superar problemas deve marcar o nosso esforço como brasileiros e tudo começa pela “res pública”!
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