Na semana passada meu texto nesta coluna falou sobre a experiência de ministrar, via TV, a disciplina Metodologia do Trabalho Científico, para alunos de 25 municípios do interior do Amazonas, matriculados no Curso de Tecnologia de Gestão Pública da Universidade do Estado do Amazonas.
O toque mais essencial do artigo passado foi o fato da ausência de bibliotecas municipais em funcionamento, em 24 dos 25 municípios, excetuando-se como exemplo gratificante, Apuí, cuja biblioteca municipal é pequena, mas bem cuidada. Não consigo entender porque os alcaides, (inclusive o de Manaus, que é a 5ª economia das capitais brasileiras) deixam as bibliotecas municipais fechadas, abandonadas e com o acervo (material permanente) destruído pela ação do tempo.
NOTA: uso o termo alcaide no sentido de chefe do poder executivo municipal e não no sentido dado no regionalismo gaúcho onde alcaide significa cavalo de má qualidade.
LIÇÕES APRENDIDAS
O trabalho de final da disciplina foi uma pesquisa sobre temas ligados à gestão pública, desenvolvido por grupos de alunos, cada um abordando um dos seguintes temas: “Educação e Cultura”, “Saúde e Qualidade de Vida”, “Esporte e Lazer”, “Saneamento básico e meio ambiente”, “Agropecuária e Agroindústria”, Orçamento Público”, “Acesso à Justiça e Segurança Pública”, “Emprego e Renda”.
Eu e o Prof. Dr. Walmir Albuquerque que ministramos a disciplina, optamos por usar essa atividade didático-pedagógica, por considerá-la muito eficiente e eficaz para o treinamento de aplicação de técnicas e métodos de pesquisa, em um curso de Tecnologia de Gestão Publica.
IGUALDADES E DESIGUALDADES
Entre as igualdades dolorosas que aproximam esses locais, ressalto o caos na saúde, no saneamento, na segurança, no acesso à justiça, na qualidade de vida, no desemprego, no abandono das questões ambientais, No campo das desigualdades, a mais cruel é a que reflete a diferença entre o orçamento Manaus e o de municípios como, p. ex., Careiro, Beruri, São Gabriel da Cachoeira, São Paulo de Olivença.
EXEMPLOS PUNGENTES
Uma característica similar brota dos relatórios: a falta de perspectivas de desenvolvimento como liberdade substantiva, no sentido dado por Amartya Sen. Para mim, o único dado positivo é a educação municipal que melhora graças aos programas da UEA e da UFAM que dão cursos à distância para formação de professores. Em alguns municípios, mais de 90% dos professores têm curso superior o que sinaliza um futuro mais promissor. Do outro lado do cenário o que se vê é o serviço público como a principal (única) atividade que dá emprego; o setor primário e agroindustrial não dispõe de logística para escoamento da produção; o fornecimento de energia é precário (luz para todos, no hinterland amazônico é conversa fiada); não há atendimento adequado à saúde; o serviço de distribuição de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo são calamitosos; o orçamento público não dá para atender as demandas locais; a qualidade de vida não é boa; não há juízes e promotores residentes (ficam, no máximo duas semanas por mês na sede), não há defensores públicos suficientes e presentes o que abarrota as cadeias; a segurança tem um contingente policial pequeno; as atividades esportivas se limitam aos jogos e torneios promovidos pelo poder público em campos de futebol e quadras com conservação muito ruim; a cultura se limita a dois ou três festivais folclóricos por ano onde são apresentados shows de artistas locais (poucos) e de fora (caríssimos); em um dos municípios, 47% das famílias vivem da “bolsa esmola” e para os que acham essa expressão inadequada lembro que não dar esse dinheiro tem o mesmo efeito de não dar esmolas aos mendigos; a saúde é um problema agravado pela falta de saneamento e pelo fato da estrutura material e humana ser precária ou ausente. Os governos doam ambulâncias e ambulanchas (totalmente necessárias), mas não garantem a manutenção, a contratação de pessoal e o combustível para esses veículos. Os equipamentos dos postos e hospitais são sucateados ou inoperantes por falta de manutenção e de pessoal qualificado para operá-los eficientemente. E, para finalizar, creio que a melhor definição para esse caos na saúde foi a definição dessas UTIs muito caras e sem operacionalidade e eficiência, dada pelo médico Luiz Bastos, presidente da Academia Paulista de Medicina de Limeira (SP): UTI significa “Última Tentativa Inútil de salvar a vida de alguém.
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