Manaus, 1 de dezembro de 2023

Faltou sensibilidade

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Meus sete leitores já devem estar fartos de saber que a infraestrutura urbana de Manaus é a mesma implantada em 1910.

Uma infraestrutura que se preocupa com as comodidades de uma elite minoritária e nunca preparou os caminhos para acompanhar a marcha da História.

A cidade dos barões da borracha não foi construída para atender o proletariado industrial, nem o brutal êxodo dos bolsões de miséria dos nossos arredores.

Manaus queria se parecer com uma miniatura de Paris, onde os bairros proletários foram exilados para a periferia distante e o centro, com sua elegância, suas lojas e restaurantes, serviriam para um rarefeito transito de bondes e carros de tração animal.

Um centro preparado para passeio do ócio e das compras.

Esta cidade elitizada e de fino acabamento, resistiu heroicamente à depressão econômica e parecia ter sido feita para durar uma eternidade. Com o advento da Zona Franca, a cidade vazou para todos os lados. Os administradores, que na sua esmagadora maioria não tinham a menor ideia do que era uma cidade, geralmente políticos populistas de formação intelectual rústica, não tiveram sensibilidade ou vontade política de evitar os estilhaços. Ao contrário, há caso de prefeitos que pareciam ter prazer em avacalhar a cidade. O número de veículos aumentou dezenas de vezes e os serviços básicos de luz, esgotos, calçamentos, pavimentação, não pareciam estar na agenda desses políticos. A infraestrutura ele esgoto e saneamento básico só não entrou em colapso pelo trabalho de Artur Neto em sua primeira gestão, que era olhado como um maluco por estar enterrando canos. Infelizmente não tentativas de executar um plano diretor para a capital, a tônica foi a da segurança, mania dos prepostos da ditadura militar. O coronel Jorge Teixeira, que é visto como a figa do bonachão, que se fantasiava de baiana no carnaval, implanta uma urbanização segregacionista, que isolava deliberadamente os bairros, criando ilhas isoladas fácil de reprimir, caso alguma comunidade se metesse a besta.

Além do mais a grande preocupação parecia estar voltada para atender a minoria dos proprietários de veículos em detrimento do transporte coletivo. A nova Manaus da Zona Franca começava a surgir ainda da mesma ideologia do “extrativismo”: para atender ao passeio dos motorizados. E assim, a paisagística transforma se em arquitetura de garagens e estacionamentos. O projeto de novas avenidas espaçosas e o alargamento de avenidas obsoletas, com vultosos dispêndios de indenizações, toma a frente de trabalhos mais urgentes. Como ninguém era daqui mesmo, o próprio centro histórico deixou de ser um espaço valorizado, como se o centro urbano já não fosse uma realidade de fato e um legado da psicologia da cidade. Mesmo porque a psicologia vigente era de adventícios, de gente sem compromisso com aquela área antiga, porque ignoravam solenemente a história de Manaus. Quanto ao centro, que era a menina dos olhos da velha elite e o foco principal de todo o planejamento, tornou-se pasto dos mascates arrivistas e paraíso da economia informal.

Caminhando pelas ruas da velha Manaus, não há casa reformada ou construída que não ostente sua fachada abastardada, portas cortadas nas fachadas para abrigar um comércio vagabundo, um ponto de venda ele comida que recende odores abismais. E lixo, muito lixo, pois tudo se joga no chão, para depois reclamar que os igarapés estão lotados de entulho, invadindo as palafitas basta que a água suba alguns centímetros. A atual arquitetura Baré caminha em sentido inverso às experiências de Severiano Porto, arquiteto que resgatou diversos materiais amazônicos para uso em seus projetos e que se dirigindo a uma arquitetura criativa e vinculada à natureza.

Chamo isso de estética do pesadelo amazônico, o kitsch da zona, das proporções acanalhadas, janelas retas e quadradas, frisos e lambris de metal, vidro fumê e ar refrigerado.

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