Desde o chamado Ciclo da Borracha que se observa claramente o despreparo histórico da elite amazonense no sentido de gerir seus próprios bens e de vislumbrar uma política que assegurasse a continuidade do fluxo financeiro. Atrapalhada pela intrincada selva dos financiamentos internacionais, nunca tomou o fenômeno como um todo, mas como uma mística muito pessoal. Acordaram como funcionários públicos e foram dormir como perdulários. Mesmo os mais ativos administradores resvalaram para a politicagem doméstica. Eduardo Ribeiro, por exemplo, preocupava se muito mais em controlar o Congresso Estadual, com gente de sua curriola, do que com as manobras internacionais do comércio de matérias primas.
Com a bancarrota, restaria uma camada de comerciantes menores e Industriais de manufatura primária. Em 1940, o Amazonas possuía a mesma estrutura social de 1740. O populismo, com esta elite defasada, não conseguiria avançar além de uma melhoria dos serviços públicos elementares.
Durante os anos 60 do século passado o status de região periférica seria mantido e o processo predatório continuado.
A atual elite vem deste período, entre a miséria e a esperança, em que o mundo enfrentou guerras e saiu novamente organizado e ainda mais exigente. Já se sabe o que significam as exigências desta era do pós-guerra. Antes da integração, as pequenas comunidades, como Manaus, sofriam de baixa liquidez, baixa produtividade. Seus administradores, por isso, sofriam de urna irresistível atração de, uma vez no poder, completarem com o erário público suas rendas pessoais.
Com estes rápidos processos de enriquecimento, e mesmo com os surtos econômicos favoráveis e “limpos”, formou se no Amazonas uma espécie delúmpen burguesia. Isto é, uma classe econômica dominante frágil e sem qualquer escrúpulo, à margem do processo histórico.
Esta elite marginal é filha do colonialismo português e se formou na escola econômica do extrativismo, onde contrair dependência financeira era sinônimo de prosperidade. Uma elite com esta natureza não possui padrão ideológico, assim como não pode formar uma cultura superior. O lumpesinato clássico não apresenta conotação social específica. E a elite amazonense vegeta a sombra das concessões federais e mesmo pode se irritar quando se vê ameaçada. Quando o deputado Pereira da Silva, porta voz desse lumpesinato burguês, elaborou em 1957 a Lei que criava a Zona Franca, seu foco de interesse era outro. Ele pretendia azeitar melhor as facilidades de importação e exportação, um método comercial que o extrativismo sabia fazer com perícia. Dez anos depois, sob a ação entreguista da ditadura civil militar, a Lei seria alterada por uma nova ordem que já não era o populismo. A implantação da Zona Franca, como uma medida federal, não fugiu a nenhuma tradição. Também ela veio como uma medida de fora para dentro, diferente apenas no espaço e no tempo das soluções do Marquês de Pombal ou de Getúlio Vargas.
Ela surpreendeu e avançou, para além do controle da elite estadual. Cresceu separada e invadiu a vida amazonense, afastando se praticamente da compreensão por parte do povo, e mesmo como significação histórica e política tem escapado da arguição da elite amazonense, tanto intelectual quanto empresarial. Há momentos em que os pés da elite amazonense sentem-se incomodados por uma pedra de difícil localização. Muitas vezes, esta pedra aparece como um espicaçar dos sentimentos jacobinos, outras vezes, ela acutila interesses imediatos e até certo medo de uma nova era de depressão e marasmo. A Zona Franca veio, assustou e até azeitou estruturas emperradas, mas não como a elite pensava. Ela foi criada num momento de ascendência do comércio internacional, de hegemonia dos Estados Unidos sobre as outras nações capitalistas.