Manaus, 19 de setembro de 2024

Histórias esquecidas

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Pelo Purus, de Areal Souto

Aqui, ali, além, de dobra em dobra,
De curva em curva, assim parece o rio,
Uma comprida e sonolenta cobra
Aberta meio a meio, pelo navio.

De um lado, aos meus olhos se desdobra,
Da mata, o manto secular bravio,
Castelo de esmeralda, onde sossobra
A vista além, no barranco sombrio.

A praia vejo do outro lado a linha
Dos verdes oiranais onde à tardinha
As garças brancas vão cismar a esmo.

Mas me concentro e, ao ver esta água turva,
Descubro a própria vida, e em cada curva,
O destino a brincar comigo mesmo.

(Publicado pela primeira vez no jornal O Brazil Acreano Nº1, de 12/4/1910, de Sena Madureira) :

Esses versos foram escritos em 1909 ou 1910, quando meu avô subia o rio Purus, rumo a Sena Madureira, recém-formado pela Faculdade de Direito do Recife, com apenas 24 anos, temeroso pelo seu destino. Ali viveu por meio século, em uma atribulada vida, lutando para manter seus ideais, dos quais nunca se afastaria.

Ao ler esses versos escritos de mais de cem anos lembrei-me de que os rios que iam para o Acre, tinham um movimento diferente e uma função fundamental para as suas populações ilhadas, nos seringais. Foram as movimentadas estradas, cheias de navios, estradas que levavam borracha e castanha, para o Mundo, e traziam mercadorias e pessoas, na sua maior parte desarvoradas, sem saber o que lhes iria acontecer, no trabalho estafante, duro e miserável, nos seringais.

Até que essas terras chegassem ao que elas hoje são, devorariam dezenas de milhares de emigrantes de todas as origens e as suas primícias,

que hoje dormem em cada barranco, em cada curva de rio.

O rio trazia pessoas, mas poucas voltavam por eles.

Fim de viagem.JPG

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