Manaus, 21 de novembro de 2024

Histórias esquecidas

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O bombardeio por um erro de pontuação

Isto aconteceu em outubro de 1910, quando se delineava a luta eleitoral para a Presidência da República, tendo de um lado Rui Barbosa, representando os civilistas, e do outro, o marechal Hermes da Fonseca, os militaristas.

Tomei conhecimento dela quando minha avó contou-me que a sua família que morava na Rua Leovigildo Coelho, foi obrigada a fugir a pé, para a região da Colônia Oliveira Machado, a fim de se livrar do bombardeamento.

Depois melhorei o texto acrescentando datas e dados históricos.

No dia 7 de outubro, em Manaus, estava programada a festividade de recepção do deputado Monteiro de Souza, e não houvera quórum para a realização da sessão da Assembleia Legislativa.

Dos dezenove deputados, doze haviam ido receber aquele político, no Rodway.

Apesar deste fato, sob a coordenação do vice-governador Sá Peixoto, fora forjada uma Ata e votado o impedimento do governador Antonio Bittencourt, com algumas assinaturas da oposição e outras obtidas por violência.

O golpe estava em andamento desde as 15 horas, quando Sá Peixoto solicitara às forças federais, aqui estacionadas, comandadas pelo general Pantaleão Teles de Queiroz, comandante da 1ª Região Militar, e pelo capitão de corveta Francisco da Costa Mendes, comandante da Flotilha do Amazonas, munido da ata falsa, a intervenção federal, no Estado.

Às 22 horas, o governador foi informado do golpe, comunicando-o ao Presidente da República, e se dirigiu para o quartel da Polícia Militar, onde foi recebido pelo tenente-coronel Pedro José de Souza, pronto para defender a legalidade.

A Polícia Militar possuía 900 soldados compondo dois batalhões, um esquadrão de cavalaria e uma bateria de artilharia, sendo comandada pelo coronel Pedro Vidal de Negreiros.

As hostilidades começaram às cinco e meia da manhã, com os marinheiros atacando a guarda do Palácio, pelas ruas 7 de Setembro e Bernardo Ramos, sendo rechaçados.

Ao mesmo tempo a flotilha estacionada ao largo do rio Negro iniciara o bombardeio da cidade.

O governador enviou telegramas ao Presidente da República, aos Governadores Estaduais e à Imprensa do Rio de Janeiro, denunciando o atentado e informando a sua intenção de resistir.

Às oito horas recebeu um ultimato do general Pantaleão de que estava destituído e deveria entregar o cargo ao vice-governador.

Foram distribuídos panfletos por ambos os lados, tentando esclarecer os acontecimentos.

O panfleto das tropas federais dizia:

AVISO À POPULAÇÃO

Insistindo o Governador do Estado em não passar o exercício ao seu substituto legal, depois de ter perdido o mandato, em virtude do disposto no artigo 43 da Constituição, conforme reconheceu o congresso do Estado, as forças de terra e mar, solicitadas pelo Vice-Governador em exercício, avisam à população que vão bombardear a cidade a partir de uma hora da tarde, a fim de que todos tomem as devidas precauções para a garantia e segurança de suas vidas. a) Antônio Gonçalves P. Sá Peixoto, Vice-Governador, em exercício; Coronel Pantaleão Teles de Queiroz, comandante da 1ª Região Militar e Francisco C. Mendes, Comandante da Flotilha”.

O Governo estadual, por outro lado, concitava a população nos seguintes termos:

POVO AMAZONENSE!

“As nossas liberdades estão perigando”!

Os grandes interesses do Estado sacrificados à sanha gananciosa de um grupo de despeitados prestigiados pela força. É necessário reagir quanto antes em defesa desses direitos periclitantes.

O Governo do benemérito Coronel Antônio Bittencourt confia e espera na solidariedade do povo amazonense. Cada cidadão deve ser um defensor desse governo de honestidade.

Às armas, povo amazonense!

“No Quartel da Polícia há armamento para a defesa do Governo”.

Centenas de civis apresentaram-se ao Quartel da Polícia Militar em apoio ao Governo. Milhares de civis, mulheres e crianças deslocaram-se para os extremos da cidade, para fugirem ao canhoneio, que demorou horas.

Fez grandes estragos sobre os prédios da Praça dos Remédios na linha reta até o Hospital da Beneficente Portuguesa, que sofreu vários impactos, pois havia o intuito de atingir a residência do governador à Rua Miranda Leão. Muitos cidadãos mortos, mas a Polícia Militar sofreu poucas baixas, o mesmo não se dando entre os efetivos do 46º Batalhão do Exército e alguns marinheiros desembarcados.

Os cônsules da Alemanha, Inglaterra, Portugal, França, Itália e Paraguai e os Diretores da Associação Comercial, visando à cessação das hostilidades, conseguiram a renúncia de Bittencourt.

Às 17:00 horas, ele mandou que a Polícia Militar se recolhesse ao Quartel, embora o bombardeio continuasse.

No dia 10, Bittencourt foi preso e levado à Polícia Civil, por 50 soldados, sendo, no caminho, aclamado pelo povo.

Conduzido à residência de Sá Peixoto, ali se extorquiu a sua renúncia. Adiantou sua viagem para o mesmo dia, pelo vapor Bahia, pois fora avisado de que iriam assassiná-lo.

O Ministro da Guerra General Borman determinou ao Coronel Pantaleão que se recolhesse preso ao Rio de Janeiro, tendo em vista o uso indevido que fez do nome do Presidente, bem como por haver aceitado requisição de tropas, sem autorização superior. O Comandante da Flotilha recebeu telegrama de igual teor e Sá Peixoto foi cientificado de que a União não lhe daria apoio, devendo restituir o cargo.

A 14 de outubro, em Belém, Bittencourt recebia a confirmação de que o Governo Federal iria reintegra-lo. De imediato regressou a Manaus, onde foi reempossado a 31, daquele mesmo mês.

O seu primeiro cuidado foi o de mandar instalar uma comissão destinada a apurar a veracidade dos fatos culminados com a sua deposição e cujo relatório mostrou que a sessão legislativa de 7 de outubro não se realizara por falta de quorum. Das onze assinaturas da ata, somente quatro eram verdadeiras. Àquela sessão haviam comparecido nove deputados, que logo se retiraram.

O Coronel Antônio Francisco Monteiro, Presidente do Congresso, fora levado, às 02h30min horas do dia 8 de outubro, pelos deputados Castela Simões e Telésforo de Almeida, para um dos navios de guerra, em frente àcidade, onde foi obrigado a assinar a ata, na presença de Sá Peixoto.

A deposição do Governador fora planejada por Sá Peixoto, Silvério Nery, Porfírio Nogueira e pelos deputados Castela Simões, Adolfo José Moreira, Domingos de Andrade, Hildebrando Luiz Antony, Joaquim Cardoso de Farias e José Duarte Sobrinho.

Conta-se que o Comandante da Flotilha fizera uma consulta sobre o bombardeio e recebera um telegrama vazado nos seguintes termos “NÃO TENHA PRUDÊNCIA”, e que mais tarde justificou-se haver sido recebido com o esquecimento de um ponto ou de uma vírgula, após a palavra NÃO.

Na realidade o bombardeio de Manaus teria relação com idêntico atentado sofrido pela cidade de Salvador, da responsabilidade de facções político-militares, que apoiavam a candidatura do Marechal Hermes da Fonseca, para a Presidência, sob as ordens do senador Pinheiro Machado, sendo Rui Barbosao candidato civil da oposição.

O mesmo ocorreria com a cidade de Sena Madureira, bombardeada pela canhoneira Missões.

*Historiador. Membro das Academias Amazonense de Medicina e de Letras, e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas.

 

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