Manaus, 28 de novembro de 2023

Macunaíma

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No livro “Macunaíma, o herói sem nenhum caráter”, seu autor – Mario de Andrade – escreveu no Prefácio datado de 19 de dezembro de 1926: “o brasileiro não tem nenhum caráter”. Para complementar essa assertiva diz que a “palavra caráter não traz uma determinação apenas de realidade moral, incorporando a entidade psíquica permanente que se manifesta nos costumes, na ação exterior, no sentimento, na língua, na história, na andadura, tanto no bem como no mal”. Adicionalmente afirma que o brasileiro não tem caráter porque não possui nem civilização própria nem consciência tradicional e faz referência à nossa honradez elástica, ao desapreço à cultura verdadeira, ao improviso, à falta de senso étnico nas famílias.

 

A INSPIRAÇÃO

Mario de Andrade diz ter encontrado Macunaíma em Theodor Koch-Grünberg um etnólogo alemão que viveu na Amazônia e escreveu várias obras entre as quais “De Roraima ao Orinoco” cuja publicação recebeu anotações marginais feitas a lápis. A obra de Koch-Grünberg, somada à de Nunes Pereira – “Moronguetá: um decameron indígena” – constituem o cerne de um acervo de valor inigualável e inestimável para a antropologia e etnografia regional.

 

KOCH-GRÜNBERG 

Segundo Renan Freitas Pinto, Theodor Koch-Grünberg nasceu em 09 de abril de 1872, na localidade de Grünberg, em Hesse (Alemanha), incorporando à sua identidade civil o nome de sua terra natal. Doutorou-se em 1902 e no ano seguinte já estava entre os índios da Amazônia onde descreveu, fotografou e filmou muitas tribos espalhadas, principalmente, pela porção setentrional da região. Morreu em uma localidade chamada Vista Alegre, em Roraima e seu túmulo, segundo Paulo de Almeida Machado está em Caracaraí (RR). Quando fui diretor do Inpa tentei trazer seus restos mortais para um mausoléu a ser construído no campus, onde seriam depositados junto com outros cientistas que aqui morreram, mas os pterossauros do Instituto (precursores dos Macunaímas atuais), fizeram forte oposição alegando, inclusive de forma ridícula, que os fantasmas poderiam rondar o campus e atemorizar as pessoas.

 

MACUNAÍMA ATUAIS

Uso esse introito científico-literário para refletir sobre a falta de caráter dos brasileiros atuais que foram premonitoriamente descritos por Mario de Andrade na figura de Macunaíma, um livro com muitas edições entre as quais uma ilustrada por Rita Loureiro que espero um dia adquirir.

A história de Macunaíma é um desenrolar de atos marcados pela falta de caráter, uma característica que foi copiada, exacerbada e transferida pelos pterossauros para todos os cenários e camadas da sociedade brasileira atual. Se Macunaíma vivesse nos dias atuais, sentiria vergonha de sua inocência, de sua quase donzelice, da incapacidade de atingir os graus maus altos do mau-caratismo que domina a postura e compostura de parte considerável dos homens e mulheres deste país canalha.

Os exemplos são muitos e hoje cito, como emblemas desse estágio de degradação, o roubo de dinheiro público feito por servidores municipais de São Paulo e afirmo que esses bandidos além de não serem condenados também não vão sentir remorso por terem roubado quase meio bilhão de reais para proveito próprio deixando em condições de maior penúria a população mais pobre. O outro exemplo vem do Rio Grande do Sul onde uma quadrilha foi presa no município de Três de Maio pelo crime de adulterar leite com formol, água oxigenada e soda cáustica(!!), além de aumentar o volume com água (que tipo?), colocando em situação de risco de vida milhões de pessoas.

O lado honesto da população brasileira precisa, urgentemente, se rebelar e destruir esse modelo de governo que abençoa a falta de caráter e a base teórico-filosófica desse movimento deve ser o conjunto dos ensinamentos transmitidos por Jean-Jacques-Rousseau no livro “O contrato social”. Como pequena amostra dessas lições registro que Rousseau entende a expressão “cidadão” como uma manifestação de direito e virtude, ultrapassando a definição simplória apenas destinada aos que moram na cidade. Outra lição essencial e muito atual, diz que a igualdade ilusória alardeada pelos Estados só serve para manter o pobre na sua miséria e o rico na sua usurpação (Ele preconizava o programa bolsa esmola). E por último, para a finalidade deste texto, Rousseau diz que: “todo malfeitor, atacado o direito social, converte-se pelas suas façanhas, em rebelde e traidor da pátria, cessa de ser membro dela ao viciar suas leis e ao fazer-lhe guerra” E prossegue: “[…] reconhecido como tal, deve ser […] afastado pelo desterro, como infrator do pacto, ou pela morte, como inimigo público […]”. Alguém tem outra solução de curto prazo?

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