Manaus, 27 de julho de 2024

Não mudou muito

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O ano de 1910 é o marco cronológico mais avassalador da nossa história, pois simboliza o fim do ciclo econômico assentado quase exclusivamente na explotação do látex nativo coletado nas árvores dispersas nas florestas dos seringais. A debacle da borracha que levou o Amazonas à falência econômica e à ruína social, política e moral teve duas causas principais e uma só raiz: As causas foram os custos operacionais da borracha amazônica e a produção dos seringais racionais nas Colônias Inglesas da Ásia; a raiz foi a falta de saberes e de perspicácia dos “donos do poder” que não viram o interesse de empresas europeias pelos plantios de seringueira no Oriente, incentivadas pelo lucro, pela imprensa inglesa e até mesmo por um representante diplomático inglês que, em 1909, no Rio de Janeiro, escreveu um relatório sugerindo aos patrícios com capitais disponíveis, “a fugirem do Amazonas, como se foge da cólera”.

 

O QUE TINHA E O QUE FICOU

A estrutura urbana montada pelos ingleses em Manaus encheu de ufanismo a “elite” local incapaz de entender que o modelo de explotação da borracha imposto pela indústria europeia era do tipo “barata voa” e que qualquer risco econômico faria todo mundo voar para outras plagas. E foi o que aconteceu quando o lucro ficou ameaçado e os “colonizadores” abandonaram a Amazônia, não sem antes receberem gordas indenizações pelas benfeitorias feitas com nossa riqueza. A “herança” tinha nomes que sequer foram abrasileirados, como se faz hoje no PIM e, entre outros, registro: Amazon Telegraph Company, Booth Steamship, Amazon Steamship Navigation, Manaos Harbour, Manaos Improvement, Manaos Markets and Slaughterhouse, Manaos Railway, Manaos Tramways and Light, Manaos Eletric Lighting.

Tínhamos dinheiro, fausto, muitas futilidades, mas perdemos a galinha dos ovos de ouro e ficamos com pobreza e sofrimento.

 

A FALÊNCIA ECONÔMICA E A RUINA MORAL

A borracha, que chegou a representar quase 50% das exportações brasileiras, deixou de proporcionar riqueza, empregos, futilidades, criando sofrimento na capital e exacerbando o sofrimento no hinterland. Em Manaus nem os prédios monumentais escaparam do abandono e, no livro “O amante das Amazonas”, o escritor amazonense Rogel Samuel diz que o Teatro Amazonas, em 1912, foi esvaziado (saqueado?) e transformado “em depósito de borracha de uma firma americana”. (Ficção ou realidade ?).

 

AMAZONAS x GOVERNO CENTRAL

Os danos imateriais não podem ser quantificados embora tenham sido qualificados como ruína moral. Os prejuízos financeiros se refletiram na contabilidade do poder central que analisando o conjunto dos desastres criou forte animosidade contra o Amazonas chegando ao ponto do Presidente da República Affonso Augusto Moreira Penna escrever em uma Mensagem, presidencial: “é preciso corrigir os excessos do Amazonas, conserval-o sob tutela, humilhal-o, estinhar o seu erário […]”.

Os empresários da hinterlândia foram os que mais acumularam prejuízos e, sem perspectivas de solução, em 21/08/1939, enviaram um documento ao presidente Getúlio Vargas, intitulado “Manifesto dos coronéis de barranco no tempo das vacas magras” no qual pediam melhorias nas condições de vida do interior e reivindicaram diminuição dos altos impostos pagos por quem produzia e era responsável pela manutenção da Amazônia sob a tutela da soberania nacional.

Nesses 75 anos (1939-2014) pouca coisa mudou, incluindo a animosidade do governo federal contra o Estado do Amazonas. Naquela época o problema era a perda da receita das exportações e hoje o motivo é a pressão do empresariado do sudeste contra a Zona Franca, um modelo que precisa ser modificado, mas que não pode ser extinto rapidamente. Para mim, a diferença entre o presidente Affonso Penna e a dupla Dilma/Lula é que o velho presidente teve coragem suficiente para expressar o que pensava enquanto a dupla atual age sub-repticiamente, fazendo exatamente a mesma coisa, isto é, querendo “corrigir nossos excessos” (industriais), “conservar-nos sob tutela” (fiscal), “humilhar-nos” (parlamentares submissos) e estinhar (sugar) nosso erário. O pior é que essa animosidade se exacerba por conta de uma popularmente festejada aliança entre o governador (de partido da base aliada) e o prefeito (oposição) o que sinaliza uma ameaça eleitoral ao lulismo, ainda que localizada. O ano eleitoral de 2014 pode ser catastrófico como 1910, pois o Amazonas, em 2012, tinha apenas 2.164.620 eleitores enquanto São Paulo listava 31.253.317 votantes.

Não sou historiador, mas cultivo nossa história, porque sei que povo sem passado é povo sem futuro.

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