Hoje voltei ao jardim,
ao que restou do jardim
que fora teu santuário.
Olha: foram dolorosas
as recordações das rosas,
que as tinha sempre formosas
em tão belo relicário.
Mãe: senti no coração
tanta dor, tal comoção
e tão intenso desgosto
que, cheio de pasmo e espanto,
refugiei-me num canto
pensando esconder o pranto
que escorria do meu rosto.
Nem um só cravo ou begônia,
um simples cróton – vergonha!
– ou angélica, ou bem-me-quer;
nem a suave verbena,
mesmo uma rosa pequena,
um lírio ou uma açucena,
Nem uma dália sequer.
E os crisântemos doirados,
os bogaris perfumados,
girassol e margarida,
as papoilas, laranjinha,
os jasmins que tantos tinha,
nove-horas, a flor rainha…
morreram por ti, querida.
A bela-da-noite, a zina,
cana-da-índia, a cravina,
igualmente – que maldade!
– Sabe Lídia; eu tenho medo,
vou revelar-te um segredo:
cuidar Dele? – sou um aedo,
só sei cuidar de saudade…
Refazer o teu jardim?
não posso, Mãe, – ai de mim –
como iria, enfim, fazê-lo?
Sem o teu olhar maternal,
sem tuas mãos, sem igual,
como fazer, afinal?
Não posso – falta o teu zelo.
Mãe, sabe o que vou fazer,
já que não posso esquecer
teu sonho que vive em mim?
Em volta do teu solar
vou replantar o pomar
onde sempre ias orar
após saudar teu jardim.
E quanto o tempo chegar
do cacau, caju, da ingá,
da graviola e mamão…
em vez de flores, querida,
terás a mesa sortida
com tantas frutas de vida,
ao centro teu coração!
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Uma resposta
Almir Diniz, dotado de uma cadencia métrica de fazer inveja ao músico mais experiente, constrói um dos seus poemas mais belos. Que só a experiencia de um poeta decano seria capaz. Com versatilidade e leveza remota um pouco da saudade e da beleza molda o poeta.
“…sou um aedo,
só sei cuidar de saudade…”
Almir Diniz