Homenagem a dom Jorge Eduardo Marskell, saudoso bispo da Prelazia de Itacoatiara, que, se estivesse entre nós, no dia 08 de novembro de 2015 teria completado 80 anos de idade.
O sacerdote canadense Jorge Marskell foi uma figura emblemática, um homem muito especial. No tempo em que prestou serviços à Prelazia de Itacoatiara, além de portar-se como um defensor da paz, distribuiu esperanças e sustentou a fé junto aos seus irmãos de caminhada. Foram trinta e oito anos (1960-1998) servindo ao povo de Deus, sem medir esforços, distribuindo alegria, amor e dignidade. Sem dúvida, um exemplar servo de Deus que possuía a crença arraigada de atenção às boas causas, às coisas santas, às quais se doou com intensidade, carinho e especial devotamento. Quando partiu desta para outra vida, deixou milhares de católicos chorosos e uma incontável legião de amigos com o coração apertado, repleto de saudades.
Jorge nasceu em Hamilton, cidade canadense da Província de Ontário, aos 08/11/1935, e ordenou-se padre da Congregação de Scarboro em 21/08/1960. Menos de dois anos depois (julho de 1962) veio trabalhar em Itacoatiara – nem bem completara 26 anos de idade!
Quando chegou, integrando uma comitiva liderada pelo padre Francisco Paulo Mc-Hugh, mal falava o nosso idioma. Antes, passara três meses em Brasília fazendo um curso intensivo de Língua Portuguesa, onde pouco aprendeu. Fazia questão de dizer que aprendeu realmente a falar o nosso idioma com os meninos que o cercavam toda a vez que passava da Casa Paroquial à Igreja Matriz e vice-versa.
Eu era um daqueles meninos. Tinha pouco mais de 16 anos! E logo nos tornamos grandes amigos!
Jorge nasceu no dia 08 de novembro; eu, no dia 24 do mesmo mês. Ele era de 1935 e eu sou de 1945. No ano passado (2015) comemorei meus 70 anos; se ele ainda estivesse conosco teria feito 80. Este artigo tem o condão de relembrar os principais fatos da trajetória do bom amigo Jorge, do ‘mano Jorge’, como gostava que o chamassem. São trechos do Capítulo nº 6 do livro “A Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Itacoatiara” – que lancei na Catedral de Itacoatiara logo em seguida à sua morte, coincidindo com os 240 anos da criação – em 1759 – da antiga Paróquia da Vila de Serpa. A feitura desse livro atendeu a um pedido que Jorge me fizera cinco anos antes!
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A teologia cristã na América Latina durante séculos esteve adormecida. O continente contentou-se em importar as principais correntes do pensamento religioso europeu e norte-americano.
Entretanto, os documentos oriundos do segundo Concílio Vaticano e suas encíclicas agiram como fermento no meio dos principais vultos do catolicismo latino-americano. A partir da conferência dos bispos de Medellin, na Colômbia, em 1968, apareceram movimentos radicais optando por participação aberta em missões reivindicatórias, tanto políticas como sociais, na direção do mundo. Desde então, as tendências teológicas dominantes no catolicismo contemporâneo latino-americano correspondem aos anseios do papado moderno de fazer da Igreja uma comunidade a serviço da justiça social e da paz no mundo.
A despeito da implantação no Brasil do golpe militar de 1964, que agrediu os direitos humanos e trouxe perdas às liberdades democráticas, os anos sessenta, tanto no aspecto religioso quanto no profano, foram particularmente generosos para o Município de Itacoatiara.
Assim é que, no início de julho de 1962, entra em operação o serviço telefônico urbano, a cargo da Companhia Telefônica da Amazônia S..A.. Em 31 de julho o arcebispo de Manaus, dom João de Souza Lima, nomeia, para exercer o ministério católico de Itacoatiara, o vigário padre Francisco Paulo Mc-Hugh e seus cooperadores padres Douglas Mackinnon, Vicente Daniel, Miguel O’Kane e Jorge Marskell. A seguir, em solenidade de 1º de agosto, presidida pelo próprio arcebispo metropolitano, o padre Alcides Peixoto e seu coadjutor padre Francisco da Silveira Pinto fazem entrega da Paróquia aos missionários canadenses. Na época, era prefeito municipal o senhor Acácio Soares de França Leite (1913-1982). Também nesse dia é fundado, no seio da Igreja Matriz, por uma plêiade de jovens da melhor formação moral e cristã, o Coral “Santa Cecília”. E em 27 de setembro, operando em ondas médias, é instalada a Rádio Difusora de Itacoatiara, uma iniciativa do jornalista Josué Cláudio de Souza (1910-1992).
Antes de assumir a Paróquia de Itacoatiara, o grupo de padres canadenses, liderado por seu superior, Francisco Paulo Mc-Hugh, esteve cerca de três meses em Brasília, aprendendo a língua portuguesa.
Através da bula de 13 de julho de 1963, firmada pelo papa Paulo VI, é criada a Prelazia Nullius de Itacoatiara. Com sede na Paróquia de Nossa Senhora do Rosário e limitando-se com a Arquidiocese de Manaus, a Diocese de Roraima e as prelazias de Parintins e Borba, a nova Diocese em formação vinha jurisdicionar, além do de Itacoatiara, os municípios de Itapeaçu (*), Silves, Itapiranga, São Sebastião do Uatumã, Urucará e Urucurituba – abrangendo uma área aproximada de 92.000 k2.
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(*) Mais tarde extinto, o Município de Itapeaçu foi reintegrado ao de Urucurituba, donde havia sido desmembrado. Integram hoje a Prelazia, além dos já citados, também os municípios de Presidente Figueiredo e Rio Preto da Eva, este parcialmente assumido pelo Arcebispado de Manaus.
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Com a criação da Prelazia, o serviço pastoral, antes restrito à Paróquia de Itacoatiara, e, portanto, ao território deste Município, foi ampliado às unidades municipais vizinhas (na verdade, estas sempre foram influenciadas por Itacoatiara). Então, os primeiros missionários canadenses iniciaram a trabalhar em três comunidades de Itacoatiara: Nossa Senhora do Rosário, Divino Espírito Santo e Nossa Senhora de Nazaré; e em sete do interior: Nossa Senhora da Conceição (em Silves), Nossa Senhora de Nazaré (em Itapiranga), Sant’Ana (em Urucará), São José (em Urucurituba), São Sebastião (em São Sebastião do Uatumã), além de Paraná da Eva e Arari – zona rural de Itacoatiara. (*)
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(*) A sociedade dos padres canadenses (Scarboro Foreign Mission Society – SFM) ainda experimentou, em 1966, um trabalho missionário na Paróquia São Francisco e nas capelas de Petrópolis e Raiz, bairros periféricos da cidade de Manaus (cf. Arquivo da Prelazia).
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No dia 24 de agosto de 1963, dom João de Souza Lima é designado administrador apostólico da Prelazia. Mediante autorização do núncio apostólico do Brasil, dom Armando Lombardi, a instalação da Prelazia e a posse do administrador ocorrem em 19 de março de 1964, possibilitando, a partir daí, maior dinamismo à atuação pastoral da antiga Paróquia. Nesse mesmo ano, chegados a 04 de março , integram-se à equipe paroquial os também padres canadenses Guilherme Smith e Patrício Ryan.
Em dezembro de 1964, atendendo a um pedido de dom João de Souza Lima, dá-se a chegada das irmãs Adoradoras do Sangue de Cristo. Vinham tomar posse da escola paroquial mista e do colégio feminino Instituto Nossa Senhora do Rosário de Fátima, substituindo às freiras da congregação de Santa Doroteia.
Primeiramente, para verificar o novo lugar de apostolado, acompanhada de irmã Doroteia Nery, veio a madre superiora provincial Vivian Miller. Ainda encontraram aqui as irmãs Doroteia que, identificadas por seu hábito negro, durante doze anos seguidos dirigiram a educação feminina local, no curso primário e no ginásio normal por elas iniciado, mantendo inclusive um internato. A chave do colégio lhes foi entregue pela quarta e última superiora Doroteia, madre Odisseia Damasceno.
A administração das irmãs Doroteia foi encerrada por orientação do vigário recém-empossado, padre Francisco Paulo Mc-Hugh, desejoso de instalar na Paróquia um colégio misto. Como as normas dessa congregação não admitiam ministrar educação a moças e rapazes, o colégio de Itacoatiara foi entregue às irmãs Adoradoras do Sangue de Cristo, identificadas por seu hábito branco.
Em fins de janeiro de 1965, para efetuar os exames de admissão ao ginásio, chegaram as irmãs Ancilla Silva, Maria do Socorro de Oliveira e Berenice da Silva. No dia 12 de fevereiro, a fim de assumir finalmente seus encargos apostólicos, veio toda a comunidade das Adoradoras: além das já mencionadas, a irmã Joana D’Ângelo, a irmã Maria Lídia Guedes, a irmã Anunciata Souza e a irmã Otávia dos Santos. Impossibilitada de vir, a superiora designada, irmã Ancilla Silva, foi substituída por irmã Gertrudes Menezes.
Em 20 de julho de 1965 chegam mais dois integrantes da equipe canadense, os padres Justino e Raimundo O’Tole. E no dia 24, através de um telegrama procedente da Arquidiocese de Manaus, o mundo católico local recebe a notícia de que o padre Francisco Paulo Mc-Hugh fora designado prelado de Itacoatiara.
A solenidade de posse do novo chefe da Prelazia ocorreu no dia 30 de agosto de 1965. Nesse dia, às 18 horas, realizou-se uma missa concelebrada por dezenas de sacerdotes oriundos do Canadá, da Guiana, de Manaus e municípios vizinhos. O altar erigido em plena praça da Matriz estava artisticamente ornamentado. O presidente da cerimônia, dom João de Souza Lima, leu o mandato apostólico constituindo oficialmente Francisco Paulo Mc-Hugh como prelado de Itacoatiara. Em seguida, foi entregue ao empossado a cruz peitoral e o anel, símbolos de salvação que vem de Jesus e de união aos fiéis de sua Prelazia. Na última parte da cerimônia o novo prelado recebeu a mitra e o báculo, símbolos de seu poder sobre o rebanho católico, sendo afinal entronizado na cadeira prelacial.
A programação oficial de instalação fazia questão de esclarecer que “padre Paulo, nosso prelado, é o Pai e Pastor de todos os fiéis da Prelazia de Itacoatiara. Mesmo não sendo bispo, ele tem todos os poderes e graças de que precisa para guiar e ensinar o povo de Deus. Ele é o representante especial de Cristo na Prelazia. Ele representa ainda, oficialmente, o Santo Padre, o Papa. Que Nosso Senhor abençoe nosso Chefe espiritual e lhe dê longa vida, e faça com que sejamos sempre seus filhos leais”.
O Coral “Santa Cecília” deixou sua marca na cerimônia de posse do prelado Francisco Paulo Mc-Hugh. Segundo noticiou um jornal da época, “durante mais de duas horas, naquele dia 30 de agosto de 1965, a equipe (do coral) atuou maravilhosamente, deixando a melhor impressão, sobretudo a quantos já conheciam outros grupos da mesma espécie pelo resto do país. Em nenhum instante seus membros vacilaram. Em nenhum instante a indisciplina rítmica perturbou a expressão musical e as suas relações com o tempo. Os hinos sacros encheram a praça e ganharam, no silêncio dos observadores, os mais rasgados elogios”.
A noite foi oferecido um jantar às autoridades civis e religiosas que se fizeram presentes à cerimônia. E, finalmente, segundo o diário das irmãs Adoradoras do Sangue de Cristo, “Ainda festejando a instalação de dom Paulo, foi oferecida em sua homenagem uma grande festa teatral, que se realizou no galpão do Colégio Nossa Senhora do Rosário de Fátima; esta festa consistiu de mais ou menos quinze números apresentados pelas várias associações da Paróquia”.
Por ocasião da pose do prelado Francisco Paulo Mc-Hugh, oito religiosas já compunha a comunidade local das irmãs Adoradoras do Sangue de Cristo, superintendida por irmã Gertrudes Menezes (depois Marília Menezes). Além do trabalho educativo, elas também se empenham nos serviços de preparação de jovens à primeira comunhão e à crisma, de auxílio aos catequistas do interior, de programas de rádio, de orientação à Juventude Estudantil Católica (JEC), em visitas a prisioneiros na cadeia local e às casas de prostitutas. No início de 1965, respaldadas no exemplo das Adoradoras de Cristo, cinco moças de Itacoatiara já se ofereciam ao trabalho vocacional: duas ao Apostolado e três ao Aspirantado.
Em 05 de setembro de 1965, concretizando um antigo sonho comunitário de efetivar a integração das duas principais cidades amazonenses, é aberta ao tráfego de veículos a rodovia Manaus-Itacoatiara. No dia 12, dezenas de pessoas, inclusive religiosas do Colégio Normal, partiram com destino a Manaus, compondo a chamada “Caravana da Gratidão” pela estrada de rodagem recém-inaugurada.
Ainda em 1965: dia 05 de setembro, as irmãs canadenses da Ordem de São José chegam e assumem a direção da Maternidade “Senador Cunha Melo”. Moram no convento “São José”, prédio de dois pavimentos situado defronte à maternidade, construído em tempo recorde pela Prelazia com verbas arrecadas no exterior. Tanto bem essas religiosas fizeram à cidade: irmãs Inês, Francisca, Maria Tereza, Jane, Carolina, Lúcia, Joana, Tomásia Alice Geneau e Margarida Harris; dia 03 de outubro, padre Jorge Marskell toma posse como vigário da Paróquia; dia 29 de outubro, criada a unidade de ensino de grau colegial denominada Colégio Normal Nossa Senhora do Rosário de Fátima, ocupando-se da formação de professores normalistas de primeiro grau.
Aliás, o curso pedagógico instalou-se em princípios de 1966, graças unicamente aos esforços da Prelazia. Não obstante a Lei estadual nº 318, de 29 de outubro de 1965, fixasse normas para a instalação do curso pela Secretaria Estadual de Educação, tal não ocorreu. Portanto, não fora a dedicação da Igreja, a mocidade local por alguns anos ainda teria que se contentar com o curso ginasial pura e simplesmente.
À frente da Vigararia da Paróquia de Itacoatiara, padre Jorge Marskell mudou a posição da imagem de Nossa Senhora do Rosário, retirando-a do centro do altar principal da Matriz e substituindo-a pela imagem do Cristo Crucificado. A providência foi tomada, segundo o vigário, “porque, sendo rei e figura principal do catolicismo, Jesus tinha que estar no centro da Igreja”: urgia restituir-Lhe o lugar central na devoção. Esse fato causou perplexidade e uma certa revolta entre os membros da comunidade. Mas, a atuação de padre Jorge nessa direção decorria da necessidade das paróquias do mundo inteiro se adaptarem às orientações emanadas do Concílio Vaticano II.
Muito generalizado na Igreja latina, o marianismo sofrera um grande desenvolvimento e não estava isento de certas distorções. A superveneração de Nossa Senhora corria o risco de desviar as atenções do Cristo e do culto essencial da Eucaristia. O assunto provocou uma das maiores tensões do Concílio Vaticano II, a ponto de os bispos sentirem a necessidade de uma revisão. O conclave se manifestou na sessão de 19 de outubro de 1963, onde se votou a integração de Maria no esquema da Igreja: os votos de aprovação foram 1.114 e os de não aprovação, 1.074. A opção do Concílio é da maior importância e valeu como uma espécie de restauração da devoção mariana no que ela tem de mais puro e mais autêntico.
Fixava-se a crença de que é mais harmonioso chegar-se ao Filho, palmilhando os caminhos iluminados pelo amor de mãe. Maria, genitora de Cristo, fora proclamada mãe de todos os homens, sentimento assimilado pelo povo de Deus em todos os tempos.
A propósito, ainda perdura a dúvida se a imagem de Nossa Senhora do Rosário exposta no altar-mor da nossa Matriz é a mesma escultura barroco-clássica trazida para inaugurar a Paróquia, em 1759. As estátuas católicas eram instrumentos de arte feitos para exemplificar o culto da Santa Virgem. Moldada em papelão, a estátua da padroeira de Itacoatiara foi retocada a gesso e pintada por santeiros de Portugal nos meados do século XVIII. (*) Segundo versão corrente, acerca de quatro ou cinco décadas atrás, essa imagem foi levada a Belém para receber nova encarnação.
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(*) Nesse caso, eu me equivocara em parte. A estátua da Santa Padroeira de Itacoatiara é realmente originária de Portugal. Data do século XVIII, mas não é uma escultura em papelão forrada a gesso. É de cedro. Tais verdades aparecerão com mais detalhes no livro que pretendo lançar brevemente, intitulado “As pedras do Rosário”. Aguardem.
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No dia 07 de setembro de 1966, como reflexo da ditadura militar de 1964, é decretada intervenção federal no Município de Itacoatiara, assumindo o interventor Armindo Magalhães Auzier (1898-1976). No ano anterior, dois vereadores da oposição local, taxados de subversivos e “inimigos do regime”, haviam sido recolhidos à prisão no quartel do Exército, em Manaus. (*)
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(*) Tratavam-se dos vereadores do antigo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Paulo Pedraça Sampaio e Argos do Amaral Valente. O primeiro, hoje com 91 anos, mora em Manaus. Infelizmente, acometido de uma doença gravíssima, vive em estado vegetativo recebendo a atenção e o carinho de seus familiares. E o segundo já é falecido.
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Em 28 de fevereiro de 1967 é instalada a Zona Franca de Manaus, instrumento de política oficial que, à guisa de desenvolver a Amazônia Ocidental, concentrou em Manaus a maior parte da atividade econômica e deixou o interior amazonense decadente, com uma economia anacrônica e inviável. Ainda, nesse período, começam a ser introduzidos na região diversos projetos agropecuários cobertos por incentivos fiscais.
Em 20 de julho de 1967, dom Francisco Paulo MC-Hugh é nomeado bispo prelado de Itacoatiara. (*) Nesse ano é iniciada a construção do Centro de Treinamento da Prelazia (CENTREPI) que, inaugurado no ano seguinte, vai oportunizar a realização de seguidos encontros e reuniões, envolvendo sacerdotes, freiras e leigos em torno do estudo e da discussão da problemática eclesial de base.
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(*) Dom Francisco Paulo Mc-Hugh (1924-2003). Segundo o livro “Igreja no Brasil, Diretório Litúrgico – 1998, CNBB”, sua eleição episcopal teria ocorrido em 14/08/1967 e não em 20/07/1967.
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A sagração do bispo dom Francisco Paulo Mc-Hugh aconteceu na tarde do dia 03 de outubro de 1967. A cerimônia, a que compareceram sacerdotes, freiras e leigos do Amazonas e de várias partes do Brasil e do mundo, contou com a mesma pompa e formalidades de sua posse como prelado, em 1965.
Homem sereno e tolerante, dotado de formação extremamente conservadora, desde sua primeira assunção à prelatura de Itacoatiara, dom Francisco Paulo Mc-Hugh foi fortemente influenciado pelas contingências políticas e sociais naquele momento vividas pelo Brasil. Nascido em 21 de agosto de 1924 e, portanto, mais avançado em idade que seus companheiros de jornada, colocou a Prelazia dentro dum sistema de necessidades e destacou a sua função integradora. Nesse sentido, parecendo não acreditar que algum dia vicejasse no Amazonas a pastoral participativa, procurou manter em funcionamento a teologia de retaguarda copiada dos Estados Unidos e da Europa. (*) Na verdade, o prelado canadense agia impulsionado pelo interesse de suprir as necessidades básicas da população, daí oferecer a seu rebanho os meios sociais e morais de integração.
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(*) No modesto entendimento do Autor, o pensamento conservador de dom Francisco Paulo Mc-Hugh não mais correspondia aos anseios da Igreja sul-americana. Sem demérito à sua postura de missionário dedicado, ele jamais simpatizou com os progressistas da Igreja Católica. A maior prova de que foi um adepto extremado da teologia defendida por correntes do pensamento europeu e norte-americano, que o Concílio Vaticano II felizmente mandou abjurar, é a coleção de livros escritos em inglês, tratando do assunto e trazida por ele, na esperança de influenciar seus colegas de clero. A obra foi acomodada em uma estante da Casa Paroquial e permanece intocável, até hoje, parecendo que jamais foi manuseada pelos padres da Prelazia. Também, dom Francisco Paulo era muito chegado às autoridades e convivia estreitamente com elas. Diferente de seu sucessor, o falecido dom Jorge Marskell, que, afastado do governo e contra o qual esteve em permanente conflito, conviveu mais estreitamente ligado às bases populares, aprendeu e adotou uma pastoral profundamente envolvida com os pobres e oprimidos.
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Embora descompromissado com a Igreja nova que vinha surgindo, dom Francisco Paulo Mc Hugh não perdeu a fé e abraçou a teologia da esperança, aquela em que Jesus Cristo não é apenas o salvador das almas, mas a força libertadora do homem na plenitude de sua vida social. Por isso, lutou com todas as forças para multiplicar o pão dos pobres e devolver a saúde aos doentes.
Realmente, o governo do primeiro bispo de Itacoatiara foi marcado pelo trabalho assistencialista. Além da pastoral evangélica propriamente dita, dispensou especial atenção aos menos favorecidos. Patrocinou a distribuição de materiais de vestuário e alimentos doados pelo organismo humanitário ligado ao governo norte-americano denominado Aliança Para o Progresso, celebrou convênios com o governo do Estado do Amazonas e prefeituras municipais para cuidar da educação e da saúde em todo o território da Prelazia e instalou o Centro de Treinamento Rural de Urucará – CETRUR.
Outro tento importante da gestão do bispo dom Francisco Paulo Mc-Hugh foi o ter orientado o nascente movimento cooperativista da região. Em 1967, durante três meses, sob a coordenação dos padres Miguel O’Kane e Luiz Hewer, foram realizadas diversas reuniões com produtores e trabalhadores rurais de Itacoatiara, repassando-se-lhes dados e informações com o objetivo, depois plenamente alcançado, de ser fundada a cooperativa agropecuária mista do Município.
Nesse ano de 1967, em substituição à irmã Gertrudes Menezes, foi elevada à direção da comunidade das Adoradoras do Sangue de Cristo a irmã Anette Ramos, enquanto que a coordenação do colégio ficava a cargo de irmã Maria Alice Vieira.
Em 1968 chegaram mais dois padres para compor a equipe canadense: Omar Dixon (*) e Bryan Manning. Nesse ano a cidade ganhou seu primeiro conjunto residencial construído com os benefícios do sistema financeiro nacional; 252 casas populares no bairro do Irary. Estimava-se a população municipal em 31.809 habitantes. Na área do ensino público, 146 professores, ministrando aulas para 4.896 alunos, compunham a rede do curso primário. Haviam dois ginásios com 660 alunos e 24 professores do curso secundário: a Escola Comercial de Itacoatiara, com 120 alunos e 14 professores, e a Escola Normal Rural Nossa Senhora do Rosário, com 50 alunos e 10 professores.
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(*) Padre Omar atuou em Itacoatiara e, sobretudo, em Itapiranga. Hoje, depois de 47 anos dedicados ao serviço da religião e do povo mais necessitado, já aposentado e doente, não trabalha mais em nenhuma paróquia. Mora pobremente em Itacoatiara, mas ainda reúne forças para contribuir com a Associação Dom Jorge Marskell, entidade sem fins lucrativos, inspirada na ação do saudoso apóstolo e guia espiritual. Criada acerca de 15 anos tem como objetivo principal: prestar serviços à população mais carente, promovendo a cultura, o acesso à informação e à cidadania.
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A impulsos da intolerância política que dominava certas autoridades da época, o I Encontro de Vereadores do Baixo e Médio Amazonas, sediado em Itacoatiara, aprovou moção de suspeição contra os missionários de Scarboro. Respondendo à altura as acusações, o vigário Jorge Marskell dirigiu carta aos congressistas, em 03 de agosto de 1968, narrando que padres e freiras canadenses estavam em Itacoatiara para “ajudar seus irmãos necessitados”… trabalhando “a serviço do povo de Deus, da Igreja que está no Amazonas” … pretendendo “somente uma coisa: continuar a obra de Cristo: salvar e não condenar, servir e não ser servido”.
Nesse mesmo ano haviam sido acelerados os trabalhos da equipe de catequese volante, na cidade e no interior; dado início à organização das mulheres e à criação dos postos de saúde comunitários. Continuava em funcionamento o movimento Fraternidade, envolvendo jovens comunitários: liderados pelo vigário padre Jorge Marskell, na festa da Paixão de Cristo fizeram a tradicional peregrinação, indo e retornando a pé, através da estrada Manaus-Itacoatiara, até o local escolhido para a pregação e recebimento do sacramento da Penitência. À sua vez, os alunos do colégio ajudavam nas quermesses, animavam as festas juninas com danças folclóricas próprias da época e com o preparo de comida típicas da região.
No dia 24 de setembro de 1968, padre Jorge Marskell, depois de designado para compor o conselho diretor da missão de Scarboro, partiu para o Canadá donde retornaria quase seis anos depois.
No período em que esteve ausente de Itacoatiara, padre Jorge passou a conviver com exilados brasileiros, refugiados naquele país em decorrência do Ato Institucional nº 5, e entre eles estava o sociólogo Herbert de Souza – o famoso Betinho (1936-1997), de quem se fez amigo. Por dominar a língua portuguesa, o ex-vigário da Prelazia de Itacoatiara foi designado para ciceronear o grupo de perseguidos políticos, situando-os bem na sociedade canadense. (*) As conversas entabuladas, as relações e o contato entre eles proporcionaram a padre Jorge Marskell um regular aprendizado da realidade do Brasil pós-1964.
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(*) Em Manaus, cursando a Faculdade de Direito, recebi várias cartas do meu amigo Jorge. Nelas, além de me informar sobre como repercutiam mal em seu País as notícias sobre a ditadura brasileira, dizia que tinha saudade do calor de Itacoatiara (já se desacostumara do frio do Canadá), da farinha e do peixe às refeições; que, em razão de repetidas leituras, já tinha de cor meu livro “Itacoatiara Roteiro de uma cidade”. Pedia notícias dos amigos; esperava logo voltar à nossa cidade; e numa das cartas me incentivou a escrever sobre a Prelazia.
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Em 23 de março de 1969, Itacoatiara recebeu a visita da superiora provincial das Adoradoras do Sangue de Cristo, irmã Vianey Schneider. Ao tempo, a comunidade dessas religiosas reunia localmente as irmãs Laetitia de Oliveira, Evelina Trindade, Maria do Rosário Barbosa, Lucinete Lima, Rosa de Lima, Felicitas Lopes e Emanuela de Souza.
Em 1970, sob a administração do vigário padre Miguel O’Kane, é reformado o prédio da Igreja Matriz. As telhas de sua cobertura original, de barro tipo marselheza, foram trocadas por telhas de fibrocimento da marca brasilit; ainda foi retocado reboco das paredes exteriores e realizada nova pintura nas partes interna e externa de todo o prédio.
Nesse período, em Itacoatiara, foram organizados os primeiros encontros eclesiais de base: movimento participativo de envergadura copiado do Vaticano II, que foi um grande concílio de renovação e atualização da Igreja Católica. Através dele, a Igreja proclama o homem participante do poder criador de Deus e por ele encarregado de utilizar as riquezas da terra e de transformá-la. O católico deverá participar da construção da sociedade e não viver alienado num mundo puramente espiritual. Assim é proposto o empenho na luta contra o egoísmo e as estruturas anticristãs da sociedade.
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