Sereno verde do dia
muito medo dos enganos,
meu limão, meu limoeiro,
tens cajila nos teus ramos.
Conheci toda uma casta
que temia mais que ao rei
os malefícios do verde
do limão com sua lei.
Nem amarrada e forçada,
corpo pronto para a vida,
sob os galhos do limoeiro
não passava a sua filha.
*
Meu limão, meu limoeiro,
fruta amarga preferida,
tempero de peixes frescos
para as comidas do dia.
No verão és a bebida,
matas a sede do sol,
deixas na lâmina branca
o teu gosto de metal.
Três gotas de sumo azedo,
adeus das doenças de sempre,
males que agem todo tempo
sob os pretextos da gripe.
*
Meu limão, meu limoeiro,
na manhã depois da noite
escura, de chuva larga,
és o vegetal mais doce.
Doce, não à língua seca
sem açúcar e sem sumo,
mas aos olhos inda insossos
recém saídos do sono.
*
Era tal uma organista
bem dotada de memória,
que usava limão com tudo
e tinha tudo de cor.
Não só sorvia o seu sumo
como comia os seus gomos
amassados na comida
como pimenta de cheiro.
Os mais ínvios arabescos
retinha todos de cor,
seráfica tal um anjo
de puro estilo barroco.
*
Meu limão, meu limoeiro,
nada há mais tropical,
tempo certo ou tempo errado,
cantiga tradicional.
Fizeram tudo contigo,
cachaça, açúcar, canção,
cantiga de cachoeira,
refrigério de verão.
O frio se abrasa e morde,
cauixis de fingimento,
carapanãs invisíveis,
lençol de urtigas ao vento.
*
Os cupins e os teus espinhos,
travos da tua raiz,
são compensados no corpo
pelo prazer que produzes.
Terei, um dia, no espaço
onde estarei mais inteiro,
entre mudas de outras plantas,
meu limão, meu limoeiro.
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