Manaus, 16 de setembro de 2024

ZFM: no caminho com Maiakóvski

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“Na primeira noite eles se aproximam/e roubam uma flor/do nosso jardim. /E não dizemos nada.” – por Eduardo Alves da Costa com o poema “No caminho com Maiakovski.

O ano de 2022 será marcado como o ano dos editais do fim do mundo, tal a quantidade e a voracidade com que saíram da fornalha com o ímpeto de alguém que quisesse desconstruir – por todos os flancos, e progressivamente – o objeto que lhe inspirou a trama. O último foi o de n. 11.182, de 24 de agosto.

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Este prometia corrigir os estragos do anterior, o Decreto n. 11.158, de 29 de julho de 2022 que, por sua vez, prometia revogar os Decretos n. 10.923/2021 e 11.055/2022 e assegurar: “… o objetivo de viabilizar a redução de 35% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) da maioria dos produtos fabricados no Brasil e, ao mesmo tempo, cumprir decisão judicial (ADI 7153) que determinou a preservação da competitividade dos produtos produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM)” No primeiro momento, os interessados acreditaram que apenas 5% dos produtos – como foi alardeado – seriam penalizados. Todos se enganaram e redondamente.

“Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, /matam nosso cão, /e não dizemos nada.”

Poucas imposições da burocracia brasileira são tão desgastantes como o licenciamento do PPB, Processo Produtivo Básico, uma Via Crucis do legalismo que a lei determina seja concluída em 4 meses. Temos histórico, entretanto, como o da Novamed, para a produção de medicamentos genéricos, que demorou cinco anos para ser liberado. Pois bem, o último Decreto, no universo de 528 PPBs, a duras penas conquistados pelo investidor, apenas 170 foram liberados para seguir incentivados no Polo Industrial de Manaus. Como assim, e os demais ficarão fora do quadro sob nocaute ostensivo?

Nesta segunda-feira, o Centro das Indústrias do Estado do Amazonas convocou seus associados para conhecer/debater informações sobre o rescaldo: investimentos perdidos, custos de toda ordem, perda de postos de trabalho, um clima de indignação generalizada… São 358 produtos glosados pelo novo decreto, fator evidente da desindustrialização anunciada. Esses são os 5% mais aloprados de toda a história da Aritmética, desde o filósofo Pitágoras e seu teorema, ora sob suspeição.

“Até que um dia, /o mais frágil deles/entra sozinho e nossa casa, /rouba-nos a luz e, /conhecendo nosso medo, /arranca-nos a voz da garganta./E já não podemos dizer nada”.

Do ponto de vista da proporcionalidade, as empresas prejudicadas vão involuntariamente, reduzir o número de estabelecimentos industriais em Manaus, há muito tempo 0,6% das empresas fabris do Brasil. Aqui, as taxas de nascimento e óbito das empresas são similares.

Quem se beneficiará com essa depredação? Os empregadores asiáticos que vão ocupar novos colaboradores? Os importadores que em voz e voto nas entidades da indústria do Sudeste? Ou os empreendedores que não emitem nota fiscal, que não pagam impostos nem terão mão de obra a rodo sem precisar de dar trela aos custos trabalhistas…

O Polo Industrial da Zona Franca de Manaus

A proteção à competitividade da ZFM está assegurada?

O que dizem os juristas? Ao proclamar que o novo Decreto atenderia a medida cautelar do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que acolheu Ação direta de inconstitucionalidade n. 7153, conquistada pela Bancada Parlamentar do Amazonas, através do partido Solidariedade, configurou-se aquilo que os juristas chamam de burla. A manutenção da alíquota do IPI para mais 109 produtos produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM), acrescidos dos 61 itens da lista anterior, o Decreto n. 11.182/2022) condenou à própria sorte uma infinidade de produtos fabricados no Polo Industrial de Manaus e seus investidores. É como se o que eles fazem, ao gerar oportunidades, empregos, renda e tributos… não tivesse qualquer importância.

Até as últimas consequências…

E os indícios da desconstrução paulatina não se esgotam com tais burlas. A redução crescente do imposto de importação, visível e implacável com a manipulação em desfavor da ZFM do ex-tarifário, sinalizam a pulsação da agenda oculta. A nosso favor, uma bancada parlamentar obstinada e vigilante, um partido de nome Solidariedade e a consciência de que é preciso ir até as últimas consequências para assegurar na Justiça a legitimidade dos direitos de todas as empresas, posto que cada uma delas, ao firmar contrato de integrar e proteger a Amazônia, está fazendo sua parte e são credoras da reciprocidade republicana.

Notas:

1. Em epígrafe alguns versos do poema de Eduardo Alves da Costa, com o título: No caminho com Maiakovski.

2. As citações jurídicas foram inspiradas no parecer dos juristas Noronha&Ghetti.

II

ZFM, os empregos, os investimentos e o bom-senso

“Cada R$1 que a União poderia recolher no Polo Industrial de Manaus, R$1,4 é repassado pela ZFM ao contribuinte diretamente, com produtos de primeira e mais em conta, segundo estudos demonstrativos da Fundação Getúlio Vargas. E com Nota Fiscal de garantias.”

Há uma clareza irretocável no comunicado do Centro da Indústria do estado do Amazonas (CIEAM) para os seus interlocutores locais, aqueles envolvidos diretamente no imbróglio do IPI dos decretos do fim do mundo. Parlamentares federais, governo do estado e superintendente da Suframa receberam, em detalhes, o que representou, na prática, os desdobramentos do Decreto 11.182, de 24 de agosto de 2022. Começa a aparecer, assim, quem é quem entre as empresas excluídas e aquelas que permanecem – até quando? – a utilizar a compensação fiscal de operar na Amazônia, ajudar a reduzir as desigualdades regionais, proteger a floresta e insistir na economia legalizada que sobrevive à expansão da economia sem lei.

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Que estranho interferir – para fatiar, desmobilizar e desconstruir – num jogo onde os atores envolvidos estão ganhando, sem nada colocar no lugar? E quem são esses ganhadores? Com certeza não se limitam a um punhado de empresas, de investidores que optaram aportar aqui por força de um contrato com a União Federal. São eles sim, e devidamente acompanhados de um exército de operadores que aqui encontram oportunidades da prestação de serviços de transporte, alimentação, serviço médico, lazer e cultura, e por aí vai.

Gerar emprego e oportunidades numa região com IDHs de nações subdesenvolvidas faz toda uma diferença cívica. Tanto mais num ambiente em que economia e ecologia andam em consonância. Para cada vaga oferecida, 5 outras pessoas são mobilizadas para a célula produtiva e de benefícios que isso representa.

São setores consolidados, que desembarcaram na região há décadas e que estruturam uma rotina produtiva da qual dependem outros negócios e muitos empregos. Setores como o de Duas Rodas, que oferece diretamente 15 mil empregos, 75 mil indiretos, costuma manter uma rede de fornecedores locais e regionais robusta. A entidade que reúne essas empresas, a ABRACICLO, realizou em agosto último uma Conferência Empresarial e de Tecnologia voltada exclusivamente para o setor de bicicletas.

Afinal, somos o quarto produtor mundial deste veículo que tanto bem faz para a saúde, para o clima e para o Brasil. O evento teve como meta a identificação de novos fornecedores para adensar sua verticalização com peças e insumos locais, de acordo com as exigências do PPB, aferidas, requeridas e monitoradas pela União. Por que esvaziar com tantos cortes um setor tão pujante?

Durante os momentos críticos do início da pandemia COVID-19, os cargueiros encalharam nos portos asiáticos ou eram retidos pelo caminho para captura emergencial de suprimentos, entre eles os EPIs, equipamentos de proteção individual. Situação de urgência urgentíssima fez o Polo Industrial de Manaus descobrir, por necessidade e com habilidade, uma capacidade fabril instalada que era desconhecida dos próprios produtores.

Pressionadas pela dramaticidade do tormento, toda sorte de produtos foram aparecendo com a grife Made in ZFM. Fábrica de sucos transformadas de uma hora para outra em produtores de álcool em gel de primeira qualidade, ou de equipamentos de respiração mecânica. Uma grata surpresa e uma surpreendente revelação de capacidades.

O que significa desarticular este movimento? Inibir, esvaziar, penalizar esses segmentos é, no mínimo, inaceitável e irresponsável em nome do interesse da brasilidade, pois os itens aqui fabricados são de classe mundial, tem preços adequados e uma rede nacional de assistência técnica imbatível. Cada R$1 que a União poderia recolher no Polo Industrial de Manaus, R$1,4 é repassado pela ZFM ao contribuinte diretamente, com produtos mais em conta, segundo estudos demonstrativos da Fundação Getúlio Vargas. E com Nota Fiscal de garantias.

Qual o sentido de atacar o setor de fitness, luminárias, componentes de informática, algumas linhas de bicicletas, entre outras centenas de PPB, Processo Produtivo Básico? A rigor, são precisamente 358 itens, que não poderão mais ser fabricados em Manaus, e terão que ser importados da Ásia, gerando riqueza, empregos e oportunidades por lá. Um baú de felicidade para os envolvidos nessa trama funesta. A Nota do CIEAM é sucinta e objetiva, assim como é inevitável e obrigatório voltar às barras da justiça, a tábua de salvação dos investimentos, dos empregos e do bom senso.

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