Manaus, 26 de julho de 2024

A tumba da Santa Casa de Manaus

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A nossa Santa Casa de Misericórdia é anterior ao Hospital da Sociedade Portuguesa Beneficiente do Amazonas, e embora não seja uma das mais antigas do País, pois data da segunda metade do século XIX, enquanto as do Rio e de Santos são do século XVI, e mesmo a de Belém é do século XVII, sempre foi um local onde se praticava uma das três virtudes teologais, a Caridade, sob a forma das Misericórdias Materiais de cuidar dos doentes e enterrar os mortos. As outras como dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, vestir os nus, cuidar dos órfãos, dos enjeitados e das viúvas de bom proceder, constituíam-se em obrigações da sociedade que foram sendo tranferidas para o Estado Social, pouco a pouco assumindo tratar dessas misérias, mediante o pagamento de impostos e da perda progressiva da liberdade, que assumiria fria e sem amor social essas funções. E hoje temos uma população descompromissada que repassa suas obrigações ao governo e nada faz pelo próximo, salvo as exceções da regra. Em suma, uma população sem Caridade e sem Amor ao próximo.

O resultado foi que a magnífica instituição das Santas Casas de outras épocas encontra-se hoje falida. A nossa inteiramente abandonada, apesar da sua capacidade de atendimento de mais de 400 leitos, de uma Maternidade e de um pronto atendimento, em pleno centro da cidade. Dá pena de se ver um gigantesco patrimônio destruído pela incúria e insensibilidade de diversos governos e institutos, destruidores daquelas instituições venerandas, ao pagar baixos preços por internamentos a entidades incapazes de inventar despesas fictícias ou inexistentes, pelos seus internamentos e procedimentos, como compensação, diferentemente dos chamados hospitais particulares, ressalvadas as exceções.

Mas voltemos ao assunto proposto no título.

Na década de 1930, conforme anúncio nas Revistas da Associação Comercial do Amazonas, o hospital era considerado modelar.

Oferecia quartos de primeira classe com banheiros e sanitários anexos, e sala de estar e de refeições aos preços de 20 e 25$000 para cavalheiros, e de 15, 20 e 30$000 para senhoras. As enfermarias de segunda classe cobravam diárias de 10$000. A alimentação era de primeira ordem e o corpo clínico composto pelos melhores médicos da cidade.

Mas logo vinha uma insólita parte desse anúncio. Mantem o serviço de condução de cadáveres, no qual são empregados luxuosos autos, observada a seguinte tabela:

Especial          500$000                     2ª                     140$000

1ª luxo             350$000                     3ª                       60$000

1ª simples        200$000                     4ª                       40$000

Enterrar os mortos era uma exclusividade dada pelo Município de Manaus à Santa Casa, para a sua manutenção. O transporte dos mortos também era exclusivo dela. Para isso mantinha um velório no canto da Rua 10 de julho com a Rua Ferreira Pena, de onde saiam a maior parte dos enterros de Manaus, que seguiam ora pela Ferreira Pena, ora pela Rua 10 de julho, rumo ao São João Batista, além de vários veículos apropriados para essa função.

A fotografia que se segue é a do carro especial, o de maior luxo, que custava a bagatela de 500$000 para ir até o Boulevard Amazonas, uma fortuna, pois hoje uma corrida de táxi até lá ultrapassa pouco mais de dez reais, embora o carro fosse dirigido por dois motoristas, com suas fardas de casemira negra, pessoas conhecidas por todos, na época.

Este foi um dos meus grandes terrores quando criança, até aí uns oito anos de idade. Bastava ouvir o aviso: Aí vem a tumba da Santa Casa, para esconder-me e  não ver passar o carro, e principalmente o caixão, os anjos do alto do dossel chorando e o pano negro bordado de prata.

Havia uma tumba toda azulzinha que era para as crianças e as moças virgens. Com o tempo perdi o medo. Mas tudo ficou gravado em minha memória.

carro

A INSÓLITA E TERRÍFICA TUMBA DA SANTA CASA

Bibliografia

Antônio Loureiro – Tempos de esperança – Amazonas 1917-1945 – Manaus – 1995 – Gráfica Gênix.

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