Manaus, 21 de novembro de 2024

Crônicas do cotidiano: Quando a política dá lugar ao nada

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“A política baseia-se na pluralidade dos homens…A política trata da convivência entre os diferentes”. Esses aforismas abrem “Fragmentos das Obras Póstumas”, de Hannah Arendt, e revelam o esboço da obra que não chegou a se completar e que se intitularia “O que é Política” (RJ: Bertran Brasil, 1999). E aí Seu Zema, como ficam as coisas quando desconhecemos esses elementos rudimentares da política, mas indispensáveis para a convivência humana? Confesso o desprazer de referir-me a Vossa Senhoria, merecedora de todo desprezo, se não fosse tão perigosa. Onde está o seu veneno? Por que fala do alto das montanhas das Minas Gerais como um Moisés tresloucado? Não, definitivamente não! O senhor “representa”! Representa um grupo numeroso de pessoas que pensam com suas palavras e com os seus pensamentos, espalhadas por todo o Brasil, até nas regiões que o senhor mais detesta. Esse jeito manso de ventríloquo esquálido passa confiança para um mundão de gente que detesta gente diferente. E se há espaços para esse tipo de manifestação é porque as coisas não andam bem das pernas na política brasileira. Tem muita besteira zoando por aqui e precisamos ter coragem de enfrentá-las.

A crise política brasileira não acabou com a eleição, a posse conturbada dos eleitos e a instauração de processos criminais contra os que tentaram golpear as instituições democráticas e o Estado Democrático de Direito. Tudo começou com a “criminalização da política”. Instaurou-se, com a falta de lideranças legítimas e um sentimento estranho por figuras carismáticas para um reduzido grupo, que aparecem do nada e tomam conta do lugar, da paisagem e fecham as portas do discernimento, do bom senso e do fazer político. Max Weber estudou e refletiu sobre a política e sobre as autoridades carismáticas. Em várias passagens de suas obras nos alerta para o perigo representado por tais figuras. Comentando uma dessas passagens, Richard Sennett, em “O Declínio do Homem Público” (SP: Companhia das Letras, 1988, p.334) pergunta: “porque o carisma inevitavelmente vacila?” e ao responder, com os argumentos de Weber, afirma: “os seguidores de um líder carismático esperam que ele lhes ‘traga bem-estar’, mas o líder carismático é incapaz de traduzir suas intenções de fazê-lo em atos de bem-estar, porque sua aura é apenas uma ilusão compartilhada; assim sendo, ele deve cair e acabar sendo descartado como uma impostura”. E para Weber, o terreno da política é o terreno do conflito e, também, o terreno da racionalidade. Juntando a isso o que nos aponta Arendt sobre a pluralidade e o convívio com os diferentes, a organização da sociedade, nos ditames de uma sociedade capitalista de ideário individualista liberal, que tem no carisma, portanto, um fenômeno perturbador da ordem social, que deve ser enfrentado no terreno da própria política. Cabe, assim, à burocracia de estado garantir o funcionamento das instituições nos diversos momentos de crise e de agudização dos conflitos. Por experiência própria, sabemos o que acontece quando um governo fundado no carisma atravessa os limites e garantias legais e conspurca as instituições e corrompe os elos que sustentam a Democracia.

Figuras como Seu Zema, na estupidez de seu infortúnio, tentando tomar o “cajado” do líder carismático decaído, costumam apelar para forças do submundo meio adormecidas como o Separatismo, uma vez que as pautas que sustentaram o líder anterior parecem ter se esgotado. As mentiras da nossa “cordialidade”, mesmo no sentido de remendo explicativo sustentado por seu mentor, Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, como luta entre a razão e o sentimento, com predominância deste último, sinônimo de “cordialidade”, mesmo assim, trata-se de um sentimento vil, que marca muito bem nossas elites governante e dirigente e não o povo, a nação e o país. Somos um povo desigual, vítima dos saques sucessivos dos mais fortes sobre os mais fracos; formamos uma nação que escondeu e continua a esconder o caráter violento dos que se acham donos dela; vivemos num país de vastidões onde os povos que nele habitam não se reconhecem nas suas diferenças e até mesmo em sua humanidade. No máximo, nos suportamos, apesar de termos lutado, guerreado e legislado em busca de unidade e da igualdade. Por isso, cuidado com o andor!

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Uma resposta

  1. Artigo perfeito e bastante oportuno. Parabéns ao articulista.

    São figuras como essas que, ao lado de sua claque de apoiadores fanáticos, compõem as facções políticas cultoras do ódio, da tirania e da barbárie e defensoras do estado totalitário pautado em ideologias ultrapassadas e toscas.

    No seio de uma sociedade civilizada, essas criaturas rudimentares para nada servem, senão para disseminar o ódio e poluir o mundo, movidos por concepções retrógradas e puro rancor.

    Nutridos pelo ódio e conduzidos pela irracionalidade, não conhecem a luz. Vivem na escuridão.

    É nessa senda escura e pedregosa que parece caminhar o separatista Zema.

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