
*Thiago de Mello
Soubemos que ele nascera,
então fomos adorá-lo.
Era uma criança chegando,
trazendo o humano condão
de inventar novos caminhos.
Bois não cercavam o menino.
Nem burros.
Estava só.
(Fora dos olhos do boi,
onde buscar a humildade
mister para a adoração?)
Somente um raio de lua
debruava o doce mistério
de uma carne sem pecado:
tanta alvura, contra o negro
da noite, lembrava a flor
que rompe o solo do mundo.
Os pastores da comarca
longe estavam, nem souberam.
Anjo nenhum avisou-lhes
que havia um novo menino
adormecido no campo.
Magos também não chegaram
para ofertar-lhe riquezas.
E acalentavam-lhe o sono
– em vez de ternas canções –
vozes roufenhas e roncos
agudos, bárbaros roncos.
Em verdade estava só,
muito só – a pobre criança
nascida em dias tão rudes.
Os homens fugiram todos,
nem lhe fizeram reparo:
que aquele recém-chegado
vinha acordar velhas brasas,
redescobrir entre a triste
cinza uma constelação.
Ao ver o mundo vazio,
faz de seu sono precário
um sono definitivo
feito de puro silêncio.
Os homens então regressam
(nos olhos assombro e medo):
alguns menos espantados
levam o corpo do menino,
o seco e pálido corpo
de quem traria, talvez,
um claro e novo recado
de Jesus a nosso tempo.