Trocando em miúdos: com esses dados, o Polo Industrial de Manaus já pode demonstrar a neutralização de suas emissões de carbono com a fixação dessas emissões transformadas, efetivamente, em árvores que – como bombas naturais de produção de recursos hídricos – oferecem ao planeta seus preciosos serviços ambientais: descarbonização do clima, produção de oxigênio e de ativos hídricos. Isso significa a melhor tradução de um empreendimento amparado no conceito de sustentabilidade, cunhado por Samuel Benchimol: “socialmente justo, economicamente viável, politicamente correto e ambientalmente equilibrado”.
Nesta semana de aniversário, a indústria brasileira tem motivos especiais para celebrar a expectativa de novos tempos e muitas festas. Há um compromisso do poder público com a reindustrialização do país e uma reforma tributária a caminho, que anuncia o ordenamento fiscal da economia, um pesadelo histórico a ser enfrentado. Dois motivos domésticos, porém, e de extrema relevância, autorizam uma celebração diferenciada na floresta.
São eventos diretamente relacionados com iniciativas de ação social e da contabilidade ambiental, confirmados nesta última Assembleia de Maio dos diretores e gestores do CIEAM – Centro da Indústria do Estado do Amazonas. O Dia da Indústria teve seus merecidos tributos com a formalização e consolidação da Comissão de ESG, em âmbito institucional das empresas associadas à entidade às vésperas de seus 43 anos de existência. E mais: foi dado início aos estudos e outras providências para demonstração da Neutralização do Carbono emitido pela indústria da ZFM.
Fruto de decisões compartilhadas e executadas, tocadas pela ousadia da transformação e modernização de sua governança institucional, essas duas medidas em favor da Indústria foram apresentadas aos associados. Uma delas celebra a instalação da Comissão de ESG, sob a responsabilidade da conselheira Régia Moreira Leite, coordenadora da Ação Social Integrada do CIEAM, em parceria operacional com a FIEAM, ABRACICLO e ELETROS, formalmente encerrada para integrar-se integralmente à Comissão ESG, que vai assessorar os associados na adoção de metodologia e inseri-la na própria gestão da entidade.
Em seu relatório de Ação Social Integrada, a empresária Régia prestou contas das iniciativas de vulto que traduzem a contribuição da Indústria aos segmentos mais vulneráveis do tecido social do Amazonas, dos estados vizinhos e de outros do Nordeste que ainda padecem as sequelas da pandemia. E anunciou que um livro está a caminho, e que vai contar histórias da solidariedade das empresas, fornecedores e trabalhadores, do PIM, seus fornecedores e prestadores de serviços, e as entidades de assistência social.
A outra medida – com a mesma grandiosidade e relevância de mais uma Comissão, a ESG de Serviços – diz respeito à demonstração da Neutralização do Carbono do Polo Industrial de Manaus. Este é um propósito antigo, histórico e obstinado do CIEAM e de seu Conselho.
Régia, Higuchi, Lúcio Flávio, Maurício e Anderson
A convite do presidente-executivo Lúcio Flávio Morais de Oliveira e do presidente do Conselho, Luiz Augusto Barreto Rocha, o pesquisador Niro Higuchi, cientista integrante do seleto grupo de autoridades climáticas da ONU, que recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2009, apresentou sinteticamente um trabalho de quantificação dos serviços ambientais da floresta, que desenvolve desde 1980, quando iniciou a pesquisa da dinâmica trófica da Amazônia, a estrutura biótica e funcionamento da fotossíntese na transformação do carbono em moléculas de água e de oxigênio.
Assistimos a uma apresentação científica do mais alto nível que relata operações da natureza intimamente relacionada ao modo como é gerada a riqueza na Amazônia, seu setor industrial e seus serviços ambientais. Essa movimentação da Ciência aplicada ocorre há mais de quatro décadas, literalmente, na vizinhança do Polo Industrial de Manaus sob a batuta dos pesquisadores do INPA, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia.
foto: Reprodução
E como vai ser possível demonstrar que esse laboratório demonstra por A+B que as empresas industriais da ZFM já podem preparar sua certificação de descarbonização climática? Isso foi detalhado com equações, dados de performance, imagens e publicações em revistas científicas como a Nature e a Science. A metodologia de mensuração da Dinâmica do Carbono na Amazônia, na sigla em inglês, CADAF, é justo e meritório que se diga, foi patrocinada pelo governo japonês, e começou em 2010.
O estudo teve a liderança de Niro Higuchi e mobilizou 32 universidades e/ou Centro de Pesquisas do clima ao redor do mundo. Entre outros incontáveis benefícios, a partir de então, foi possível formalizar o Manejo Florestal Sustentável, como atividade econômica, reconhecida pela ONU, capaz de revitalizar o estoque florestal, proteger e fortalecer a diversidade biológica. E mais: quantificar o volume de água por segundo, minuto, hora e por ano de qualquer massa florestal, gerado a partir da floresta. Quantificação do volume de água antecede a qualquer movimento de precificação dos serviços ambientais oferecidos ao clima, ao país, seus reservatórios hidrelétricos e de distribuição de água à população e a sustento hídrico do agronegócio.
Ou seja, essa operação – de como se dá a produção de água a partir das árvores em pé – pode ser executada na floresta pertencente à Suframa, Superintendência da Zona Franca de Manaus, contígua às plantas industriais da ZFM que, desde suas origens, destinou essas áreas, estimadas em 600 mil hectares do lado esquerdo da ZF2, estrada da ZFM. Glebas foram repassados para instituições públicas de pesquisa, entre elas o INPA que está lá desde 1987, com seu Laboratório de Manejo Florestal. Do lado direito, são áreas destinadas para atividades produtivas, onde se instalou o Distrito Agropecuário da Suframa e onde estão disponíveis 70 mil hectares para novos empreendimentos.
Prédio da Suframa (Crédito Cláudio P Machado)
Parte desta área, de acordo com a sugestão do INPA, a propósito, seria, em princípio, reivindicadas junto à Suframa, para abrigar duas iniciativas: instalar do lado direito o Laboratório Experimental de estudos da dinâmica do carbono propiciada pelo Polo Industrial de Manaus. De quebra, caberia a implantação do Vale da Bioeconomia, uma denominação já em uso nesta localidade, para descrever o potencial de biodiversidade a ser aproveitada pelas empresas. Previamente credenciadas para o exercício de atividades econômicas, poderão, a partir da vocação de negócios sustentáveis do bioma, produzir fármacos, dermocosméticos, alimentação funcional, entre outros aproveitamentos do banco de germoplasma da Amazônia.
No encerramento da apresentação, o pesquisador Niro Higuchi reiterou os passos de uma operação a favor do clima, a ser animada pelo CIEAM em nome de seus associados. De acordo com as estimativas do cientista, com 15 mil hectares, é possível demonstrar a quantidade de água produzida nesta área e identificar quantas toneladas de carbono ela fixa no solo em forma de biomassa.
Trocando em miúdos: com esses dados, o Polo Industrial de Manaus já pode demonstrar a neutralização de suas emissões de carbono com a fixação dessas emissões transformadas, efetivamente, em árvores que – como bombas naturais de produção de recursos hídricos – oferecem ao planeta seus preciosos serviços ambientais: descarbonização do clima, produção de oxigênio e de ativos hídricos. Isso significa a melhor tradução de um empreendimento amparado no conceito de sustentabilidade, cunhado por Samuel Benchimol: “socialmente justo, economicamente viável, politicamente correto e ambientalmente equilibrado”.
Que outro modo mais extraordinário seria possível adotar, neste momento para celebrar este 25 Maio na Amazônia, dia dedicado à Indústria, seus teimosos investidores e intrépidos operadores?
II
Bioeconomia da Amazônia, vacilos federais e atraso regional
“Mais longe já tivemos na desconstrução desta equação perversa que rebaixa a população da Amazônia a IDHs deploráveis a despeito das potencialidades naturais imensuráveis. Compete a nós apontar e desmontar a distorção inaceitável que transformou o Amazonas num dos maiores contribuintes da Receita. Entre os vacilos, este é o mais aloprado e omitido da gestão federal, responsável pelo atraso da bioeconomia e do desenvolvimento regional.”
A economia da Amazônia, que espalha esforços de redução das desigualdades regionais, a partir de sua planta industrial, tem sido alvo de muitas sugestões, muitas delas óbvias, como a diversificação na direção da floresta, outras nem tanto como o desmatamento na perspectiva da agropecuária. A bioeconomia ganha de goleada entre os demais palpites, mesmo assim não deslancha na proporção da obviedade e pressão de alguns gestores mais qualificados. Vamos listar aqui algumas razões deste atraso na interiorização do desenvolvimento sustentável da Amazônia.
- O grande vacilo já tem mais de um século. De 45% do PIB brasileiro que era formado pela economia do látex, restou o Teatro Amazonas em Manaus e Teatro da Paz, em Belém, para não contar a história de uma pujança interrompida pelo infortúnio da negligência federal. Da exuberância simbolizada pela Ópera na Floresta sobrou o banzo das ruínas de cidades que foram pioneiras em luz elétrica, telefonia e outras veleidades da burguesia tropical.
O Brasil, ainda com mentalidade latifundiária, escravista e monarquista/colonialista, na virada para o Século XX, não se deu conta que éramos o único lugar do mundo a produzir a borracha dos pneus para atender a revolução automobilística que começava a se instalar. A bioeconomia da Amazônia perdeu sua grande oportunidade mundial.
2. Nesse vaivém ao Novo Mundo, ávido pelo Eldorado em seus vários sentidos e escambos, os viajantes europeus trataram de saquear a biodiversidade da Amazônia, terra de ninguém, uma região que, cinco séculos depois do desembarque das caravelas do Velho Mundo, segue saqueada. E mal tratada dos mais diversos modos de apropriação indevida mediante a passividade e cumplicidade da soberania irracional.
Constam mais de 200 mil espécies amazônicas que hoje são mantidas em estufas e acervos dos museus botânicos e institutos de pesquisa e desenvolvimento de Além-Mar. Por que os cientistas dizem que 20% da biodiversidade tropical está presente na produção da indústria farmacêutica e por que o Brasil não tem essa indústria estruturada?
3. Um dos exemplos dessa flora que se vai a espalhar glamour e plata se refere às orquídeas da Amazônia, especialmente do Rio Negro, no Estado do Amazonas, de onde foram coletadas mais de 70% das espécies mais raras e preciosas do botânica glamurosa universal.
Alguma delas estão presentes no livro Viagem Filosófica pelas capitanias do Grão Pará, rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá, 1783-1792, de Alexandre Rodrigues Ferreira, um luso-baiano que veio para a Amazônia, a serviço de Maria I, no Século XVIII, para inventariar o patrimônio natural, cultural e mineral dos domínios mais cobiçados pelo Velho Continente. Essa obra está na Biblioteca Pública do Amazonas entre outras preciosidades que relatam uma riqueza que são confiscadas com nossa cumplicidade passiva.
4. Foram inúmeras e inócuas as tentativas do Amazonas, empresários e investidores, e da própria Suframa, órgão gestor e indutor do desenvolvimento, para diversificar a economia da ZFM, a Zona Franca de Manaus. A primeira tentativa obrigava as empresas do Polo Industrial de Manaus a manter uma atividade econômica no setor primário, para fomentar uma economia regional que pudesse produzir insumos industriais. Não deu certo. No final dos anos 90, se deu a criação do CBA, Centro de Biotecnologia da Amazônia, pago pela indústria, com as taxas recolhidas junto à Suframa.
No papel, um sonho de projeto, na prática, uma embromação típica, inerente à inépcia federal e sua anomia no trato da Amazônia. Foram 20 anos de trapalhadas em profusão. Estamos, nesta data, a menos de um mês do Decreto do governo Lula, de qualificação do CBA, como Organização Social. Quanto tempo perdido quanto benefícios frustrados e empregos fraudados.
Geraldo Alckmin, vice-presidente da República, em reunião do CAS, na Suframa
5. A Ciência garante que cem produtos da biodiversidade amazônica são capazes de, em dez anos, fazer brotar uma economia duas vezes maior do que a performance financeira do agronegócio. Uma atividade não exclui a outra, elas se fortalecem mutuamente e corrigem eventuais distorções de parte a parte. A bioeconomia implica em manter a floresta em pé como condição de sobrevivência e robustez biológica. E assim assegura os recursos hídricos dos rios voadores a hidratar a agricultura do Centro-Oeste.
Nenhum aproveitamento desses vacilos, entretanto, seria capaz, isoladamente, de substituir o patamar alcançado pela economia da ZFM, uma grande fábrica de geração de riqueza para o Brasil. Essa fábrica, no curto e médio prazo, é o sustento das iniciativas ainda tímidas que começam a empinar a Bioeconomia com recursos repassados pelas empresas do Polo Industrial de Manaus. Trata-se do PPBio, o Programa Prioritário de Bioeconomia, gerenciado com acertos e avanços pelo IDESAM que fomenta atividades econômicas baseadas no aproveitamento científico e tecnológico da biodiversidade: oleaginosas, piscicultura, fruticultura, açaí, buriti, cacau, castanha, café orgânico etc. etc…
Os recursos aqui aplicados ainda são tímidos mas não são modestos em sua geração e obrigação de remessa aos cofres da União. Mais longe já tivemos na desconstrução desta equação perversa que rebaixa a população da Amazônia a IDHs deploráveis a despeito das potencialidades naturais imensuráveis. Compete a nós apontar e desmontar a distorção inaceitável que transformou o Amazonas num dos maiores contribuintes da Receita. Entre os vacilos, este é o mais aloprado e omitido da gestão federal, responsável pelo atraso da bioeconomia e do desenvolvimento regional.
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