Registro: Hoje, domingo, 8 de novembro de 2015, a Livraria Valer fechou. Esse apontamento deveria constar num livro de ocorrências de uma delegacia policial, como nota gravíssima e de protesto para ser resgatada numa coletiva e futura ação de desagravo.
Num abafado domingo manauara. Um mormaço preguiçoso desses que só acontecem por aqui. Singela tarde domingueira. Quase na hora de namoros e de matinê. (Que digo eu? Ainda existem namoricos às escondidas e matinês aos domingos?) Portas que se fecharam para não abrir mais! Nem na segunda-feira, nem na terça, nem na quarta. A fechadura do diabo, dizem que quando tranca é para sempre! Uma pessoa desavisada, certamente vai estranhar. Ora, como assim, fechou… fechou mas por quê? Fechou, porque sim, meu amigo! Fechou como se fecha uma janela para impedir que alguém veja a paisagem que, diuturnamente, se renova em beleza ou em ruínas, mas que nunca é a mesma. Fechou como se fecha um templo, um bar, uma rua, uma calçada… um reino!
Devia haver leis mundiais que impedissem livrarias fecharem. Uma vez abertas, elas seriam eternas, assim como as nuvens, o vento, as estórias, o amor, os livros.
E eu, mero leitor, aproveitando a queima, cuidei de pegar a parte que me caberia do espólio histórico, arrastando para casa literalmente uma caixa de livros. Emocionado, claro – e acredito que muita gente também sentiu o mesmo que eu senti. Mas, orgulhoso e carregando nos braços um pedaço da Valer, imaginando ser minha obrigação mantê-la viva em algum canto lá de casa, num lugar especial, separado dos outros livros, onde vou deixar escrito o seguinte: livros do dia em que a Valer fechou. Ali será como um cantinho oratório para que eu não esqueça jamais esse domingo de novembro.
Para meu consolo, proponho aos amigos um encontro daqui a um ano. Todos que aderirem à ideia que levem os seus livros, os adquiridos nessas últimas horas da Valer, para uma avaliação sentimental. Digo daqui a um ano, porque, por ora, a ficha ainda não caiu!