A escravidão indígena instalou-se, na Amazônia, desde os primeiros dias da colonização, pela falta de braços, pois o pequeno contingente de colonizadores sempre foi insuficiente para as plantações das comodidades de exportação, a exigir produtos de baixo preço. Também necessitavam de pessoas conhecedoras da região empregadas: na caça e na pesca de animais desconhecidos, na agricultura de subsistência de vegetais locais, como a mandioca, da qual se produzia a farinha de guerra, que depois se tornou o principal alimento da colônia, nos trabalhos domésticos e como guias e remeiros das viagens feitas ao interior.
Eram passíveis de escravização os índios que cometessem um dos seguintes atos, considerados como motivos justificados:
- Entrada em aliança com os inimigos de Portugal.
- O hábito da antropofagia comum entre muitas populações amazônicas.
- A prática de religião não cristã.
- A prática costumeira do furto, pela inexistência da propriedade individual.
- A resistência à catequese e à ação civilizadora.
- Os índios libertados, mediante pagamento, quando aprisionados e destinados à antropofagia.
Por só possuírem armas primitivas, os índios não tinham como se defender das armas de fogo, sendo presas fáceis, embora as viroses e outras doenças introduzidas pelos brancos tenham sido a principal causa da diminuição dessas populações.
No início, os principais adversários dos colonizadores, na escravização, foram as ordens religiosas, a quem eles foram enfeudados, a partir de 1655, quando o padre Vieira conseguiu o domínio temporal da ordem jesuítica sobre os índios e posteriormente em 1693 e 1694, quando o território e os indígenas da Amazônia foram distribuídos entre os capuchos de Santo Antonio, os capuchos de São José ou da Piedade , os mercedários, os carmelitas e os jesuítas.
A partir de então as ordens enveredaram no campo econômico, aproveitando-se do trabalho indígena, o que trouxe uma série de conflitos sobre a posse dessa mão de obra, nos séculos seguintes, com o governo português emitindo leis que ora proibiam, ora autorizavam a escravidão indígena.
Entre os principais métodos de captura de escravos vermelhos incluíam-se:
- As guerras justas pelas alianças dos índios com outros europeus, que foi o caso dos tupinambás, aliados aos franceses, no Maranhão, com a decretação de um cativeiro por dez anos, e dos manaus, considerados aliados dos holandeses.
- As guerras justas por antropofagia como ocorreu aos aruãs acusados desta ação, por terem devorado parte dos cento e sessenta soldados e onze jesuítas desaparecidos no naufrágio da nau do governador Pedro de Albuquerque, nas costas do Marajó, em 1643.
- Guerras justas por ataques a civilizados ou missões exemplificadas pela destruição das aldeias guanavenas e caboquenas do rio Urubu, feita pelas tropas de Pedro da Costa Favela e Antonio da Costa, por terem emboscado as tropas de Antonio Vilela e atacado as missões daquele rio, em 1663, resultando na destruição de 300 malocas e na matança e na escravização de algumas centenas de índios, o que tornou o rio despovoado até o século XX.
- Os descimentos ou o encaminhamento de grupos inteiros de indígenas do alto Amazonas, para as regiões de Belém e do Marajó, para trabalharem nas lavouras ou nas fazendas dos colonizadores e das ordens religiosas. Francisco Portilho desceu 1200 barés, para Santana do Portilho, no Amapá, e os jesuítas Francisco Veloso e Manuel Pires desceram quase 2000 tarumãs, para as fazendas do Marajó.
- As tropas de resgate criadas, conforme João Daniel, por Vieira e outros missionários, para evitar a matança dos índios encurralados, nas caiçaras, para serem comidos, talvez decorrentes da Carta Régia de 28 de abril de 1688, restabelecendo a escravidão neste caso especial e em outros. Esta lei foi bem recebida pelos colonizadores, que passaram a ter uma nova fonte de fornecimento de mão de obra. Todos os anos essas tropas subiam os rios da região tendo um cabo no comando, com diversos oficiais, soldados e remadores, e um padre para acompanhar as inquirições, a fim de comprovar se os resgatados já eram escravos, quando eram soltos, ou destinados à antropofagia, quando eram comprados.
Embarcadas em grandes canoas, as tropas levavam para as trocas: velórios, ferramentas, sal, panos, miçangas, espelhos, tesourinhas, facas e outros produtos, para as trocas por escravos, tudo às expensas da Fazenda Real, logo levados a leilão público, em Belém, e vendidos para cobrirem as despesas, com os lucros distribuídos entre governantes, participantes da expedição e até órgãos públicos e religiosos. Ali algumas pessoas chegaram a possuir mais de mil peças e milhares foram exportados para o Maranhão e até para Minas Gerais, para o trabalho da mineração.
Com o tempo, as tropas de resgate transformaram-se em um intenso comércio de escravos, passando a atacar tribos pacíficas e missões, a induzir guerras intertribais, e a comprar dos chefes seus subordinados.
O padre João Daniel cita que dois milhões de índios foram apresados no Negro, em duzentos anos, o que teria despovoado o médio e baixo curso daquele rio.
Os resgates só terminaram, em 1757, com a emissão das leis pombalinas de libertação dos índios, mas continuaram veladamente até o ciclo da borracha, em pleno século passado.
3 respostas
Bom dia,
Sem dúvida, o “selvagem” autóctone brasileiro, nativo que era de nossas plagas, matas e sertões, pagou com a vida, a sua aviltante servidão e abjeta escravização, o fato de estar no meio do caminho da empreitada colonizadora luso-brasileira…! Foi vítima constante de estupros, mortes, doenças, etc…o contato do índio brasileiro com branco português não poderia ter sido pior…!
Outra forma de violência contra os indígenas daqueles tempos foi o aliciamento compulsório, feito a título de conversão e “salvação” pelos padres com a sua catequese e doutrinação religiosa…! Como disse um indígena da época das missões/reduções: “…Os bandeirantes nos caçam por fora, os padres nos matam por dentro…”
Afinal de contas…o índio brasileiro não precisa/precisava das nossas noções religiosas ou da nossa moral…! Fica o dito popular para a devida reflexão: “…Antes de Cabral descobrir o Brasil, os índios por aqui já haviam descoberto a felicidade…”.