Manaus, 29 de novembro de 2023

Cidade Científica de Humbolt

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Na década de 1970, foi implantada, no noroeste do Estado de Mato Grosso, uma ideia inovadora relacionada ao ensino, pesquisa e desenvolvimento regional. Esse projeto, concebido pelo economista Pedro Paulo Lomba, um inteligente e criativo assessor do Ministro do Planejamento da época – João Paulo dos Reis Velloso – teve o apoio integral do então Presidente do CNPq General Arthur Mascarenhas Façanha e do Reitor da Universidade de Mato Grosso –  Gabriel Novis Neves – um médico jovem e ousado.

Ao projeto da Cidade Científica foi agregado outro, denominado Universidade da Selva e ambos foram dura e intensamente combatidos pelo tradicionalismo acadêmico e fortemente boicotados pela “elite” científica do sudeste que nunca nutriu qualquer simpatia pelo desenvolvimento da ciência e de sua aplicação à região amazônica.

A UNIVERSIDADE DA SELVA 

Sob a liderança do Reitor da Universidade de Mato Grosso foi elaorado o projeto da Universidade da Selva que foi agregado à Cidade Científica de Humboldt com o objetivo de formar profissionais com um perfil voltado para as peculiaridades regionais, rompendo com o ensino tradicional e mostrando a importância de centrar o foco nos problemas dos povos da floresta.

Uma das mais criativas inovações da Universidade da Selva foi a instalação do curso de Médico Rural, um profissional formado em quatro anos de preparação específica para resolver a quase totalidade dos problemas de saúde dos povos dos ecossistemas, Ao final desse período de estudos direcionados, o estudante recebia o título de Médico Rural e ia exercer a profissão no interior, contratado pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde. Depois de dois anos desse verdadeiro sacerdócio, ele podia (se quisesse) retornar à Universidade para completar seus estudos e formar-se como médico pleno.

O HOSPITAL UNIVERSITÁRIO

O hospital universitário desse projeto tinha enfermarias e quartos adaptados para que os pacientes pudessem dormir em redes e alojar a família, já que a cultura indígena, principalmente dos Cintas-Larga que habitavam a região, não admitia separar o doente da família. Cama e isolamento só para os casos em que a conduta médica exigisse esse procedimento.  Um dos argumentos contrários dizia que seriam formados médicos de categoria inferior, esquecendo que parte considerável dos médicos plenos, não fazem parte da “nata” profissional.

A UTOPIA POSSÍVEL 

Os cursos de farmácia, bioquímica, geologia, biologia, pedagogia, etc. eram todos direcionados à realidade regional, e os cursos de língua incluíam, obrigatoriamente, os idiomas e dialetos falados pelos povos da floresta.

Essa audácia didático-pedagógica foi agregada à Cidade Científica de Humboldt, construída ao lado da cachoeira de Dardanelos, no município de Aripuanã (MT), planejada para ser base de estudos regionais, mas com a característica de ser autossustentável. E isso anos-luz antes da classe política do Brasil se preocupar com desenvolvimento, com meio ambiente, preservação das florestas e causa indígena. A produção de alimentos, de energia (usando fontes renováveis), reciclagem de detritos, tudo foi previsto para que a cidade fosse um modelo de desenvolvimento e não de crescimento econômico, como imaginaram os brilhantes economistas Pedro Paulo Lomba e seu chefe João Paulo dos Reis Veloso.

Tive a honra e o privilégio de participar desse projeto, e com imenso pesar fui nomeado Coordenador Adjunto com a missão de transferir o projeto do CNPq para o Governo de Mato Grosso, no início dos anos 80. Em contra partida, tive também a dolorosa missão de sepultar os sonhos e as utopias possíveis de um grupo de idealistas, pois tinha certeza que o governo mato-grossense não teria audácia, nem condições políticas para dar continuidade à ideia. Para completar o funeral de um sonho ou, se preferirem o fechamento desse caminho para o futuro, a Cidade Cientifica de Humboldt e a Universidade da Selva foram sepultadas por atos administrativos de um novo governador e de um novo Reitor.   Sei muitas histórias dessa época que estou com vontade de contar, para mostrar que desenvolvimento e meio ambiente é um assunto antigo na minha vida intelectual e profissional, ao contrário dos que, por aqui falam nesse tema sem saber direito o que é meio ambiente, desenvolvimento sustentável e futuras gerações, que são palavras-chave do artigo 225 da CF/88.

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2 respostas

  1. PEDRO pAULO LOMBA ESTÁ VIVO E RESIDE EM MURY, DISTRITO DE NOVA FRIBURGO, nO RIO DE jANEIRO. Esquecido por muitos que viveram com ele naquela fase…
    INFELIZMENTE Á ÉPOCA DA CONCEPÇÃO E IMPLANTAÇÃO DA CIDADE LABORATORIO hUMBOLT A IDEIA ERA ARROJADA E MUITO ALÉM DE SEU TEMPO. Completamente sem compreensão da sua importancia por grande de brasileiros. Hoje, mais de 45 anos depois, o projeto desta cidade teria tudo a ver com a proteção ambiental daquela área da Amazonia de Mato Grosso. Junção de ciência com ocupação controlada e economia construtivas.

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