A cidade de Manaus hoje é culturalmente conhecida e respeitada mundo afora pelo seu “Festival de Ópera”. É a única manifestação cultural que não apela ao primitivismo e vai na contramão do que se espera de uma cidade localizada no mundo do exótico. Por isso é uma rematada burrice considerar o “Festival de Ópera” como algo acessório em troca de manutenção de uma cultura popular que já não é popular e sequer é cultura, apenas para contentar cabos eleitorais e predadores notórios do erário público. A ópera, dentre as artes cênicas é a que tem anualmente a menor quantidade de produções.
Até os anos 70, os teatros municipais do Rio de Janeiro e São Paulo apresentavam regularmente temporadas com quatro a cinco produções. A qualidade das produções variava de ano para ano, mas o público era fiel. O custo das temporadas era absorvido em parte pelos poderes municipais e estaduais, mas os empresários investiam nas produções, especialmente nas coproduções ou nas importações de cenários, figurinos, cantores líricos e maestros. O custo dessas temporadas era realista, e a soma da bilheteria e ajuda oficial amortizava os investimentos. Na década de 70 essa economia modesta e rotineira é varrida de cena. A Ópera, no Brasil, passa a ser superprodução, a exigir investimentos de mais de 3 milhões de dólares em cada montagem, um salto inflacionário brutal para os antigos 100 mil dólares pôr montagem das temporadas do passado. Essa Inflação de custos, que era na verdade uma estratégia desenvolvida pôr alguns produtores, seguia a mesma lógica imediatista e sem riscos dos financiamentos públicos para o Cinema. Foi a época em que cantoras sem expressão foram vendidas como prima-donas, dos elencos de cantores líricos que não cantavam e das custosas produções artisticamente indigentes. As temporadas do Rio de Janeiro e São Paulo são substituídas pelas raras e dispendiosas encenações, precedidas de jogadas publicitárias, que se faziam a fortuna de alguns, empobreceram a programação e romperam irresponsavelmente uma antiga tradição. É que a Ópera, com a música de concerto, é parte integrante da cultura nacional, vem de raiz e sempre teve um enorme apelo popular. Não é pôr acaso que o mais importante compositor brasileiro do século XIX, é um autor de óperas por excelência.
Pode-se dizer que a ópera no Amazonas e no Brasil sempre teve um público cativo, bastante significativo, que foi alijado de sua arte predileta neste dramático ano de 2015. Era esse mesmo público, antes expulso dos teatros municipais pelos ingressos dispendiosos e pelo uso da Ópera como acontecimento da alta-sociedade, que lotava as récitas ao ar livre, às sessões de vídeo ou aos pequenos recitais. O grande sinal de que os tempos eram de esperança, foi a realização, em 1997, do Festival Amazonas de Ópera, no lendário Teatro Amazonas, organizado pela secretaria de Cultura de nosso estado. Com a encenação de “La Traviata”, de Verdi, com cantores, orquestra e coro da Ópera de Minsk, setenta anos havia se passado desde a última encenação operística naquela famosa casa amazônica. E em 1998, no segundo ano do Festival, Teatro Amazonas recebeu a estreia mundial da Ópera “Alma”, de Cláudio Santoro, com libreto baseado em romance de Oswald de Andrade. No entanto, sem querer fazer rima pobre de toada, o tropeço tem conserto.